O Brasil e a Segunda Grande Guerra

A neutralidade brasileira durante o conflito armado entre potências, no geral ocidentais, na fase da Segunda Grande Guerra, foi encerrada após pressão norte-americana ideológica e política. O posicionamento tomado pelo Brasil, que anteriormente mantinha boas relações com a Alemanha e despertava o fascínio despótico do então dirigente do país, Getúlio Vargas, viu-se envolto nas amarras da guerra quando navios brasileiros foram atacados pelos então “aliados”. Assim, Brasil e Alemanha rasgavam acordos diplomáticos e teriam de num caso ou outro estarem de lados antagônicos. Era uma ditadura combatendo a outra, ironia socialmente histórica.

A historiadora Bezerra afirma que, apesar dos americanos se oporem, o governo brasileiro queria enviar soldados para o conflito. Foi uma forma até eficaz de Getúlio Vargas aproveitar o ensejo para modernizar as forças armadas brasileiras e impulsionar a industrialização, mesmo que tardia, na construção de uma usina siderúrgica em território nacional. Um dos papéis exercidos pelo país na disputa seria o de suporte aos combatentes na famigerada Europa. O Brasil promoveu, como afirma Struck, a produção de borracha na Amazônia, já que parte da produção mundial se encontrava sobre controle nipônico. Todavia, os americanos forneceram milhões de dólares em armas e munição, além de linhas de crédito para ajudar na industrialização do país (STRUCK, 2019).

Ainda assim, o fato de que submarinos alemães atacavam embarcações brasileiras e poupavam as do Chile e Argentina, países que ainda mantinham relações com o Eixo (BARONE, 2013) impeliram o país a cruzar o Atlântico e confrontar o inimigo. A partir de 22 de Agosto de 1942 o Brasil demoraria para entrar no combate mas, inauguraria campanhas da improvisada FEB, que ganharia seu respeito frente aos adversários pela ferocidade e determinação nos embates em território italiano. Moreira diz que, a estruturação da FEB se iniciou com o envio de oficiais brasileiros aos Estados Unidos, o objetivo mais claro: treinamento para atuarem no teatro de operações. Dessa forma, o exército brasileiro buscou se preparar antes e foi entrar em campo de batalhas de forma ainda confusa, muito especialmente por conta do uniforme. Barone lembra que, a vestimenta do Exército brasileiro lembrava os uniformes alemão e italianos, pela sua coloração esverdeada e a quantidade de botões na parte da frente das jaquetas. Além disso, importante ressaltar que o Brasil só desembarcou na região italiana no ano de 1944, ou seja, dois anos após declarar guerra ao Eixo.

Havia diferenças logísticas entre brasileiros e americanos, a quantidade de equipamentos das tropas vindas dos Estados Unidos era quase infindável. Aos soldados pracinhas da FEB lhes coube utilizar balas, material cirúrgico e capacetes fornecidos por depósitos americanos e como enfatiza Barone, devidamente pagos pelo governo brasileiro. Os cobras fumantes enfrentaram os rigores climáticos de um território pouco conhecido e montanhoso. Os combates mostraram-se violentos alheios à gestos de trégua, pois os alemães dificilmente cediam suas posições. Os terrenos e locais na Itália eram disputados com veemência entre aliados e o pouco do que restara do Eixo. Cataldo enfatiza que com toda adversidade, os soldados brasileiros conseguiram capturar uma divisão completa alemã na Itália. A FEB teve baixas em suas fileiras, pois o inimigo era bem preparado e já fazia tempo que vinha combatendo em diversas áreas da Europa. Diversos dos bravos soldados brasileiros retornariam mutilados, outros perderam suas vidas numa luta adversa de ideias, afinal, eles afrontavam um regime totalitário junto aos aliados por “liberdade democrática”, enquanto que seu próprio país era presidido em moldes ditatoriais.

Ao final do conflito, muitos dos pracinhas retornariam o Brasil com diferentes ideias, no âmbito político e militar. As estruturas latifundiárias que sustentavam o governo ditatorial de Vargas viriam ruir muitas de suas aspirações, pois a guerra mudara visões estereotipadas de soldados e oficiais. Muito dos cobras fumantes seriam lembrados em solo italiano por contribuírem na derrocada das forças do Eixo e suas malfadadas articulações ideológicas e sociais. A FEB seria exaltada por outros atores daquele palco de horrores e, embora nacionalizada como símbolo de patriotismo, seria quase esquecida em seu próprio país.

REFERÊNCIAS

BARONE, João. 1942: O Brasil e sua guerra quase desconhecida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013.

BEZERRA, Juliana. O Brasil na Segunda Guerra Mundial. 2019. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/o-brasil-na-segunda-guerra-mundial/> Acesso em 13 de Outubro de 2019.

CATALDO, Diego. Cobras Fumantes: a história dos “Três Heróis Brasileiros” na Segunda Guerra Mundial. 2019. Disponível em: <https://medium.com/@diegocataldo/cobras-fumantes-na-segunda-guerra-mundial-d2ab1415261e>

MOREIRA, Regina da Luz. 1944: O Brasil vai à guerra com a FEB. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/FatosImagens/FEB> Acesso em 16 de Outubro de 2019.

STRUCK, Jean-Philip. 1942: Brasil declarava guerra à Alemanha. 2019. Disponível em: <https://www.dw.com/pt-br/1942-brasil-declarava-guerra-%C3%A0-alemanha/a-40193784> Acesso em 19 de Outubro de 2019.