NO VALE DA MORTE...

Eu ainda não me acostumei a essa solidão tenebrosa, com gente passando por mim, e uma liberdade realçada, tão esquisitamente fria, que me priva de um sorriso, e me remete a um pranto insólito, que sempre tem hora para começar...

Aqui aonde as horas nunca determina limite, talvez porque nunca se percebe o ‘amanhecer’, posso afirmar por vivência: nada é tão tarde, nem tão cedo, que não se possa enxerga brilho excessivo, do pérfido esplendor da beleza.

Sem essa de ‘pudores’, porque aqui não há os compromissos arcaicos, nem as convenções da eventualidade. Aqui não há o mais ou o menos; há o muito mais e os que já morreram, mas ainda não lhe avisaram...

A minha necessidade dista precisamente o tempo de um piscar de olhos, e quase sempre eu costumo me adiantar para parecer ser, o que não consegui sê-lo. E quando a autoridade do labor me corrói as entranhas, sigo em uma completa inanição, que é assaz farta, para o sustento dos meus pensamentos...

É claro que não vou perder a ternura, tampouco quero endurecer o discurso, porque se não consigo ser poeta, como em Deus, pode o meu eco condizer com os devaneios de um trovador?

Para acalmar a fúria da minha lida, bebo água e fixo meu olhar no horizonte, de onde enxergo um acrimonioso marrom dourado, poético, estéril e insolente. Horizonte que me mostra agora a estampa que blinda esse chão dos ventos, e depois o censura numa frieza intemerata de uma geleira que não derrete...

Idiota é o que pensa que pode encontrar um lar onde nunca será a sua casa! Idiota é o que pensa que seu colchão é duro ou que seu osso é mole. Em terras alheias ‘meio-fio’ é hotel, viaduto é campo, e toda rodovia sempre exibe a inusitada passagem da partida!

Mas como o órfão sempre avista leite nos úberes de silicone do ébrio que moteja no carnaval, resta-me entrar na ‘coluna’ dos resilientes, e me poupar dos abusos abjetos que meu espelho me improvisa cumprimentar todas as manhãs...

Hoje o dia começou para mim bem perto do fim, e amanhã o fim pode ser sim, o melhor de todos os recomeços. O que sinto e o que vivo, quando escrito, pode até fazer os caquéticos ‘amigos’ expressarem alguma interjeição de emoção, mas esse estimulo humano, pífio e mentiroso eu conheço mais do que ninguém; e não me ajuda a saldar nem a inscrição mais pobre do meu epitáfio!

Aqui no deserto, os povos que o dominam costumam dizer que feliz é o homem que aprender a conviver no ermo, porque quando ele reencontra sua casa, por pior que seja, a considerará o melhor dos paraísos...

Meu pai completou hoje 77 aniversários, e essa minha jornada e qualquer um de seus êxitos eu dedico a ele; e a estrela que vejo agora, brilhando no céu infinito desse deserto é com certeza a minha avó Dete!

Vale da Morte, Nevada, 24 de junho de 2019

Carlos Henrique Mascarenhas Pires
CHaMP Brasil
Enviado por CHaMP Brasil em 25/06/2019
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