A lua é dos namorados

Numa noite dessas passei por uma praça. Sem querer, olhei para seus bancos e suas árvores e a ilusão abanou-me, saudosa. Parei e fixei a vista. Não havia ninguém. Era uma praça deserta, pequena, espremida entre edifícios e ruas. Olhei no relógio: oito horas de uma noite de primavera enluarada, e a praça sozinha; só os bancos e as árvores; sem crianças e sem namorados.

Quantos casais, por ali, há muitos anos, não devem ter começado seus primeiros ensaios de namoro, escondidos pelo manto da cerca viva e revestido pela cumplicidade da lua, essa mesma lua que eu via agora, sozinha, fria, desaproveitada…Não sei porquê, mas recordei a música que a Elich Regina cantava, no advento das viagens à lua, exortando os namorados a curtir a luminosidade do satélite, pois a tecnologia iria tornar demasiadamente científico o mistério e prosaicamente devassado o romantismo.

E fiquei ali sem saber o porquê, daquele deserto: noite de lua, temperatura amena, uma pracinha esperta e nenhum casal. Eu tenho um amigo que afirma que, com a chegada da era dos motéis, acabaram-se os namorados nas praças e nos “drive-in”. De certa forma ele tem razão. O pessoal hoje é mais “executivo” e menos romântico. Minha geração curtiu tudo o que era bom ao som do “Only You”, “Diana” e “Banho de lua”.

Hoje é diferente...

A juventude é mais prática, existencialista, pragmática até. Mas acho que curte menos as coisas... A “música martelo” que escutam não evoca nada, apenas dá ritmo às contrações, seja na mastigação ou na cama. Voltando à praça, recordo que minha geração tinha um cult pelo primeiro encontro, o primeiro beijo, pelos bilhetinhos de amor.

Hoje é diferente...

Naquele tempo, quando não se beijasse uma garota no primeiro encontro, não se ia mais. Hoje, se não há “transa” no primeiro encontro, a relação não dá pé.. Exageros à parte, parece que as coisas hoje são mais aceleradas, etapas queimadas, sei lá… O caso é que a praça estava deserta. Olhei para cima e vi um resto de lua desaparecendo. Gozado, até há pouco ela era bem visível, e agora é só um clarão numa nesga de céu. Ah, são os danados dos edifícios… Já não se vê lua como antigamente… E cheguei a outra conclusão: namorar numa praça, hoje, é assalto e incomodação na certa.

É pena, não acham? A gente ter que condicionar gostos e limites por causa da violência e da marginalidade, desaproveitando uma irrepetível noite de lua, o romântico e furtivo aconchego de um banco de praça entrincheirado atrás de um arbusto... É pena perder isto. Ainda bem que minha geração ouviu o conselho de Elich, e aproveitou os últimos luares.

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 01/11/2005
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