Resumo do artigo “Como é ser um morcego?” de Thomas Nagel
O artigo, “What Is It Like to Be a Bat?” escrito por Thomas Nagel foi originalmente publicado em The Philosophical Review LXXXIII, 4 (Outubro de 1974): pp. 435-50. A tradução para português realizada por Luís M. S. Augusto que foi publicada em 22 de setembro de 2004 no blog “Crítica na rede” e que deu origem a este resumo se encontra neste link.
Há dificuldades ao tratar uma experiência mental consciente como um fenômeno físico. O que torna o problema tão difícil de ser resolvido é o fato de assumirmos a existência da consciência. “Sem a consciência, o problema da mente-corpo seria muito menos interessante; com a consciência, parece impossível de resolver” (NAGEL, 2004). Apesar de não poder ser comprovada, a experiência consciente parece existir em mamíferos e pode, apesar de improvavelmente, segundo o autor, influenciar em seu comportamento.
Dizer que um fenômeno mental (a experiência consciente) é um fenômeno físico, implica que podemos pensar que existe algo que é subjetivo, ou seja, “essencialmente ligado a um único ponto de vista” (NAGEL, 2004), para o organismo que tem a experiência, ou ainda que “há algo que é como ser esse organismo” (NAGEL, 2004). E, ao lidar com a subjetividade, os métodos mais convenientes que temos utilizado para conhecer o mundo de maneira objetiva, ou seja, “menos dependente de um ponto de vista humano” (NAGEL, 2004), parecem inapropriados. Afinal, como oferecer uma descrição física de uma experiência subjetiva? Métodos reducionistas nem sequer tentam explicar os fenômenos mentais conscientes e muitas vezes o termo consciência é até excluído das “análises redutoras do mental mais conhecidas” (NAGEL, 2004), porque com sua inclusão nada parece ter lógica.
Para entendermos a importância das características subjetivas, o autor usa o exemplo de uma situação hipotética onde nos colocamos no lugar de um morcego: mesmo que pensemos com toda a nossa competência imaginativa que temos asas, hábitos noturnos e que emitimos sons para nos localizarmos, estaríamos sendo um morcego na nossa perspectiva, inseridos na nossa subjetividade e deste modo, estaríamos vendo como é para nós ser um morcego e não como seria “para um morcego ser um morcego” (NAGEL, 2004). E mesmo que eu pudesse me transformar em morcego, assim que me transformasse eu não seria mais eu, inserido que estaria na inexorável subjetividade do morcego e impossibilitado de pensar como eu, impossibilitado de pensar diferente dele. É tão impossível imaginar como um morcego pensa como é ser como eu, quanto eu pensar como é ser como ele. Parecemos reconhecer que há fatos que não podem ser descritos pela linguagem humana, mas, por conta da limitação de nossa natureza não somos capazes de compreendê-los.
Desta forma, para continuarmos a utilizar os métodos fisicistas que conhecemos, parece-nos possível uma única alternativa: a de nos livrarmos das características subjetivas da experiência, em busca das “mais objetivas”. Embora sejam necessários os nossos sentidos para descrevermos experiências e, desta forma, elas sempre assumirem um ponto de vista inicial inevitável (que é o do nossa própria estrutura perceptiva), nós muitas vezes os usamos para descrever coisas que estão além dos sentidos humanos e que, por isso, assumem um caráter objetivo, então é possível prosseguirmos desta maneira.
Para separar a objetividade de uma experiência, podemos supor por exemplo, que existam “tipos gerais de experiência” (NAGEL, 2004), já que, como os morcegos, sentiríamos fome, dor, medo e desejo sexual. Mas mesmo essas experiências que parecem possuir um caráter mais geral e apontar para uma maior objetividade, possuem um caráter subjetivo insondável e mesmo que utilizássemos todas as regras gerais possíveis, não conseguiríamos descrever o que poderia ser um “tipo geral de experiência” (NAGEL, 2004) para um ser de outro planeta.
Fenômenos físicos são objetivos, na medida em que podem ser estudados e compreendidos por seres diferentes de nós. Mas, mesmo ao tentar tornar uma experiência como o som, algo objetivo, dizendo que o som não passa de vibrações no ar, não abandonamos um ponto de vista, pois assumimos o ponto de vista de que o som não passa de vibrações no ar e dessa forma não abandonamos a dependência dessa experiência, de um ponto de vista e não avançamos em direção à uma maior objetividade. Mesmo o que estamos fazendo agora parece não ajudar, porque a experiência pressupõe um caráter subjetivo e se distanciar dessa característica seria como se distanciar da própria definição do conceito que estamos a tratar.
Nada disso, porém, quer dizer que o fisicismo esteja errado, só que não conseguimos encontrar, para o caso de entender a experiência objetiva, uma situação onde ele se encaixa. As teorias atuais não conseguem unir os conceitos “físico” e “mental” sem o surgimento da subjetividade. Portanto, antes de responder a questão “fará sentido perguntar como são realmente as minhas experiências em comparação a como elas me parecem?” (NAGEL, 2004) e sem resolver o problema da subjetividade e da objetividade, não podemos imaginar como estes dois conceitos podem ser unidos.
Agradecimentos
À João Marcos Marques Monteiro, pela sua competência de reflexão e por gastar seu precioso tempo comigo em devaneios que deram origem à clareza destas palavras.
Referências
NAGEL, T. Como é ser um morcego. 2004. Tradução de Luís M. S. Augusto. Disponível em: Como é ser um morcego? Acessado em: 28 de janeiro de 2019.
O artigo, “What Is It Like to Be a Bat?” escrito por Thomas Nagel foi originalmente publicado em The Philosophical Review LXXXIII, 4 (Outubro de 1974): pp. 435-50. A tradução para português realizada por Luís M. S. Augusto que foi publicada em 22 de setembro de 2004 no blog “Crítica na rede” e que deu origem a este resumo se encontra neste link.
Há dificuldades ao tratar uma experiência mental consciente como um fenômeno físico. O que torna o problema tão difícil de ser resolvido é o fato de assumirmos a existência da consciência. “Sem a consciência, o problema da mente-corpo seria muito menos interessante; com a consciência, parece impossível de resolver” (NAGEL, 2004). Apesar de não poder ser comprovada, a experiência consciente parece existir em mamíferos e pode, apesar de improvavelmente, segundo o autor, influenciar em seu comportamento.
Dizer que um fenômeno mental (a experiência consciente) é um fenômeno físico, implica que podemos pensar que existe algo que é subjetivo, ou seja, “essencialmente ligado a um único ponto de vista” (NAGEL, 2004), para o organismo que tem a experiência, ou ainda que “há algo que é como ser esse organismo” (NAGEL, 2004). E, ao lidar com a subjetividade, os métodos mais convenientes que temos utilizado para conhecer o mundo de maneira objetiva, ou seja, “menos dependente de um ponto de vista humano” (NAGEL, 2004), parecem inapropriados. Afinal, como oferecer uma descrição física de uma experiência subjetiva? Métodos reducionistas nem sequer tentam explicar os fenômenos mentais conscientes e muitas vezes o termo consciência é até excluído das “análises redutoras do mental mais conhecidas” (NAGEL, 2004), porque com sua inclusão nada parece ter lógica.
Para entendermos a importância das características subjetivas, o autor usa o exemplo de uma situação hipotética onde nos colocamos no lugar de um morcego: mesmo que pensemos com toda a nossa competência imaginativa que temos asas, hábitos noturnos e que emitimos sons para nos localizarmos, estaríamos sendo um morcego na nossa perspectiva, inseridos na nossa subjetividade e deste modo, estaríamos vendo como é para nós ser um morcego e não como seria “para um morcego ser um morcego” (NAGEL, 2004). E mesmo que eu pudesse me transformar em morcego, assim que me transformasse eu não seria mais eu, inserido que estaria na inexorável subjetividade do morcego e impossibilitado de pensar como eu, impossibilitado de pensar diferente dele. É tão impossível imaginar como um morcego pensa como é ser como eu, quanto eu pensar como é ser como ele. Parecemos reconhecer que há fatos que não podem ser descritos pela linguagem humana, mas, por conta da limitação de nossa natureza não somos capazes de compreendê-los.
Desta forma, para continuarmos a utilizar os métodos fisicistas que conhecemos, parece-nos possível uma única alternativa: a de nos livrarmos das características subjetivas da experiência, em busca das “mais objetivas”. Embora sejam necessários os nossos sentidos para descrevermos experiências e, desta forma, elas sempre assumirem um ponto de vista inicial inevitável (que é o do nossa própria estrutura perceptiva), nós muitas vezes os usamos para descrever coisas que estão além dos sentidos humanos e que, por isso, assumem um caráter objetivo, então é possível prosseguirmos desta maneira.
Para separar a objetividade de uma experiência, podemos supor por exemplo, que existam “tipos gerais de experiência” (NAGEL, 2004), já que, como os morcegos, sentiríamos fome, dor, medo e desejo sexual. Mas mesmo essas experiências que parecem possuir um caráter mais geral e apontar para uma maior objetividade, possuem um caráter subjetivo insondável e mesmo que utilizássemos todas as regras gerais possíveis, não conseguiríamos descrever o que poderia ser um “tipo geral de experiência” (NAGEL, 2004) para um ser de outro planeta.
Fenômenos físicos são objetivos, na medida em que podem ser estudados e compreendidos por seres diferentes de nós. Mas, mesmo ao tentar tornar uma experiência como o som, algo objetivo, dizendo que o som não passa de vibrações no ar, não abandonamos um ponto de vista, pois assumimos o ponto de vista de que o som não passa de vibrações no ar e dessa forma não abandonamos a dependência dessa experiência, de um ponto de vista e não avançamos em direção à uma maior objetividade. Mesmo o que estamos fazendo agora parece não ajudar, porque a experiência pressupõe um caráter subjetivo e se distanciar dessa característica seria como se distanciar da própria definição do conceito que estamos a tratar.
Nada disso, porém, quer dizer que o fisicismo esteja errado, só que não conseguimos encontrar, para o caso de entender a experiência objetiva, uma situação onde ele se encaixa. As teorias atuais não conseguem unir os conceitos “físico” e “mental” sem o surgimento da subjetividade. Portanto, antes de responder a questão “fará sentido perguntar como são realmente as minhas experiências em comparação a como elas me parecem?” (NAGEL, 2004) e sem resolver o problema da subjetividade e da objetividade, não podemos imaginar como estes dois conceitos podem ser unidos.
Agradecimentos
À João Marcos Marques Monteiro, pela sua competência de reflexão e por gastar seu precioso tempo comigo em devaneios que deram origem à clareza destas palavras.
Referências
NAGEL, T. Como é ser um morcego. 2004. Tradução de Luís M. S. Augusto. Disponível em: Como é ser um morcego? Acessado em: 28 de janeiro de 2019.