papel dos artigos de revisão vai além de sintetizar o conhecimento atual sobre um tema de pesquisa
Um Artigo longo mas bastante interessante.
Bom dia a todos!
Imagem: Didssph.
Com o objetivo de estar informado sobre os recentes resultados de pesquisa em sua área, pesquisadores utilizam diversas técnicas, e muitas vezes lançam mão de artigos de revisão publicados em periódicos como Annual Reviews. Estes periódicos publicam artigos de revisão sobre tópicos de uma área que reúnem, sintetizam e reportam o que há de essencial no período de um ano em um tópico em particular. Sendo o(s) autor(es) destas revisões, especialista(s) ele(s) próprio(s) no tema, a escolha dos artigos que integram a revisão, a análise dos dados e discussão estão fortemente influenciados por seu ponto de vista. Ademais, o que ocorre com as citações dos artigos originais citados nas revisões, aumentam, pelo fato do artigo ter sido colocado em destaque, ou diminuem, porque a revisão “suprimiu” a importância do artigo, que passa a ser citado em seu lugar? Foi para responder à estas questões que Peter McMahane Daniel Mc Farland1 analisaram uma amostra de aproximadamente seis milhões de artigos. Os resultados mostram que para a maioria dos artigos, a inclusão em revisões diminui as citações recebidas. Para uma fração menor, no entanto, ocorre exatamente o oposto, revelando um importante aspecto das revisões e seu potencial papel no futuro das pesquisas.
A amostra de artigos foi obtida a partir dos 50 periódicos mais citados pelos 52 Annual Reviews indexados na Web of Science e coletando todos os artigos publicados por estes periódicos entre 1990 e 2016. Esta metodologia forneceu 5.9 milhões de artigos publicados em 1.155 periódicos através de 27 anos. As citações aferidas no estudo, antes e depois da inclusão dos artigos nos Annual Reviews, foram obtidas na base Web of Science no mesmo intervalo de tempo. Cabe ressaltar que artigos publicados em periódicos Annual Review não são submetidos à avaliação por pares – são redigidos por autores considerados especialistas em suas respectivas áreas a convite do Corpo Editorial.
Comparando os perfis de citações e redes de cocitação de seis mil artigos na Web of Science, os autores observaram que 70% das citações dos artigos que integram um Annual Review decrescem, mais rapidamente do que seria esperado da redução natural, em decorrência do seu ‘tempo de vida científico’. A medida deste efeito pode ser bastante pronunciada: a mediana do artigo citado terá 38% menos citações durante o restante de sua vida científica após ter sido incluído em apenas um artigo de revisão. Isso se deve ao fato de o artigo de revisão passar a ser citado ao invés do artigo original.
No entanto, uma pequena percentagem dos artigos apresenta um aumento considerável de citações após sua inclusão em um artigo de revisão, sugerindo que um processo de diferente natureza está ocorrendo.
Sabe-se que elaborar um artigo de revisão passa por selecionar ao menos uma centena de artigos sobre um determinado tema. Ademais, este trabalho requer um profundo conhecimento do tópico, geralmente obtido por meio de formação acadêmica e muitos anos de experiência em pesquisa. Artigos de revisão não se limitam a relatar o consenso sobre um tópico ou um resumo do que foi publicado em um determinado período. Se trata de interpretação por um especialista sobre um tema, apoiado por uma extensa fonte de literatura científica. Segundo McMahane e Mc Farland, revisões são traduções de subtemas científicos. Observa-se que revisões são mais frequentemente elaboradas sobre temas científicos emergentes. Suas redes de cocitação mostram que são formadas por clusters de pesquisa fracamente interconectados. Durante o processo de revisão, os clusters são conectados por outros artigos que fortalecem as conexões entre eles, levando a pontes densamente conectadas, o que, por sua vez, leva ao incremento de citações e consequente fortalecimento da pesquisa emergente. Para compreender melhor, os autores utilizaram os exemplos a seguir.
O estudo utilizou três exemplos para explicar como funciona a elaboração de artigos de revisão, além de permitir a elaboração parcial de uma evolução estrutural dinâmica. Um deles é sobre Modelos de Avaliação Integrada para Mudanças Climáticas – publicado no Annual Review of Energy and the Environment3; outro, sobre Estrutura Geográfica das Populações de Insetos: Fluxo Gênico, Filogeografia e seus Usos – publicado no Annual Review of Entomology4 e o terceiro, sobre Tratamento de Superfície de Polímeros para Biocompatibilidade, do Annual Review of Material Science5. Nos três exemplos, diagramas de citação intra e inter domínios antes e depois dos artigos terem sido incluídos nos Annual Reviews foram traçados. Os resultados permitiram observar que as redes centralizadas observadas antes da revisão se transformaram em redes que tendem do centro à periferia, mostrando que os artigos citados pelas revisões nos três exemplos passaram a ter maior visibilidade fora de seu domínio inicial de citações, no qual sua inclusão na revisão foi decisiva para “romper as barreiras” de visibilidade para fora do cluster inicial, emergindo como um subtema científico emergente. Nos três casos, os artigos específicos selecionados pelas revisões por sua relevância para os clusters individuais, estas mesmas publicações se tornaram citações-chave na literatura acadêmica no período pós inclusão na revisão.
É preciso considerar, sobretudo, que artigos de revisão não se limitam a reunir artigos, resumir o conhecimento em um tema e apontar a tendência na maioria das publicações. Pelo contrário, como foi ressaltado, estas publicações ocupam uma posição privilegiada especialmente em áreas emergentes de pesquisa. Ao defender uma definição em particular de um estudo em uma revisão, esta definição adquire uma influência social importante e influencia futuras pesquisas relacionadas à esta especialidade. Assim, a interpretação de artigos de revisão pode definir uma agenda para o futuro de temas acadêmicos. Em suma, uma revisão pode não apenas definir o que foi, mas também o que poderá vir a ser. Como afirma McMahan, “à medida que o volume de conhecimento continua a se expandir, é difícil imaginar como podemos entendê-lo sem a curadoria provida pelas revisões”