O reencontro

De repente, a vida, mestra em dar nós e fazer charadas, os colocou frente-a-frente, outra vez.

Há muito tempo, quase dez anos, que eles não se viam. O mesmo destino que os afastou, propiciou, por certo, aquele reencontro. O calor no corpo, o vermelho do rosto, o jeito de espanto, falavam mais que palavras.

Numa fração de segundo, num insight, eles recordaram a última vez que estive-ram juntos. Na impossibilidade do permanente, eles decidiram nunca mais se encontrar. Já que não era possível o sempre, o talvez não servia...

Éo fim! “Não quero mais te ver! Se eu morrer, não vá ao

meu enterro! Para mim você morreu, de vez! Nunca mais

me telefone!”.

Agora, todas aquelas expressões ásperas, fortes, que eram mais uma agressão pela situação do que uma verdade, soavam como passado, criancice, despeito... A mesma vida que lhes levou o sonho, dava-lhes agora serenidade...

Ao se verem, estacaram imóveis, mudos, como que por um encanto. Olhos nos olhos, eles lembraram o bom e esqueceram o conflito que marcou sua última noite. Ele aspirou fundo e recordou o perfume, Bandit, que ela usava. Ela retribuiu o olhar sugestivo, fitando suas mãos que ela adorava: quantas carícias!

Os dois estavam ali, frente-a-frente, contemplando-se reciprocamente. Ela continuava bonita, os mesmos olhos expressivos, o mesmo sorriso maroto...

Ele estava um pouco mais velho, mas com o ar de sempre, como quem diz coisas sérias com cara de menino travesso. Ao sorrir, ela o fez olhar sua boca. Ah! que beijos, quantas palavras de amor e interjeições de paixão! Quantas loucuras fizeram aquelas bocas...

Lembraram que em muitas coisas eles foram, reciprocamente, o primeiro e o último, o simples e o profundo, a dor e o lenitivo, naquela dialética de afeto cuja síntese nunca chegou a acontecer.

No último encontro deles, e isso seus olhos botavam para fora, chovia. A tarde de sonhos se converteu em uma noite de pesadelo, e eles decidiram acabar tudo, e cada um seguir seu caminho... Chovia água do céu e de seus olhos...

Que caminho comprido, escuro e cheio de saudades! Depois de milhares de passos e tantas esperas, onde cada um, ao perder o outro noivou com a saudade, depois de muita solidão e pouca paz, eles de novo se encontraram, ali naquela rua, à frente de tanta gente.

Naquele instante não cabia descobrir o que provocou a ruptura, quem foi o culpado ou qual o motivo da separação. Cabia curtir o reencontro, olhos nos olhos, perder-se em sua boca, enrolar-se em seus cabelos, mergulhar no sonho...

Só disseram duas palavras: “Oi!” disse ela. “Como vai?” perguntou ele. Olhares falando, bocas pedindo, mãos se procurando. Havia muita gente na calçada. Ele colocou a mão sobre o ombro dela, que, suavemente enlaçou sua cintura. Os dois se olharam, como obedecendo a um script há muito decorado, sorriram e saíram caminhando, dobrando a esquina do escuro e entrando na iluminada rua do sonho...

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 21/11/2005
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