Conflito entre Patrícios e Plebeus
Conforme Alföldy (1996), a contradição fundamental na ordem social romana inicial, que se expressava em fortes conflitos sociais e políticos e que desencadearam um processo de transformação na estrutura social e política, foi o conflito entre a nobreza de sangue e terra (os patrícios) e os cidadãos comuns, cujos direitos eram limitados (a plebe).
As causas do conflito entre patrícios e plebeus devem ser buscadas no desenvolvimento econômico, social e militar da Roma arcaica. Por um lado, ele foi determinante na exploração econômica e opressão política dos nobres sobre amplas massas de população; por outro, a partir do século VI a.C. ela intensificou o processo de diferenciação entre plebeus e patrícios como estamentos separados, em virtude da qual as tensões entre nobres e cidadãos comuns se tornaram maiores, e as pessoas foram capazes de declarar guerra à elite.
O boom econômico da jovem Roma permitiu, segundo Alföldy (1996), que artesãos e comerciantes, que eram pouco dependentes das famílias patrícias, acumulassem fortuna, permitindo-lhes adquirir, inclusive, armamento. No mesmo contexto, outros grupos populacionais entraram em uma situação econômica e social catastrófica, devido à perda de terras e endividamento, particularmente um grande número de pequenos camponeses, que deveriam distribuir, geração após geração, o modesto patrimônio familiar entre mais e mais herdeiros que não podiam mais se sustentar adequadamente com sua produção agrícola.
Os plebeus pobres e os plebeus ricos tinham objetivos diferentes; os primeiros aspiravam a igualdade política e social com os patrícios; os pobres, por sua vez, queriam simplesmente melhorar sua situação econômica e posição social, inclusive o perdão de dívidas e maior participação no aproveitamento de terras estatais. Entretanto, esses dois grupos tinham o conflito com a nobreza em comum, o que naturalmente os levou a se aliarem.
O primeiro passo decisivo nesse conflito, conforme Alföldy (1996), e ao mesmo tempo o primeiro grande triunfo dos plebeus, foi colocar em funcionamento suas próprias instituições: isso significava uma organização para auto-defesa e luta política, além da união dos plebeus como ordem autônoma. Por exemplo, como uma alternativa à assembleia popular, dominada pelos patrícios, os plebeus realizavam suas próprias assembleias (contilia plebis) e nelas adotaram algumas resoluções (plebiscito). Inclusive elegeram chefes, os edis e os tribunos da plebe. Obviamente, as instituições plebeias não foram inicialmente reconhecidas pelo patriciado, mas, segundo Kondratieff (2013), em 287 a.C. o tribuno havia se tornado a principal instituição legislativa de Roma e seus plebiscitos eram obrigatórios para todos os cidadãos romanos.
Por meio do uso agressivo de seus poderes legislativos e obstrutivos, os tribunos plebeus do final do século II a.C. ajudaram ainda a desencadear a chamada "Revolução Romana", um século de conflito civil e militar que culminou com o estabelecimento do principado de Augusto. Conforme Kondratieff (2013), até o final da era imperial o tribuno da plebe permaneceu com certa importância, mesmo tornando-se uma mera posição administrativa urbana, pois era uma etapa na carreira política.
Um segundo triunfo dos plebeus foi forçar uma divisão de toda a cidade em tribos de acordo com um princípio de divisão favorável a eles, o que, consequentemente, permitiu a formação da assembleia popular de acordo com seus interesses.
Os plebeus conseguiram uma terceira vitória em meados do século V a.C., segundo Alföldy (1996), com a codificação da Lei das Doze Tábuas. Não que fosse uma legislação inovadora ou muito favorável a eles, mas o simples fato de haver uma legislação escrita implicou uma reforma política de grande importância: a partir daí o cidadão comum tinha condições de apelar contra a injustiça e violência dos poderosos se valendo de disposições penais precisamente registradas. A Lei das Doze Tábuas também legislou na sociedade romana a consideração da riqueza como critério de estratificação social, o que resultou em benefício especial aos plebeus ricos.
ALFÖLDY, Géza. Historia Social de Roma. Versão espanhola de Víctor Alonso Troncoso. Madrid: Alianza Editorial, 1996.
KONDRATIEFF, Eric J. Tribuni plebis. The Encyclopedia of Ancient History, p. 1-5, 2013.