O PLANO DIRETOR

Falando diretamente: a população ainda não entendeu do que se trata!

Peço vênia e explico, afinal dois dedos de prosa nunca fizeram mal a ninguém. Todavia, antes que algum incauto ache por bem impingir ao meu discurso ares de soberba, é bom que se frise que se trata de opinião pessoal calcada em larga experiência profissional como Arquiteto, Urbanista e Advogado.

Mas, voltando ao que interessa, torno a frisar que o que tenho visto e lido permite a constrangedora constatação que abre o presente artigo.

Não sei se por desinteresse, falta de informação ou, até, má-fé dos que por dever de ofício têm a obrigação de zelar pelo bem público.

A cidade é o local de encontro por excelência, aliás, foi assim que a maioria delas nasceu, nos cruzamentos de rotas de comércio. Ou seja, do encontro de pessoas. Assim, bem faziam os antigos que colocavam as suas cadeiras na calçada e tratavam de interagir com os seus semelhantes. Infelizmente a nossa sociedade, pelos mais diferentes motivos, caminhou na direção do individualismo, do egoísmo e da supremacia da esperteza.

Minha análise não se restringe a apenas um aspecto, seja filosófico ou sociológico, mas ao conjunto de fatores inerentes à vida nas cidades (de qualquer tamanho). A verdade que precisa ser dita é que existe vida além do portão da sua casa.

A rua e a praça são os locais de encontro, de congraçamento e manifestação, ou seja, de convívio. Falsamente imaginamos interagir com a televisão, com a idéia de aldeia global, e muitos de nós até dão “boa noite” para os apresentadores do Jornal Nacional, enquanto passam desapercebidos de seus próprios vizinhos.

Devemos ter em mente que a urbanidade, na definição do Dicionário Aurélio é: “qualidade de urbano, civilidade, cortesia, afabilidade”. Portanto, viver na cidade deveria ser pautado pela civilidade e pela cortesia, ao contrário do que pode ser observado no dia-a-dia das nossas aglomerações urbanas.

Ainda não é tarde, mas penso que o fato de nos posicionarmos divididos entre ecologistas, de um lado, e desenvolvimentistas, de outro (só para citar dois dos inúmeros “grupos” que se digladiam nessa área) somente irá trazer prejuízos para a população como um todo. Precisamos acabar com a mania legiferante que assola nosso país, de achar que tudo, ou quase tudo, pode ser resolvido na canetada de um Decreto ou de uma Lei. A vida em sociedade demanda regras, é claro, e ninguém, em sã consciência, vai ser contra regras de convivência. Mas seria bem melhor se as situações dinâmicas, que envolvem as zonas urbanas, fossem tratadas sem as intermináveis amarras legais que, no mais das vezes, impedem mais empregos e circulação de riquezas.

A cidade é um organismo vivo, se expande, se retrai, se deteriora, em movimentos constantes e concatenados. Não fica bem amarrá-la, amordaçá-la de modo que se impossibilite a sua respiração.

São inúmeros os exemplos de áreas urbanas abandonadas, deterioradas enquanto que outras se expandem rapidamente, goste o legislador, ou não.

O que pretendo é ver a discussão ser aprofundada entre aqueles que serão atingidos pela Lei e não a discussão acadêmica restrita aos intelectuais, à elite e aos políticos (quando comparecem).

Não acredito que técnicos, por mais bem treinados e bem intencionados que possam parecer, tenham a senha para o bem estar da população.

Os mecanismos de discussão dos Planos Diretores foram todos falhos, e por que não dizer: excludentes. Deveria ser publicado nos jornais, discutido à exaustão e votado. Mas não por vereadores e sim por todos os moradores. A população deveria ser chamada a opinar diretamente e não através de seus representantes. Afinal, quando se quis lavar a mão, a questão do desarmamento virou plebiscito (E nessa hora, a população sabia o que estava fazendo?). Não deveríamos permitir que vereadores, prefeitos e políticos em geral (muitas das vezes amparados em pareceres técnicos elaborados sob encomenda) barganhassem com a nossa qualidade de vida. Não pensem que vou defender vaga-lumes contra eventual ataque de “stress”, nem tampouco subscrevo a ocupação ilegal das margens de uma represa, mas é preciso estender a democracia para além das urnas eleitorais (ou seja, nem tanto ao céu, nem tanto ao inferno). Estou convencido de que é preciso uma maior participação popular nas questões urbanas. Como fazê-lo? Cabe aos nossos vereadores, se é que realmente representam a população, a pensar em um mecanismo útil e eficaz.

Carlos Américo Kogl

Arquiteto, Urbanista e Advogado

SE UTILIZAR ESTE TEXTO, CITE O AUTOR