Depressão para os não depressivos
O crescimento psicológico, com a segurança e objetividade que a experiência oportuna, depende ainda mais do enfrentamento diante dos problemas e dificuldades da vida do que de tempo.
Não poucos jovens enfrentam perdas e dificuldades familiares que apressam seu amadurecimento. Sentimos que muitos tão cedo tenham que amadurecer diante das mazelas da vida.
O amadurecimento é uma questão de sobrevivência mais do que um processo natural da vida, no caso. O que deixa também suas feridas nas lembranças.
Recorrerei a uma alegoria simples. Nascemos e vivemos um curto tempo em uma casa segura e protegida. Mal imaginamos as tempestades, furacões e outros perigos que rondam lá fora.
Enquanto crescemos a casa vai ficando pequena. Percebemos que não temos tudo o que precisamos ali dentro. A casa começa a ficar pequena para nossas curiosidades, sonhos e necessidades. O mundo lá fora, com seus perigos e ameaças, também se mostra como um mundo de possibilidades onde valeria a pena se arriscar.
Então muitos saem destas casas. Vão para muito longe ou ficam nas redondezas. Outros voltam assustados com a violência exterior, mas voltam ainda com a certeza de que é lá próximo ao perigo que se pode encontrar seu tesouro. Ficam frustrados, mas o medo ainda é mais poderoso que os sonhos.
O depressivo sente este medo em escala maior que a maioria das pessoas. O mundo tem mesmo este lado violento e psicopata, mas é preciso enfrenta-lo. O depressivo vê mais este lado sombrio do que as oportunidades, por isto é tão difícil para ele sentir que valha a pena (por isto seu medo é pouco compreendido pelos demais).
O depressivo não carece de uma filosofia para enfrentar a vida, a maioria não depressiva não possui uma e a encara com toda sua mediocridade ou talento. O depressivo carece de uma filosofia para encarar sua condição de saúde de mental.
Precisa entender que o que sente não é frescura e não depende uma positividade diante da vida, mas de entender que aquilo que obscurece sua vida pode e deve ser tratado.
Não importa que outros não entendam ou tenham seu julgamento: se aproprie de seu transtorno e entenda como ele toma as rédeas de sua vida e como retomar o controle sobre seus sentimentos e percepções.
Este retomar passa por decidir se tratar, buscar ajuda especializada e mudar hábitos e se afastar de pessoas que reforcem seu mal estar.
É preciso que o depressivo reconheça a distinção entre o quanto as coisas são realmente ruins e quanto sua condição depressiva impõe sobre sua percepção um julgamento que não teria naturalmente. Não deixamos de sentir mal estar, mas percebemos o quanto julgamos negativamente não por conta dos acontecimentos da vida, mas por uma outra coisa em nossa mente.
A falta do prazer que nos impulsiona ao enfrentamento da vida e de si mesmo deixa o depressivo sem as armas e armaduras para a batalha natural pela vida. Para quem sempre dispôs destas armas e armaduras é dificil entender como o depressivo se sente tão indefeso contra o mundo.
A luta contra a depressão começa por assumirmos este "algo errado" em nossa percepção, ainda que mal possamos no primeiro momento entender o que ele é e como opera.
Existe uma questão neuroquimica que inviesa contra sua vontade a percepção e existem os estigmas e maus hábitos que reforçam e agravam a condição. É uma batalha dificil, mas que 50% consiste no reconhecimento da própria condição como depressivo - sem culpar o mundo, as pessoas, a vida, a si próprio e etc.