AMIGOS MEUS, AMIGOS DE MEUS ANTECESSORES
AMIGOS MEUS, AMIGOS DE MEUS ANTECESSORES
Quanto se tem de dois a 10 anos, os amigos de meus pais, são amigos de meus pais, e eu tive amiguinho;
Quando se tem de 15 a 40, tenho amigos e os amigos de meus pais principalmente no estágio final desta idade são por mim muito respeitados.
Quando tenho 60 ou mais, meus amigos são importantes pra mim, os amigos de meus filhos são importantes pra mim, os amigos de meus netos são importantes pra mim, mas quando já não se tem mais pais, os amigos de nossos pais são muito importantes pra nós. São Transcendentais.
Temos experiência importante na vida, e quem já passou de meio século de existência, já faz parte da história e tem muita história pra contar, teve muitas vitórias, muitas derrotas, muitos amigos por este caminho. Amigo do grupo, do ginásio, do colégio, da faculdade, dos trabalhos que exerceu, do futebol e de outras atividades esportivas ou de hobby.
Mas os amigos de nossos pais (pais que já se foram), são relíquias para nossa convivência, pessoas que viveram dias e horas com quem não podemos mais conviver, que tem passagens que não tivemos com nossos antecessores.
Às vezes se “surta” ao imaginar certas atividades por que nossos genitores passaram, e ai vem os amigos de nossos pais para relembrar passagens pitorescas, nostálgicas da vida deles que envolveram nossos genitores que não mais estão ai para contar.
É comum falarmos de contadores de historia, no tempo que a TV não competia como entretenimento, naquelas casas rurais, com aqueles serviços reservados em galpão, em paiol; trançar cebolas, alhos, escolher café, feijão e outras cereais ou legumes, “estalar fumos”, mas muitas vezes em compartimentos da casa, sala, ou cozinha, lá normalmente as cozinhas era os locais de estarem de passarem as horas, além de comer alimentos preparados com fogão a lenha, se tinha como verdadeiras lareiras com função de aquecer e cozer. E lá histórias e estórias eram ventiladas por horas e horas e lá construíam amizades.
Lá havia muita história de viagem, de tropeirismo praticado, pois ainda se viajava a cavalo, a burro, a carro de boi, estes animais era a força motriz e de locomoção.
Nos tropeirismo (transportes de gêneros alimentícios) onde se trazia pra cidade, para as estações de trens víveres (porco, galinha, boi) muitas vezes já abatido e pronto pra consumo, e se levava os cereais, açúcar, sal, as vezes tecidos e outras coisas de volta para distribuição de onde se vinham.
Nestes transportes, muitas coisas são hoje em dia consideradas grotescas, pois é inimaginável pensar em alguém “tangendo” peru, porco nos carreadores (arremedo de estrada) destas regiões rurais, verdadeiros sertões, tudo isto é muito perto no tempo, viveram nossos avós, nossos pais, mas muito ainda vivem.
Tanger gado por estas estradas era o que existia, e ainda se pode ver muito disto saindo do pantanal, e muitas outras regiões, mas também se pode ver muito disto há 5, 10, 15 ou mais km dos centros urbanos no interior de São Paulo, ou outras cidades.
A moda sertaneja, canta estas nostalgias, a história da moda se confunde com a existência do pai do caçulinha, com Tonico e Tinoco, com Cornélio Pires, se você tem 60 anos, estas pessoas viveram com nossos pais ou na sua época, e viveram conosco e cantaram e ainda cantam não uma nostalgia distante, mas uma nostalgia que ainda se opera no interior, mesmo que seja com menos frequência.
Tenho vivido um pouco disto tudo, tenho um pé na cidade e um pé na roça. Ao mesmo tempo em que participo de leilões de gado online, filmado, participo daquilo que os tropeiros às vezes faziam “biscate, rolo, escambo, brick, barganha, catira como é chamado no triangulo mineiro e em Goiás”.
Troca-se gado de leite por gado de corte, troca-se cavalo manso por potro bravio, tudo depende do interesse das partes, e depois tem que tanger os “bichos”, vem o transporte, hoje se usa muito o caminhão, mas grande parte dos pequenos negócios é pelas estradas, se não houver asfalto, o risco é pequeno e o costume é predominante.
Cavalhada, cavalgada, tanger gado, cavalos, são atividades muito comuns, mas alguns de nossos pais tinham isto como atividade principal, e dormir na estrada com arreio como travesseiro, com baixeiro como colchão sob uma capa gaúcha era muito comum. Hoje nas cavalgadas fazemos por lazer; mas para eles e para muitos era o ganha pão do dia a dia.
Quem teve um antecessor que viveu disto, que teve ou ainda tem um pé na roça, gosta de moda de viola raiz, gosta de participar e de ouvir história da lida e dos tanger de animais, do dormir sob as estrelas, das dificuldades da alimentação, da bondade dos moradores das trilhas por onde passavam.
Quem teve pai de lida da estrada, e quem tem a felicidade de ter amigos de nossos pais para reviver aquelas lidas. Sabe o que é sentir a nostalgia, sabe o que é se encantar, viajar no tempo, sentir saudades de nossos entes que se foram.
É muito difícil explicar com palavras estes sentimentos, quando se fala em tracendental, parece apenas uma palavra difícil de digerir, mas é realmente algo que está além da imaginação; principalmente e este alguém manteve o pé na roça e conhece a lida como lá é trabalhada.
Podemos ter opções moderna desta lida; mas o cavalo, o burro o tanger do gado, o amanhecer sobre as estrelas, o beber água da bica, viver isto não apenas como lazer, como hobby, mas como vida dá uma outra dimensão da vida rural.
Ouvir isto de amigos de nossos pais, que só tinham pé nesta lida de onde tiravam o sustento, ouvir os problemas e as soluções, a luta bruta com os animais, ouvir as vitórias, os frios, os descontrole alimentar passando fome e a bondade das pessoas por onde passaram na solução destes problemas continua sendo tão bom, como ouvir no salão de trançar cebola, alho, e outras atividades.
Recebi a visita de um amigo de meu pai, e precisei registrar esta emoção, poucos entenderão o sentimento deste tropeirismo entalado no coração, deste pé na roça o que significa tudo isto, deste costume roceiro de quem lá nasceu e cresceu. Posso viver aqui, mas tenho um respeito tão grande por quem vive lá e quando pra lá vou me torno um deles com uma satisfação, com uma gratidão por poder ter de lá vindo e por poder ter o privilégio de lá poder ainda conviver.
Andar a cavalo parece coisa de bobo, perigoso. Andar a cavalo é relembrar um costume antigo em extinção. Sei que existem cavalos com pedigree (registrado) para cavalgada, que tem a mesma função que o cavalo “criolo’ lá de nossas rocinhas e com certeza tem a mesma finalidade no uso de seus senhorios,
São atividades que irão para o futuro, mas a lida cada vez mais fica restringido ao interior das fazendas, ao sair no portão o asfalto está chegando e com ele vem o transporte motorizado e o tanger do gado e de outros animais fica só na nostalgia, a estrada e suas andanças e lembranças só no conto dos últimos tropeiros, amigos de nossos pais, um restinho de história que conseguiremos passar, mas aqueles que ouvirem não terá os mesmos sentimentos que temos; nunca saberão o que é este sentimento. 23.01.2013