É FÁCIL TER CERTEZAS

Poucas coisas são mais fáceis que opinar sobre o que não se sabe, a facilidade advinda, talvez, da inconsequência com a qual é possível especular sobre o totalmente ignorado, o produto de uma elaboração mental gratuita sem qualquer compromisso com a realidade.

Sem razão de ser, por assim dizer, gratuita em sua leitura do objeto em questão, a opinião desprevenida só encontra justificativa no meio no qual geralmente é produzida, o da articulação banal, sem finalidade definida, típica, nesses dias, da terra de ninguém virtual das redes sociais.

O pronunciamento vazio é estimulado, em rede, pela necessidade implícita em toda algaravia sem sentido, a de ter um ponto de vista a respeito do que estiver em pauta, particularmente a necessidade de ser contra ou a favor de alguma coisa, pois na esfera do debate "sério", no Brasil, a única percepção relevante é se o articulista é favorável ou contrário a determinada visão, objeto, evento, etc.

Particularmente abjeto é tal estado de coisas quando o assunto abordado é exatamente a opinião pública e o que a alimenta. Aqui, o vazio substantivo típico das discussões sobre nada é envenenado pela terminologia imbecilizante da mentalidade politicamente correta, esse filtro diabólico pelo qual a realidade é subjugada e distorcida, moldada aos contornos da alma doentia da sociedade que se espera de um "futuro melhor".

A segurança desse tipo de discurso é garantida pela hegemonia ideológica em pleno curso, nesse país, consolidada ao longo dos últimos quarenta anos por agentes no ambiente acadêmico, nos órgãos de imprensa, na publicidade, setores do serviço público, Igreja e Forças Armadas.

A certeza, que dispensa tranquilamente a acepção da realidade, é validada pela tácita premissa de uma defesa pelo "lado certo da história".

Colocar em questão tal histeria coletiva demanda certa disposição para resistir à saraivada de chavões depreciativos codificados no jargão típico da tribo, qual seja, o das expressões de discurso metonímico nos quais se baseia a retórica da massa. Mesmo aqui, no entanto, o objeto em questão está dissociado de sua expressão verbal, que nada mais é que a inócua manifestação de emoções doentes, talvez, carência por visibilidade.

Nunca foi tão fácil ter certezas.

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Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 12/12/2019
Código do texto: T6817360
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