Cada um é o que pode
Quem assistiu à antiga novela Carrossel, que até hoje encanta crianças e adultos, com certeza deve lembrar de Jaime, filho de um mecânico. Todos o consideravam alguém com um “coração enorme”, porém eram obrigados a concordar que ele estava muito longe de ser um aluno brilhante, pois só pensava em jogar futebol. O pai do menino, Rafael, vivia desgostoso porque desejava que ele fosse um aluno exemplar.
O desgosto de Rafael explodiu quando ele conheceu o riquinho esnobe Jorge Del salto, ficando cheio de inveja quando o pai do mesmo disse que o menino estudava inglês, francês e piano. Ao conversar com Jaime, Rafael jogou na cara do filho tudo o que ele não era, chamando-o inclusive de burro. O menino, para se defender, disse: “Papai, eu sou o que posso.” Engraçado que o próprio Rafael, nos seus tempos de estudante, também havia sido um estudante medíocre. Esta história mostra como certos pais exigem dos filhos que sejam o que eles próprios não conseguiram ser e não entendem que não deveriam, sob hipótese nenhuma, comparar seus filhos, seja entre si seja com outras crianças.
A frase de Jaime merece ser analisada porque diz uma grande verdade: cada um é o que pode. Talvez os pais impliquem com uma criança por ela não ser boa em matemática e deixem de considerar suas muitas outras qualidades, como ser boa nos esportes. Além disso, o pai de Jaime, um mecânico, pareceu esquecer que se Jorge podia estudar inglês, francês e piano, era porque o pai tinha condições financeiras de lhe proporcionar uma educação esmerada. Não foram poucos os que censuraram Rafael por sua inveja, dizendo-lhe que, entre a inteligência de Jorge e a bondade de Jaime, preferiam a bondade deste último.
Querer que os filhos sejam o que eles sentem que não podem ser é uma atitude injusta e, em certos casos, cruel. Um bom exemplo é o do livro Marcas de nascença, de Nancy Huston. Nele, Sadie, criada por avós bastante rígidos, sente-se constantemente pressionada porque a avó a obriga a estudar balé e piano e vive a reclamar do fato dela ser desajeitada e viver tropeçando. Mas Sadie é boa aluna e tem notas altíssimas, o que os avós parecem não valorizar. A avó, inclusive, reclama do fato dela ler tanto.
Como vemos bem, existem pais que não entendem que cada pessoa é única com seus talentos, personalidade, qualidades e defeitos. Em vez de criticar alguém por não ser como esperamos, passemos a apreciá-lo pelo que é.