Experiências de quase-morte
A hora da morte não é mais a mesma. Métodos de ressuscitação desenvolvidos em centros de pesquisa ao redor do mundo têm trazido de volta à vida pacientes dados como mortos. Muitos dos “ressuscitados” relatam estranhos fatos. Dizem ter se visto fora do próprio corpo, flutuando. Alguns relatam experiências místicas: túneis que terminam em luzes celestiais intensas e brilhantes, encontros com seres luminosos, uma sensação incrível de paz. Outros contam ter encontrado familiares e amigos mortos.
Para alguns, esses são fenômenos sobrenaturais, porque, segundo a lógica dos vivos, não poderiam ser recordadas por pessoas com atividade cerebral nula. Em outubro foi lançado nos Estados Unidos o “The Big Book of Near-Death Experiences” ( O grande livro das experiências de quase-morte), a segunda obra de P.M Atwater sobre o assunto. Para escrevê-lo, a autora alega ter entrevistado 4 mil pessoas que passaram pela mesma experiência desde 1978.
Experiências de quase-morte são relatadas por aproximadamente 20% das pessoas que foram salvas da morte súbita. Apenas 3% dessas experiências são negativas, independentemente de religião ou do paciente ter ou não provocado a própria morte. Suicidas ressuscitados acompanhados ao longo do tempo têm tendência a reavaliar a própria vida e não tentam se matar novamente. Fiéis de diferentes religiões relatam encontros com divindades de seus próprios credos. A presença é descrita como um “ser de luz” amoroso e acolhedor. Experiências de quase-mortem não se encaixam na descrição do além feita por nenhuma doutrina em particular. Explicar a experiência a partir da religião é difícil, como o é explicá-la a partir da ciência.
Na tentativa de explicar o evento, os cientistas se dividem em dois grupos. O primeiro afirma que as experiências são um fenômeno fisiológico que ocorre no cérebro sem oxigênio e sob condições de stress, que seria inundado por substâncias alucinógenas. Isso também explicaria a luz intensa. As imagens vistas seriam a percepção deturpada do cotidiano. O outro grupo sustenta uma teoria baseada apenas no funcionamento cerebral não explicaria todos os elementos de uma experiência quase-morte. Muitos pacientes relatam percepções, pensamentos claros e memórias num momento que o cérebro, desoxigenado, estaria incapacitado de coordenar atividades tão complexas.
O assunto tem mobilizado estudiosos nos últimos 30 anos. E parece que a luz no fim do túnel ainda está distante de ter uma explicação aprovada por todas as correntes. Alguns fatos são comuns nos relatos : no início da experiência a dor desaparece, assim como as noções de tempo e espaço e a pessoa é tomada por um sentimento indescritível de paz e serenidade. A seguir vem a sensação de desprendimento do corpo físico e flutuação. Segue-se uma etapa transitória de escuridão, com descrições de viagens muito velozes por um túnel, no fim do qual há uma luz. 10% das pessoas relatam entrar na luz do fim do túnel. Além dela, há ambientes paradisíacos e um limite que, se for ultrapassado, tornaria a morte irreversível. É nesta hora que a pessoa acorda em seu corpo e volta a sentir dor.
Quando as células cerebrais morrem, para onde vão as lembranças? Na visão materialista, as memórias residem nas sinapses cerebrais. Ninguém sabe ao certo por quê alguns se recordam de tantos detalhes enquanto outros apagam trechos inteiros. Muitos recordam vividamente todos os fatos de sua vida. Alguns relatos incluem encontros com os espíritos de parentes, amigos ou desconhecidos mortos. Poucos relatam encontros com conhecidos vivos. Durante a experiência, alguns encontram uma esfera que encerra todo o conhecimento do Universo, na qual o ego desaparece, com a impressão de unificação de todos os seres.
Na minha experiência pessoal, como sobrevivente de uma quase-morte há alguns anos, voltei transformada, agindo de forma mais solidária e mais desprendida de valores materiais. O medo da morte desapareceu. Se por um lado fiquei menos religiosa, por outro passei a ter certeza da existência da vida além da morte e de um Ser de luz que, amorosamente, rege todo o Universo.
Faltam ainda muitos encaixes essenciais para que o quebra-cabeça faça sentido inteiramente. Não há provas da existência da vida além-túmulo, mas os cientistas também não acharam provas de que ela não existe. Para isso, ciência e religião terão que entrar no âmago de sua própria essência, para expandir fronteiras.
Esperemos até que a morte nos encontre. Aí, então, saberemos.