Ciências humanas em tempo real. Lições sobre a pandemia de Covid-19

A pandemia de Covid-19, também conhecida como novo coronavírus, tem abalado as estruturas ideológicas do capitalismo e do conservadorismo. Por meio de uma pequena lista, buscarei endossar o que já tem sido destacado por outros progressistas sobre essa situação.

1. Estado mínimo e mercado livre não funcionam

Em uma situação de emergência máxima, como a que estamos vivendo, é o Estado que está socorrendo a população, independente do quão ineficiente possa ser, informando-a, orientando-a e se possível ajudando-a em caso de contaminação e tratamento. O mercado ou empresários pouco fazem neste momento crítico se estão mais preocupados com seus lucros do que com vidas humanas. Quando fazem, é ainda pensando nos lucros que obterão no futuro, nunca desinteressadamente, pelo prazer de ajudar. Na verdade, eles são os que mais têm atrapalhado, por exemplo, no norte da Itália, em que medidas de distanciamento social foram atrasadas porque empresariado e governos locais associados ficaram com medo dos efeitos negativos e inevitáveis das mesmas em relação à 'economia', quer dizer, aos seus negócios. Não é surpresa pra ninguém, com conhecimento em sociologia e psicologia, que esses sociopatas não estejam preocupados com o número de vítimas, contanto que isso não os deixe em desvantagem quanto às suas expropriações cotidianas.

1.1 Conservadores não são mais racionais que progressistas

A racionalidade é a capacidade de aprender com a experiência, de ponderar ações e suas consequências, de seguir apenas fatos e conhecimentos. O norte da Itália, principalmente a rica região da Lombardia, se tornou um exemplo negativo para o mundo, porque suas ''elites'' econômica e política, se negaram a reconhecer o risco de epidemia dessa doença e quando já era tarde demais decidiram agir, impondo a quarentena. O resultado nós podemos ver pelo número de infectados e mortos. A experiência deles, no entanto, não parece ter despertado para a razão a maioria dos conservadores de outros países. Em um momento urgente, em que mais se exige inteligência, eles estão mostrando que, se crentes ou ateus, não conseguem pensar a longo prazo, holística e empaticamente. Uma onda de infecções e mortes evitáveis e continuam agindo de maneira irracionalmente confiante, desprezando a doença. E isso não é apenas com 'fazendeiros' e 'gado' da "extrema' direita brasileira. Nos EUA, a maioria dos estados, governados por republicanos conservadores, especialmente por ''trumpistas'', têm feito pouco caso em relação a esse super problema. Pesquisas recentes apontam grande e contínua aprovação conservadora ao Donald Trump, apesar de sua campanha desastrosa na detecção precoce e contenção de infecções do novo coronavírus por terras estadunidenses. Tudo isso graças à incapacidade de raciocínio e compreensão além do instinto tribal e falta de empatia com as potenciais vítimas da Covid-19, características de pessoas de direita.

Existem exceções notórias de países ou governos variavelmente progressistas que reagiram letargicamente ao novo coronavírus, por exemplo, os governos democratas do estado e da cidade de Nova Iorque e a Suécia (essa última, absolutamente chocante). Mas, a exceção prova a regra. Se ocorreu uma mega manifestação de feministas na Espanha, quando a Covid-19 já castigava a Itália, país próximo,e com grande intercâmbio humano, em todos os continentes: grupos religiosos, empresários e autoritários fascistas têm sido os maiores responsáveis pelo atraso no combate cientificamente viável à propagação da doença, pelo simples fato de desprezaram as vidas...dos outros e também a ciência, substituída por vozes convictas de suas cabeças primitivas.

Não.

O típico progressista não é idealmente racional ou, ao nível de filósofo. No entanto, a tese de que a crença e/ou atitude conservadora produz uma mentalidade mais ponderada, continua a ser refutada pela experiência, se milênios de refutações já não bastaram.

2. Solidariedade importa

Em meio a um cenário sombrio e incerto, iniciativas solidárias se multiplicaram pelo mundo. Sim, com a iminência da morte rondando familiares e amigos, muitas pessoas perceberam que, no final de tudo, somos todos iguais e que os mais vulneráveis merecem ser protegidos. A vida é o mais importante e que estamos todos dependentes uns dos outros. Pena que essa solidariedade tenha se expandido apenas para outros humanos e não sei se por muito tempo... não tenho criado expectativas de que depois da pandemia o mundo não será mais o mesmo e finalmente entraremos em uma fase dourada de sabedoria...

3. A destruição do meio ambiente e a predação de seres vivos precisam parar

A ideologia desenvolvimentista, popular em todos os lados do espectro político, segue o ritmo descontrolado dos passos de psicopatas que só pensam em enriquecer ou aumentar seu poder às custas da miséria da humanidade e da natureza. Se não morrermos de pandemia, a destruição do meio ambiente é muito provável que irá causar cataclismos climáticos sem precedentes. Os efeitos na agricultura, nas zonas urbanas, até mesmo na própria atmosfera, têm potencial para serem terríveis. A maioria das doenças infecciosas têm origem zoonótica, isto é, vírus e bactérias que saltaram de outras espécies para o ser humano, infectando-o. A diminuição severa do consumo de "carne", uma das principais vias de transmissão, seria uma medida importante e possivelmente viável. Ainda acho complicado impor o veganismo pois tenho minhas dúvidas se a grande maioria dos seres humanos estão adaptáveis a uma dieta como essa. No mais, a longo prazo, talvez possa ser possível ao menos fazer a transição deste modelo extremamente equivocado de alimentação excessiva e industrializada que temos consumido por outro bem menos ostensivo. Também é preciso retomar a retórica da explosão demográfica, esquecida a partir da década de 90, já que, quanto mais seres humanos no mundo, maior a destruição do meio ambiente, até pela expansão urbana contínua ou descontrolada.

4. Renda básica universal ou... sim, os trabalhadores são fundamentais para a sociedade

Em um outro texto-pensamento, eu comentei que, ao invés de chamarmos as classes trabalhadoras de classe baixa, devemos denomina-las como basais, já que são elas que, de fato, sustentam a sociedade, por corresponderem à base dessa pirâmide desigual. Nada de hierarquia super-verticalizada de tratamento, em que alguns são alçados à condição de semideuses e outros reduzidos ao mínimo em importância... Cada um contribui à sua maneira ['alguns'' apenas parasitam] e em tempos difíceis fica claro nossa interdependência. O cientista que estuda para descobrir a cura ou a vacina para as doenças; o artista que entretém ou alimenta nossas almas; o agricultor e o comerciante que alimentam nossos corpos; enfermeiros e médicos que cuidam dos doentes, etc... o filósofo que, juntamente com o cientista, procura pelas soluções mais sábias para lidar com os problemas, bem como também de apontar erros e sim, culpados: humanos, ideológicos e/ou circunstanciais..

Quanto à renda básica universal, também em tempos difíceis, a igualdade social importa, não "apenas" por razões morais mas também funcionais, afinal, os trabalhadores precisam estar bem alimentados, felizes e confortáveis para trabalhar e produzir mais, não é??

A "ideologia" que está por trás desta medida tão requisitada por progressistas, na verdade, é a própria sabedoria, se todo ser humano moralmente decente (que não é um sociopata "de bem") merece ter o básico (e não necessariamente o "mínimo") de dignidade garantida durante a sua existência.

5. O capitalismo não tem plano B

Por ser um sistema sócio-econômico pautado pela concentração desigual e desregrada de riquezas nas mãos de uma minoria [de parasitas], que não se baseia em planejamento de longo prazo, não teria como ser naturalmente capaz de se preparar para vários cenários, inclusive essa situação extraordinária que estamos vivenciando. Pois quando acontece, a falsa dicotomia "vidas x 'economia'" se torna a principal linha de raciocínio de capitalistas/neoliberais.

"Continuamos no ritmo de curto prazo, de lucros, ou não??"

Aliás, pensando melhor, eles apenas mantêm o mesmo e falso discurso de ''escolha de Sofia'' de sempre: "salvamos pessoas ou 'economia'??". Não é à toa que a miséria e a desigualdade sejam entendidas por eles como efeitos colaterais, tranquilamente toleráveis, deste "remédio" amargo que teimam em nos empurrar.

Mais um Thiago
Enviado por Mais um Thiago em 11/04/2020
Reeditado em 06/06/2023
Código do texto: T6913595
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