Ventos e tempestades
Na relação de causa-e-efeito dos fenômenos sociais, a sabedoria popular cunhou a expressão “quem semeia ventos colhe tempestades”, para alertar que toda a ação humana traz consigo uma conseqüência. Se a ação for boa, a reação é positiva; se má, negativa. Uma está ligada umbilicalmente à outra. Se eu trato mal uma pessoa, ela, em geral vai retribuir-me esse mal. Cria-se o chamado “círculo vicioso”, que irá, passo-a-passo, degenerar nosso relacionamento. Recentemente, vimos o ataque à Parati da RBS, ocorrido no interior do estado. com danos a objetos e por incêndio do veículo. O fato é lamentável.
Nosso modelo social execra a violência, condena as ações mais exacerbadas, não admitindo esse tipo de atitudes. Uma sociedade civilizada jamais aprova – pelo menos em tese – o uso da força bruta, para esse ou aquele propósito. No entanto, em todo processo social, há que se ver antecedentes e conseqüentes, efeitos e causas, autores e vítimas. Quem foram os autores da agressão ao equipamento do órgão de comunicação?
Teoricamente, teriam sido pessoas pertencentes a movimentos populares em reivindicação, como “pequenos agricultores”, “agricultores sem terra” e “famílias atingidas pelas barragens”. Os pequenos agricultores postulam meios para sobreviver. Os “sem terra” clamam, há décadas, por um espaço, num país de latifúndios (em geral de produtividade duvidosa) e famílias atingidas pelas barragens, que protestam pela terra que lhes foi tomada por barragens de utilidade contestada. Esses movimentos não começaram ontem, mas fazem parte de um processo socioeconômico que se arrasta há várias décadas, coberto de projetos e promessas oficiais, mas despido de uma eficácia, oriunda de um esforço de quem não quer resolver o problema.
O fato é que, entra governo e sai governo e as coisas ficam na mesma. Nas fráguas dessa crise, surgem segmentos da mídia – entre os quais o órgão que teve o veículo destruído – que assumem posições elitistas, a favor do latifúndio e dos poderosos proprietários, ignorando o drama de milhões de conterrâneos, cidadãos excluídos e marginalizados. Tais órgão, não apenas ignoram o calvário daqueles numerosos grupos sociais, mas não cessam de criminalizar suas ações, tachando-os de baderneiros, marginais, quadrilheiros e coisas parecidas. Isto é geração de violência. Ora, para quem vive em coberturas, dirige carros importados e trabalha no ar condicionado, esse drama não tem repercussão além de frias e omissas manchetes.
Mas, para quem está na batalha, no sufoco há mais de dez anos, coberto de mágoas e descrente das políticas sociais e agrárias do país, a indignação ferve, levando as pessoas a atos extremos. Quando a mídia, de quem se espera uma posição neutra e conciliadora, toma partido, estabelece-se o confronto. Quem semeia ventos, colhe tempestades... É a ordem, natural das coisas. Infelizmente.