O verdadeiro amor – Segunda Parte
Por Rodrigo Capella*
Coloquei o telefone no gancho e disquei os oito números de Alex.
- Amigo, entreguei um bilhete pra um homem, ele me ligou, vamos sair daqui a pouco.
- Ele é bonito? Como ele é?
- Moreno, olhos azuis, mãos fortes e tem bom hálito.
- Ótimo, o bom hálito é muito importante. Ele tem mão firmes, mãos de super-homem? E as unhas, são bem cuidadas?
- As mãos parecem um tanque de guerra, são muito fortes. Já as unhas, eu não reparei.
- É que eu adoro mãos.
- Sim, que bom, mas o que eu faço?
- Beija ele, uai. O que você quer mais?
- Eu não sei, não sei se ele é o homem perfeito pra mim. Eu queria fazer um teste.
- Teste. Ótima idéia. Eu fiz isso uma vez. Foi esplendoroso!
- E deu certo?
- Sim, fiz com um entregador. Cada vez que ele entregava a pizza, eu fazia uma pergunta diferente. E bingo!
- Quantas perguntas são?
- Apenas duas, minha querida, duas perguntinhas e você vai chegar a uma decisão.
- E qual é a primeira?
- Vamos lá. É o seguinte: você vai simular um desmaio e vai pedir a ajuda dele. Se ele fizer respiração boca a boca é porque você está diante de um safado, agora se ele chamar a ambulância é porque você escolheu o homem certo. Faz esse teste hoje a noite e depois me conta. Agora vou dormir. Beijos e boa sorte, minha linda.
- Obrigada, Alex, boa noite.
Fomos jantar, eu e o homem das batatas. O restaurante era muito simples, mas a comida estava bem temperada. Conversamos sobre futebol, vôlei e a destruição das torres gêmeas. A conversa fluía agradavelmente e já estava na hora de seguir os conselhos de meu amigo. Minutos depois, eu contaria tudo a ele. Disquei os oito números de Alex e:
- Amigo, você está acordado?
- Sim, quer dizer, mais ou menos. Meus olhos estavam fechados, na verdade
piscando. Eu estava contando as estrelinhas coladas no teto de meu quarto. Uma mais linda que a outra.
- Acabei de voltar do jantar e queria te contar como foram as coisas.
- Conte, estou curioso. Vamos! Ele te beijou?
- Tentei desmaiar, mas não consegui, coloquei tudo a perder, que droga. Que droga, o que eu faço?
- Calma linda, calma. Vocês se beijaram?
- Ele me deu um selinho em frente ao meu prédio, nossa, que selinho, ele beija muito bem. Parece um pássaro bebendo água.
- Ótimo, isso é muito bom, eu adoro pássaros. E rolou alguma coisa mais?
- Mais nada, o que eu faço agora?
- Vai dormir, descansa e marca um outro encontro com esse homem. Aproveite a vida.
- Mas, e o teste? Como fica?
- Você quer continuar?
- Claro, lógico que sim. Qual é a última pergunta?
- Dê um beijo na boca dele, agarre o homem por trás e pergunte: ”você quer casar comigo?”. Preste atenção na reação dele e, depois, me conte tudo, ok? Tim tim por tim tim.
- Claro, nós combinamos de ir ao parque amanhã pela tarde. Vou fazer isso e depois te conto os detalhes.
Fui dormir e acordei com a campainha tocando. Era o homem das batatas segurando um vaso de flores vermelhas e brancas. Agradeci e coloquei no centro da mesa de jantar. Tomei um banho rápido e fomos caminhando até o parque, onde tomamos um delicioso sorvete e alimentamos uns pássaros, espalhados pela grama. Segui as orientações de meu amigo Alex e tentei fazer o que ele pediu, mas novamente coloquei tudo a perder. Disquei os oito números de Alex e:
- Amigo, não consegui de novo. Foi um horror. Eu não sei o que fazer, estou perdida, triste, sem rumo.
- Vocês vão sair outra vez?
- Sim, vamos ao cinema hoje à noite. Por que? Você tem um outro teste?
- Não, não tenho.
- E o que eu faço?
- Curta a vida, beije o seu homem, seja feliz.
- Alex, mas e o teste?
- Minha linda, preste atenção: esse teste nunca existiu.
- Como assim?
- Eu inventei tudo pra testar você, meu amor. Na última vez que nós nos vimos, há cerca de um mês lá na floricultura, meu coração disparou, senti algo estranho. Pela primeira vez, depois de quinze anos e dois meses, eu estava gostando de uma mulher.
(*) Rodrigo Capella é escritor e poeta. Autor de vários livros, entre eles “Enigmas e Passaportes” e “Poesia não vende”. Informações: www.rodrigocapella.com.br