"Desmoiselles",de José Luiz Dutra de Toledo,antigo colega de Juiz de Fora.

A Internet de vez em quando nos pega de surpresa.Quando fui repórter e comentarista em Juiz de fora,Minas gerais,estado brasileiro,de onde partira o golpe militar,experenciei conviver com pessoas incríveis.Éramos tocados pela graça e pelo medo muito bem disfarçado,até de nós mesmos.A censura era violenta.Minha correspondência para o Barão Elias Domit era de tal forma aberta,rasgada e atrasada que o presidente do Instituto de Cultura Americana(I.C.A),do qual eu era delegada pela filial do Uruguai-um país representava o outro,que ele vivia puxando minhas rosdadas e jovens orelhas.Penso que,por causa do título,”Barão”deviam pensar que era um codinome!Uma das coisas que eu maisgostava de fazer,era crítica literária.Um dos motivos era que as editoras me mandavam livros de graça(José Olímpio,Vecchi,Record,Imago,Globo,Vozes,Laudes,RGd,entre outras).E sou leitora voraz desde muito pequena.Outro era intercambiar com os autores,trocar correspondência.Tudo de forma postal,pelos Correios,pois não havia Internet,lembrem-se.

Em certa época,um rapaz veio trabalhar conosco.Lia muito,tal e qual a colega.Tinha uma cabeça muito “plena de tudo um pouco”,Chamava-se José Luiz Dutra.E à força de passar a vida trocando de cidades e estados,não é que esqueci o nome,embora não esquecesse a pessoa?

Um dia,procurava uma certa Clevane,sobrinha de minha amiga Ana Cley,que é dentista ,fazendeira e herdou de mim o prenome-minha amiga e eu combináramos colocar na filha que tivéssemos,o nome uma da outra,quase mútuos anagramas-em um site de busca e lá encontrei meu nome ligado ao dele.Fui conferir seu artigo e não associei o nome do autor ao meu antigo colega.É preciso relembrar que desde o nascimento,viajei ,para morar,muito,conhecendo o triplo de pessoas que geralmente se conhece!

De qualquer forma,achei incrível o José Luiz Dutra de Toledo lembrar-se de quando fiz crítica literária nos Anos 60/70,em Juiz de Fora,Minas gerais, Br...E olha que colocou-me ao lado de peixes graúdos,eu,piabinha...Esse texo ,mandaram-me,estav na "Nave da palavra".pouco depois,também,antes que eu pudesse agradecer,mandaram me dizer que o autor partiu deste mundo.Alguém sabe alguma coisa ?

Clevane,21h,Belo Horizonte,num mar de recordações.

E eis seu texto:

De “A Nave da palavra,Edição nº120 - 21/11/2003

Desmoiselles

"Recentemente o Fundo Monetário Internacional e outras instituições financeiras multinacionais e multilaterais elegeram como modelar a política econômica argentina e deu no que todos já sabem. Deu chabú, deu caca das feias!... E o Fundo deixou os argentinos lá no fundo do poço e a tudo assistiram de camarote!... Agora a mesma sacanagem parece estar sendo adotada para cima do povo brasileiro (mergulhado em verdes mares de esperanças) com a anuência dos gestores do nosso próximo destino econômico. O Brasil é o novo modelo de política econômica endossado e consagrado pelo FMI!... Como robalos vivos após espanca-los à mesa. Relutantes, mesmo assim são devorados. Na eterna era do “quem come quem” (“era das espertezas” pseudo-ideológicas) dá tudo na mesma, uns servem de alimentos aos outros enquanto cantamos aquela conhecidíssima musiquinha “Hoje é o meu dia, amanhã será o seu e algum dia será o do Romeu”. Aí, imitando o Chacrinha, canto eu:”Oh Julieta, Oh Julieta, eu quero ver as suas piruetas!..” Anacoretas, Antonietas, Henriquetas, Marietas, Julietas e maricotas ou cocotas de todo o mundo, uni-vos!... Marylin Monroe e Julieta Pereira, em busca dos caquinhos dos seus velhos eus, se perdem no bosque das vãs penitências e das desculpas insinceras(onde se tem pencas de folhiculturas, tubos de creme dental Kolynos anos 50 e camisinhas usadas na primeira década do século XXI). A pior vingança que os humilhados podem reservar aos poderosos de plantão é garantir-lhes sucessivas vitórias eleitorais pois assim serão mais rapidamente desmascarados pela História. “Tudo já foi dito uma vez, mas, como ninguém escuta, é preciso dizer de novo.”_André Gide- citado por Uilcon Pereira à página 24 do seu livro A Educação pelo Fragmento editado em São Paulo – Editora do Escritor- 1996. A poeta juizdeforana Marta Gonçalves, esposa de um astrônomo que foi auxiliar do conceituado Nelson Travinick, e que comigo escrevia de graça na Gazeta Commercial (1969/1970) do Theo Sobrinho e do Sr. Paulo Lenz, publicou um belo poema sobre os seus álbuns de fotografias, no qual fala de um colar de mortos... Também em Juiz de Fora foi sepultado pelo anonimato cronológico o poeta pós-romântico e baudelaireano Washington Novaes (que tinha uma irmã moradora antiga no fim ou no começo da rua Santo Antonio). Vários obstáculos foram colocados às diversas antologias estaduais de poesia organizadas por Assis Brasil. No caso que melhor conheço- A Poesia Mineira no Século XX / Coleção Poesia Brasileira da Editora Imago- Rio de Janeiro – 1998 – nenhum poema de Carlos Drummond de Andrade pôde ser publicado nem fragmentariamente citado. O mesmo ocorreu com os poemas e autos natalinos de João Guimarães Rosa, com as letras musicais do Clube da Esquina, com as poesias de Hugo Pontes, Márcio Sampaio e Márcio Almeida (poesia visual)? Tudo por uma questão de direito autoral? São cabíveis ainda outros questionamentos: até que ponto a poesia de Aquiles e Joaquim Branco é cabível numa Antologia Poética criteriosa e seletiva como a citada? Até que ponto as letras musicais de Ary Barroso, Ataulfo Alves, Toninho Horta, Milton Nascimento, Suely Costa e outros seriam justificáveis numa obra como a que aprecio? A poesia de Hugo Pontes (poesia visual) ou as escritas poéticas de Márcio Sampaio, Sebastião Nunes, Márcio Almeida (de origens e posturas distintas) mereceriam espaços na Antologia da Poesia novecentista mineira de Assis Brasil? Ou seriam tão representativas quanto as obras e os autores selecionados para nela figurarem? Até mesmo a parca ou escassa e não marcante poesia natalina de João Guimarães Rosa (contista e romancista clássico e genial) deveria figurar entre os poetas selecionados para a obra em questão? Mas ainda ouso mais um questionamento: como justificar a lacuna ou não-citação da poesia de cordel do norte de Minas Gerais (estado barroco por excelência e, como tal, sem uma cultura que distancie tanto o “popular” do “erudito”)? E como explicar neste livro a ausência da poesia espírita de Chico Xavier? Chego à mesma conclusão do citado/incluído poeta Aricy Curvello: Enciclopédia é Enciclopédia (numa enciclopédia cabe tudo) e Antologia é Antologia (um trabalho mais seletivo e criterioso). Aqui seria então cabível uma discussão sobre cânones literários, discussão muito exigente e para a qual agora não teria fôlego teórico.

É bom relembrarmos (em tempo) que nas ditaduras (de direita, de “centro” e de esquerda) só é valorizada a “população útil” (da qual não fazem parte os dissidentes, as crianças e jovens especiais, os idosos – principalmente os nonagenários- , os doentes, os mendigos, os aposentados, os desempregados, os inválidos e demais abandonados).

O povo paga cada vez mais impostos (suporta uma crescente carga tributária, como diriam em medíocre economês) e espera ao menos ter a sensação de segurança mas a polícia tenta principalmente proteger a si própria enquanto corporação. E mesmo assim os policiais ainda correm riscos se saírem fardados às ruas!... Enquanto nos prometem dez milhões de novos empregos supervalorizam artificialmente a nossa moeda tornando as nossas mercadorias mais caras no mercado externo e gerando internamente mais desemprego, estagnação e desorientação econômica e se reforça cada vez mais um traiçoeiro fluxo de capitais especulativos para a nossa cada vez mais vulnerável economia. Isto explica porque patinamos tanto ao longo de todo o ano de 2003.

Lista dos doze melhores colunistas literários do Brasil nos últimos 50 anos: Wilson Martins, Paulo Hecker Filho, Jomard Muniz de Britto, Antonio Olinto, Zanoto, Sérgio Milliet, Clevane Pessoa de Araújo, Rui Mourão, Manuel Bandeira, Rachel de Queiroz, Álvaro Lins e Agripino Grieco. E mais ninguém!...

Você sabia que as pessoas que passam por várias transfusões de sangue podem acumular ferro no fígado? Leia na coluna “Você sabia que?” deste jornal. Admoestação: água mole em mó dura tanto bate até que fura. Ah!... Deixa de ser hepatomegalíaca, minha querida!...Chega, tá?!...

Há muito tempo o governo mineiro não patrocina através da sua Imprensa Oficial a edição de obras literárias. Muitos escritores queixam-se de terem os seus projetos e livros sido cozinhados em fogo brando por sucessivas gestões. Há muito tempo nem ouço falarem mais do insigne escritor João de Minas. Por que será? A galinha dos ovos literários mineiros não bota mais ?

O atual governo está tão repetitivo e sem saída quanto o roteirista da novela global Chocolate com Pimenta maniqueísta. Hum!... Que cheirinho de uma tachada de chouriços sendo ferventados!... Ah meus tempos!... Existem muitas mulheres brincando de “super-poderosas” no atual governo mas podem acabar com os seus cabelos sapecados. Aliás, os ricos e os medíocres da classe média se saem bem neste governo porque são tidos como formadores de opinião. Gargalhadas finais."

(texto composto entre os dias 7 e 16 de Novembro de 2003).

José Luiz Dutra de Toledo

Acabo de escrever e encontro,em KPLUS(htttp.cosmo.com.br/materia.asp?co=261&rv=literatura)

a minibio do José Luiz:

"Sobre o autor:

José Luiz Dutra de Toledo, professor, cronista, Mestre em História pela UNESP de Franca/ Estado de São Paulo (desde 1990); Prêmio Clio - 1992 da Academia Paulistana da História; organizador da Hemeroteca e da Biblioteca da Secretaria Municipal da Educação de Ribeirão Preto/SP; ex-professor das Faculdades Barão de Mauá de Ribeirão Preto/SP, visitou em 1999 o Uruguay em busca de textos de/ e sobre Lautréamont e proferiu palestras sobre a presença homossexual na História e na Literatura Brasileiras em Lisboa e Oporto em Janeiro do ano 2000; desde 1967 colaborava com jornais, suplementos culturais, revistas de 14 estados brasileiros e com vários sites literários (internet); nascido em Tabuleiro - Minas Gerais e falecido, aos 52 anos, em 03 de julho de 2004."

Lembro-me,de repente,muito bem dessa pessoa talentosa.Ele era muito bom em reportagens de rua.Como eu preferia escrever à mão por escrever muito mais depressa,que à máquina,na Gazeta Comercial,de Jyuiz de Fora,entregava a el meus metros de papel jornal manuscritos.Ele datilografa tudo para mim.Em troca,eu revisava suas matérias...

Depois de casada,não voltei mais à querida cidade e nunca mais o vi.

Recordo-o meio gordinho,bem claro,com óculos de lentes grossas...Passávamos horas filosofando e falando de política...

Que descanse dessa terra cansativa,mas nós,repórteres,gostamos mesmo é de lutar com palavras.Ele deve estar a registrar tudo lá nesse mundo paralelo do qual não nos lembramos,mas ao qual voltaremos...

Belo Horizonte,07/11/2005,Meia Noite,esfriando aqui nas Gerais.

Clevane Pessoa de Araújo Lopes