UM ARTIGO DE ALEXANDRE BOURNE "O conflito interno em sua Literatura"
Toda história tem seu conflito. E parece que quanto mais raso o conflito mais chances a história tem a ser fraca. Até mesmo a mais serena das histórias precisa de algo ali que cause um impacto, que mova o enredo para frente.
Muitos dos conflitos na Literatura e em muitos filmes são apresentados de maneira externa e com pouca força interna. Resultando em obras mais fracas. O evento externo não deve ser a força maior por trás de um enredo. Um navio que afunda. Um terremoto. Um inverno glacial. A situação, o conflito externo é imprescindível, mas se o conflito interno for negligenciado a história será fraca.
Mas como se enriquece uma história com o conflito?
O conflito interno é um recurso que foi ao longo do tempo cada vez mais ganhando importância no desenvolvimento de uma história. Histórias populares no passado eram quase nulas de conflitos internos bem desenvolvidos ou eles eram tão pobremente explorados que a qualidade dos personagens e da própria história eram superficiais e limitada.
Ficou claro para os escritores populares, ao passar do tempo, que o público não era inocente e que queria ver as complexidades do ser humano nas histórias. Que isso não era apenas para meia dúzia de leitores intelectuais. Pois se pensarmos bem uma pessoa é um ser complexo mesmo que ela seja simples. Uma pessoa tem cerca de 70 mil pensamentos por dia. A grande maioria são conflitos simples, mas há muitos conflitos complexos e tensos. Pois existem diversas mentes, vidas e dramas. Fica claro para mim que os livros devem se aproximar da densidade dos conflitos internos de uma pessoa. E esse deve ser o grande foco de desenvolvimento para o escritor. Trazer ao leitor a essa complexidade. E fazê-la da forma mais calculada, não dando de forma gratuita, mas trabalhando esse conflito para que o leitor sinta, perceba-o sem ter que explicar tudo a ele. Pois na própria mente humana, diante desses 70 mil pensamentos diários muita coisa não é resolvida ou solucionada, mas sobretudo sentida e interpretada com a capacidade mental atual daquela pessoa. Ela pode pensar algo que seja errado pois até ali ela não sabe de outras respostas que a fariam pensar de outra forma. E assim o conflito do livro não deve ser exato também. As respostas devem vir em camadas.
Não existe fórmula para o conflito interno, mas o ideal é haver equilíbrio. Tentar simplificar demais os conflitos e decisões de um personagem pode torná-lo frívolo e cansativo. Por outro lado, tentar pôr muitas camadas conflitivas em um só personagem necessita de muito cuidado para não descambar para um personagem confuso e que repele o leitor. Quanto mais complexidade mais perícia deve ser aplicada e mais cuidado e reflexão para acertar uma realidade crível a esse ser.
Sigmund Freud recomendou: “Olhe para dentro, para as suas profundezas, aprenda primeiro a se conhecer.” Pegando o conselho do grande pai da psicanálise podemos pensar o mesmo para nossos personagens, buscar nas profundezas dele e encontrar sentido e força para o enredo em seu conflito. Conhecendo com muita reflexão a alma do personagem que quer criar, seus conflitos podem se tornarem poderosos e acertados.