A HUMANIDADE NÃO DEU CERTO
Alguns questionamentos a respeito da afirmação :
-----> Afirmar que a humanidade 'não deu certo' pressupõe a existência de um roteiro, um itinerário existencial que legitimasse a humanidade e a própria vida, coletivamente falando?
-----> O que seria 'dar certo' na perspectiva de quem abre mão de sua própria existência?
-----> O fracasso de um homem é o fracasso de toda a humanidade?
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Acrescento que não tive a intenção de depreciar o ator, ou me referir a ele de forma pejorativa a partir de seu ato extremo : para mim, no entanto, está claro que nesse caso em especial a decisão pelo auto-extermínio está diretamente relacionada com a opinião de que 'a humanidade não deu certo'.
Em que medida uma visão não tão otimista pode ser determinante do suicídio é outra questão a ser considerada, mas creio ser razoável supor que suicídio não é algo normal, e por normal quero dizer 'compatível com a vida'.
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Creio que gostamos de ver a nós mesmos como preponderantemente racionais, ao menos a maior parte do tempo e sobre praticamente tudo, é interessante parecer racional e ponderado, suponho.
O fato de que talvez não sejamos tão racionais quanto gostaríamos nem nos ocorre, na verdade.
Sendo sinceros a respeito do que acreditamos talvez percebamos que não temos muita certeza a respeito de como sabemos que sabemos, de quão confiáveis são os processos pelos quais chegamos à verdade.
Na maior parte do tempo apenas decidimos por afinidade o que é a verdade, a partir do que nos pareça mais conveniente.
De uma perspectiva leibniziana, digamos, se algo existe é razoável supor que exista uma razão para tanto, então algo que constitua exatamente a negação mesma disso parece não fazer sentido algum... mesmo um neo-darwinista eventualmente chegaria a indagar, por razões completamente diferentes, o despropósito do suicídio num pano de fundo da existência humana.
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A coisa mais terrível sobre suicídio eu li de uma poetisa, Anne Sexton : ela disse, a respeito das causas do ato, que o suicida simplesmente decide que em algum momento a coisa vai rolar, e a partir daí a causa não importa mais, é só a mecânica da coisa que importa, só o 'como'.
Ninguém engole uma conversa dessas, suponho, principalmente porque se começarmos a levar a sério tal perspectiva, a própria natureza de estar aqui, de continuar existindo, parecerá ainda mais desesperadora, vazia de significado, empobrecida de uma forma terrível.
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