Pecados Capitais

Há algum tempo li uma reportagem, na qual um empresário americano dizia que a razão do seu sucesso no mundo dos negócios se devia, em parte, ao fato dele tirar proveito dos 7 pecados capitais: avareza, inveja, gula, preguiça, luxúria, ira e vaidade. Confesso que durante muito fiquei impressionada com os argumentos e a forma como aquele homem conseguiu reverter a seu favor, os sentimentos negativos que compõem os pecados capitais.

O empresário parecia muito seguro de que parte do seu sucesso era proveniente dos referidos pecados, o que me deixava perplexa. Afinal, não conseguia entender como é que alguém poderia ter sucesso cometendo faltas, transgredindo preceitos religiosos; ofendendo ao Todo Poderoso.

Durante muito tempo o assunto dominou meu pensamento. Eu procurava uma forma de também incorporar os 7 pecados capitais à minha vida de maneira saudável e bem sucedida. Eu acreditava que se alguém pode fazê-lo, eu também poderia. O desafio era estimulante, mas difícil de ser colocado em prática; incorporado ao meu estilo de vida.

A oportunidade tão esperada chegou quando eu menos esperava: no momento em que passei a exercer atividades docentes com crianças das séries iniciais com idade variando entre 7 e 11 anos.

Minha turma era formada por aproximadamente 36 crianças sem qualquer estímulo para estudar e que pouco sabia ler e escrever. O choque foi grande apesar de, como jornalista, ter me deparado inúmeras vezes com matérias nas quais se destacavam as estatísticas com os baixos índices de aproveitamento dos nossos estudantes. Uma coisa, porém, é ter contato com a situação real, ao vivo e em cores. A outra é lidar com números frios. Pura estatística.

Eu tinha agora dois desafios: estimular aquelas crianças ao aprendizado e usar os 7 pecados capitais a meu favor na empreitada. Procurei, em primeiro lugar, atiçar a vaidade das crianças elogiando-as para aumentar sua autoestima. Assim, elogiava a farda limpa, o caderno bem cuidado, a caligrafia que tentava imitar a minha, os cabelos penteados, enfim, tudo o que eles faziam era motivo para elogio. A tática deu resultado porque todos queriam ser elogiados por algum motivo.

Passei a ler textos variados para eles se habituarem à prática da leitura. Foi então criado o “Clube da Leitura” – um projeto que consistia num círculo de leitura e o aluno que melhor se destacasse, receberia um brinde e teria sua fotografia exposta na sala de aula. Desse modo consegui envolver mais um dos pecados capitais à prática iniciada: a inveja. Todos queriam ser destaque para receber o prêmio e para ver os colegas observando sua foto exposta na sala.

O melhor disso tudo é que havia uma competição em andamento, mas de maneira saudável e produtiva: as crianças estavam felizes porque, na ótica delas, tudo não passava de uma grande brincadeira. O fato é que estavam aprendendo.

O “Clube da Leitura” rendeu excelentes frutos: conseguimos produzir um livro de poesias e um livro com a reescrita de histórias. Além disso, ainda me vali de mais um dos pecados capitais, natural entre as crianças: a gula. Aproveitando que eles falavam muito em comida, acabamos produzindo também um livro com receitas culinárias, onde cada um destacou seu prato preferido. Os 7 pecados capitais não são assim tão pecaminosos como parecem e ao contrário do que dizem, podem ser perdoados e usados para boas causas.