Fragrância Feminina na Poesia – Sophia de Mello Br

Fragrância Feminina na Poesia – Sophia de Mello Breyner Andresen

Estamos dando continuidade a publicação destes pequenos artigos que visam mostrar um pouco da escrita poética feminina no cenário nacional e mundial.

Pretendemos, tão somente, falar da emoção de nossas descobertas literárias ao nos depararmos com a vasta produção feminina na construção de uma identidade poética.

É antes de tudo, uma gota de perfume que permitirá ao leitor curioso, buscar outras essências, a partir da publicação destes textos.

Sophia de Mello Breyner Andresen

Sophia de Mello Breyner Andresen nasceu no Porto, em 06 de novembro de 1919, num ambiente aristocrático.

Teve seu primeiro contato com a poesia aos 3 anos de idade, quando uma criada lhe recita “A Nau Catrineta”, que aprenderia de cor. Ainda antes de aprender a ler, já sabia declamar poemas de Camões e Antero de Quental, ensinados pelo avô.

Viveu entre Porto e Lisboa, sendo que após o casamento com o advogado Francisco Sousa Tavares, passa a morar definitivamente em Lisboa. Sophia teve grande intervenção cívica, contra a ditadura de Salazar, que predominava no país. Sócia fundadora da "Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos", a poesia é instrumento para cantar a liberdade, como se observa especialmente em O Livro Sexto. Foi Deputada à Assembléia Constituinte pelo Partido Socialista, depois da Revolução de Abril de 1974.

Escreveu seus primeiros poemas aos doze anos.No discurso poético de Sophia de Mello Breyner, pode-se observar, para além de traços marcantes de sua cultura clássica e do seu fervor pela cultura grega, uma clarividente luminosidade entre a linguagem dos signos e objetos. Explora temas diversificados em suas composições,sendo um dos mais presentes a paisagem natural, descrevendo-a com imagens abstratas, observando-se uma visão metafísica do mundo.

Sophia de Mello é considerada também escritora expoente da literatura infantil portuguesa. Destacamos títulos, como: O Rapaz de Bronze, A Fada Oriana e A Menina do Mar.

Sophia traduziu para o português obras de Claudel, Dante, Shakespeare e Eurípedes, tendo sido condecorada pelo governo italiano pela sua tradução de O Purgatório.

Livros Publicados:

- Poesia,em 1944

- O Dia do Mar, em 1947

- Coral, em 1950

- No tempo Dividido, em 1954

- O Rapaz de Bronze (Literatura Infantil), em 1956

- Mar Novo ; A Menina do Mar (Literatuta Infantil); A Fada Oriana (Literatuta Infantil). Escreve ainda um ensaio sobre Cecília Meireles na Cidade Nova, em 1958

- Noite de Natal (Literatura Infantil. Publica ainda o ensaio Poesia e Realidade,em 1960

- O Cristo Cigano, em 1961

- Livro Sexto, distinguido com o Grande Prémio de Poesia da Sociedade Portuguesa de Escritores, em 1964

- O Cavaleiro da Dinamarca (Literatuta Infantil),em 1964

- Geografia, em 1967

- A Floresta (Literatura Infantil); Antologia, Portugália, cuja 5ª edição (1985 – Figueirinhas) é prefaciada por Eduardo Lourenço, em 1968

- Grades, em 1970

- Dual, em 1972

- Publica em 1975 o ensaio O Nu na Antiguidade Clássica, integrado em O Nu e a Arte, uma edição dos Estúdios Cor

- O Nome das Coisas, em 1977

- Navegações, em 1983

- Árvore (Literatura Infantil), em 1985

- Ilhas, Texto, distinguido com os Prémios D. Dinis, da Fundação Casa de Mateus e Inasset-INAPA em 1990

- Obra Poética" em 1990, reunindo muitos dos seus livros de poesias, publicada, pela Editorial Caminho, em três volumes.

- Musa, em 1994

- Livro/disco "Signo", em 1994

- O Búzio de Cós, em 1998.

Também escreveu dois livros de ficção:

- Os Contos Exemplares, em 1962

- Histórias da Terra e do Mar, em 1984

Prêmios

- Grande Prêmio de Poesia da Sociedade Portuguesa de Escritores, 1964 (Canto Sexto)

- Prêmio Teixeira de Pascoaes, 1977 (O Nome das Coisas)

- Prêmio da Crítica, da Assoc. Internacional de Críticos Literários, 1983 (pelo conjunto da obra)

Prêmio D. Dinis, da Fundação da Casa de Mateus, 1989 (Ilhas)

- Grande Prêmio de Poesia Inasset/Inapa, 1990 (Ilhas)

- Grande Prêmio Calouste Gulbenkian de Literatura para Crianças, 1992 (pelo conjunto da obra)

- Prêmio 50 Anos de Vida Literária, da Assoc. Port. de Escritores, 1994

- Prêmio Petrarca, da Associação de Editores Italianos

- Homenageada do Carrefour des Littératures, na IV Primavera Portuguesa de Bordéus e da Aquitânia, 1996

- Prêmio Luis Miguel Nava, da Fundação Luis Miguel Nava, 1998 (O Búzio de Cós)

- Prêmio Camões 1999 (pelo conjunto da obra)

Poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen

Liberdade

Aqui nesta praia onde

Não há nenhum vestígio de impureza,

Aqui onde há somente

Ondas tombando ininterruptamente,

Puro espaço e lúcida unidade,

Aqui o tempo apaixonadamente

Encontra a própria liberdade

Cantar

Tão longo caminho

E todas as portas

Tão longo o caminho

Sua sombra errante

Sob o sol a pino

A água de exílio

Por estradas brancas

Quanto passo andado

País ocupado

Num quarto fechado

As portas se fecham

Fecham-se janelas

Os gestos se escondem

Ninguém lhe responde

Solidão vindima

E não querem vê-lo

Encontra silêncio

Que em sombra tornados

Naquela cidade

Quanto passo andado

Encontrou fechadas

Como vai sozinho

Desenha as paredes

Sob as luas verdes

É brilhante e fria

Ou por negras ruas

Por amor da terra

Onde o medo impera

Os olhos se fecham

As bocas se calam

Quando ele pergunta

Só insultos colhe

O rosto lhe viram

Seu longo combate

Silêncio daqueles

Em monstros se tornam

Tão poucos os homens

Um Dia

Um dia, gastos, voltaremos

A viver livres como os animais

E mesmo tão cansados floriremos

Irmãos vivos do mar e dos pinhais.

O vento levará os mil cansaços

Dos gestos agitados irreais

E há-de voltar aos nosso membros lassos

A leve rapidez dos animais.

Só então poderemos caminhar

Através do mistério que se embala

No verde dos pinhais na voz do mar

E em nós germinará a sua fala.

Bebido O Luar

Bebido o luar, ébrios de horizontes,

Julgamos que viver era abraçar

O rumor dos pinhais, o azul dos montes

E todos os jardins verdes do mar.

Mas solitários somos e passamos,

Não são nossos os frutos nem as flores,

O céu e o mar apagam-se exteriores

E tornam-se os fantasmas que sonhamos.

Por que jardins que nós não colheremos,

Límpidos nas auroras a nascer,

Por que o céu e o mar se não seremos

Nunca os deuses capazes de os viver.

Porque

Porque os outros se mascaram e tu não

Porque os outros usam a virtude

Para comprar o que não tem perdão

Porque os outros têm medo mas tu não

Porque os outros são os túmulos calados

Onde germina calada podridão

Porque os outros se calam mas tu não

Porque os outros se compram e se vendem

E os seus gestos dão sempre dividendo

Porque os outros são hábeis mas tu não

Porque os outros vão à sombra dos abrigos

E tu vais de mãos dadas com os perigos

Porque os outros calculam mas tu não.

As pessoas sensíveis

As pessoas sensíveis não são capazes

De matar galinhas

Porém são capazes

De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira

À roupa do seu corpo

Aquela roupa

Que depois da chuva secou sobre o corpo

Porque não tinham outra

O dinheiro cheira a pobre e cheira

A roupa

Que depois do suor não foi lavada

Porque não tinham outra

"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"

Assim nos foi imposto

E não:

"Com o suor dos outros ganharás o pão".

Ó vendilhões do templo

Ó construtores

Das grandes estátuas balofas e pesadas

Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor

Porque eles sabem o que fazem.

Exílio

Quando a pátria que temos não a temos

Perdida por silêncios e por renúncia

Até a voz do mar se torna exílio

E a luz que nos rodeia é como grades

Cantata de paz

Vemos, ouvimos e lemos

Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos

Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos

Relatórios da fome

O caminho da injustiça

A linguagem do terror

A bomba de Hiroshima

Vergonha de nós todos

Reduziu a cinzas

A carne das crianças

D'África e Vietname

Sobe a lamentação

Dos povos destruídos

Dos povos destroçados

Nada pode apagar

O concerto dos gritos

O nosso tempo é

Pecado organizado.

Poesia

Se todo o ser ao vento abandonamos

E sem medo nem dó nos destruímos,

Se morremos em tudo o que sentimos

E podemos cantar, é porque estamos

Nus em sangue, embalando a própria dor

Em frente às madrugadas do amor.

Quando a manhã brilhar refloriremos

E a alma possuirá esse esplendor

Prometido nas formas que perdemos.

Aqui, deposta enfim a minha imagem,

Tudo o que é jogo e tudo o que é passagem.

No interior das coisas canto nua.

Aqui livre sou eu — eco da lua

E dos jardins, os gestos recebidos

E o tumulto dos gestos pressentidos

Aqui sou eu em tudo quanto amei.

Não pelo meu ser que só atravessei,

Não pelo meu rumor que só perdi,

Não pelos incertos atos que vivi,

Mas por tudo de quanto ressoei

E em cujo amor de amor me eternizei.

Fonte de Pesquisa:

- Sites:

http://www.instituto-camoes.pt/escritores/sophia.htm

http://www.ipn.pt/literatura/sophia.htm

http://coqui.lce.org/jalopes/1919-xx.htm

http://www.ipn.pt/literatura/sophia.htm

© Fernanda Guimarães

Visite "De Amores e Saudades - Fernanda Guimarães":

www.fernandaguimaraes.com.br

Fernanda Guimarães
Enviado por Fernanda Guimarães em 17/03/2005
Reeditado em 25/08/2008
Código do texto: T6829