DE ANASTÁCIA A MAJU COUTINHO

DE ANASTÁCIA A MAJU COUTINHO

Autor: HERIBALDO DE ASSIS *

A figura icônica da escrava Anastácia é representada por uma mulher negra com uma máscara de ferro no rosto (máscara de flandres) – um dos vários castigos que os senhores de engenhos aplicavam aos seus escravos durante o período colonial. Essa efígie da escrava Anastácia é uma histórica metáfora da adversa situação da mulher negra no Brasil – uma mulher cuja voz sempre foi sufocada pelo racismo, pelo patriarcado e pelo machismo (como se uma máscara de ferro invisível ainda sufocasse essas mulheres negras que, mesmo depois da Abolição da Escravatura, ainda continuam sendo oprimidas pelo simples fato de serem negras). Além de Anastácia outras mártires negras também permeiam as sangrentas páginas da História do Brasil – mulheres negras como Aqualtune, Luiza Mahin e Dandara – que preferiu se jogar do alto de uma pedreira para encontrar a morte do que ser escravizada e torturada pelos seus inimigos que haviam invadido o Quilombo dos Palmares. Mais recentemente tivemos Marielle Franco – uma mulher negra que foi covardemente assassinada por defender o pobre povo da favela – a mesma favela que, após a Abolição da Escravatura, foi o único refúgio dos negros recém-libertos que não tinham onde morar. Da negra escravizada, da empregada doméstica (quase sempre negra) até a jornalista Maju Coutinho foram necessários séculos de luta contra o racismo e contra as nefastas adversidades que ainda obstaculizam a árdua trajetória das mulheres negras no Brasil. E ao integrar a bancada do Jornal Nacional (um dos mais importantes telejornais do Brasil) a jornalista Maju Coutinho (mulher e negra) fez com que milhares de mulheres negras no Brasil se sentissem representadas... Ao mesmo tempo a ascensão de Maju Coutinho á bancada do Jornal Nacional vai inspirar milhares de meninas negras – meninas cujas mães tiverem que enfrentar os obstáculos do racismo, da discriminação e obtiveram apenas subempregos porque nem sequer tiveram oportunidade de adentrarem uma Universidade e obterem um Curso Superior. A ascensão de Maju Coutinho á bancada do Jornal Nacional também é uma emocionante vitória contra o racismo e contra os racistas (esses monstros disfarçados de seres humanos)! Os mesmos racistas que são contra as cotas raciais porque querem que negros continuem sendo engraxates e que negras continuem sendo empregadas domésticas... E que Maju Coutinho não continue sendo uma bela e raríssima exceção – que mais mulheres negras obtenham cargos importantes neste país racista e machista que parece que ainda não saiu do século XIX – sendo que já estamos em pleno século XXI! A competência da jornalista Maju Coutinho foi coroada com a sua merecida promoção à bancada do Jornal Nacional – algo que emocionou-me e decerto emocionou milhares de pessoas no Brasil que sentiram-se racialmente representados por Maju Coutinho. E esse dia : 16/02/2019 é um momento histórico para a luta contra o nefasto racismo no Brasil – o mesmo racismo que queria que Maju Coutinho fosse uma empregada doméstica e não uma jornalista .Muito ainda precisa ser feito neste país para que mais mulheres negras se tornem jornalistas, médicas, advogadas, juízas, engenheiras... Anastácia, Aqualtune, Luiza Mahin, Dandara, Marielle Franco, Maju Coutinho – mulheres negras que lutaram contra o nefasto preconceito, mulheres negras que lutaram contra a censura das máscaras de ferro, mulheres negras que não queriam ficar confinadas às senzalas erigidas pelos senhores de engenho, pelos donos do poder que querem que os negros lustrem subservientemente suas caríssimas botas escravocratas. E, mesmo tendo sido sufocadas por máscaras de ferro e por balas covardes, a mulher negra no Brasil não vai se calar diante do racismo, do preconceito, do machismo e da violência. A vitória de Maju Coutinho também é uma vitória para o povo negro – esse povo negro cujo suor ajudou a erguer um país apenas para os brancos e abastados. E por ter ajudado a erguer esse injusto país os negros apenas receberam chibatadas, ofensas e uma caixa de engraxate para lustrar as luxuosas botas dos brancos. Anastácia vive ! Aqualtune vive ! Luiza Mahin vive ! Dandara vive ! Mariele Franco vive ! Vivem na cor da pele de Maju Coutinho – uma pele negra que brilha, um sorriso que brilha contra as maléficas trevas do racismo !

*Escritor, filósofo, poeta, compositor, redator-publicitário, roteirista e Licenciado em Letras.E-mail: herisbahia@hotmail.com

Heribaldo de Assis
Enviado por Heribaldo de Assis em 16/02/2019
Reeditado em 16/02/2019
Código do texto: T6576804
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