O Desconhecido.

    Seu nascimento deu-se da maneira mais comum de todas, como todos os outros, sem nenhuma exceção. Seu choro completamente desconhecido não fez nenhum alarde, seus pais não eram conhecidos, e nem a sua família tinha influência na sociedade da época, muito pelo contrário. A sua família era um vulto no escuro, sem tradição, sem membros importantes entre os mais importantes da cidade. Seu nascimento foi completamente às cegas, não houve outros olhares para admirar-lhe no primeiro momento neste mundo. Apenas o olhar da parteira, um senhora já de idade avançada que havia feito a maioria dos partos daquele local. Seu corpo sujo distorcido, sairá em uma manhã de muito calor, e era ainda as primeiras horas do dia, seu choro fraco não fora capaz de acordar ninguém, a parteira o limpou, fez todo o procedimento e o colocou ao lado de sua mãe, olhinhos miúdos, quase fechados, o minúsculo Arthur vinha ao mundo em uma manhã de domingo, ao sentir o cheiro da mãe a criança parou de chorar no mesmo instante. A mãe tocou-lhe na face macia, ainda enrugada, lágrimas no olhos. Mãe e filho por um breve momento pareceram se desconectarem do mundo real, pareciam em um universo particular somente deles.

     A ligação entre mãe e filho duraria pouco, a recém chegada criança não teve tempo de conhecer sua mãe, foi apenas o afago inicial, logo após o parto a jovem senhora falecera devido a forte hemorragia, não havia o que fazer para salvar-lhe a vida. O pai da criança era um desconhecido de todos, embora alguns acreditassem que seria um importante comerciante da cidade, a mãe da criança nunca revelou a ninguém sobre o pai, havia apenas uma pessoa que possivelmente poderia ter a verdadeira resposta a essa incógnita da paternidade do jovem Arthur, o padre Amaro, um velho simpático que era o responsável pela catedral da cidade. Padre Amaro foi um dos últimos a conversar com a mãe do Arthur antes dela morrer. Exatamente dois dias antes dela falecer, na ocasião ele a atendeu em seu confessionário na catedral, ela ficou cerca de quase uma hora no confessionário, certamente que, o padre Amaro seja o único a conhecer os segredos de Ana Luci, embora este segredo continuará a todos um grande mistério, visto que, padres não podem revelar segredos de confissão, em nenhuma hipótese. Esse mistério perdurará, talvez a própria criança quando atingir a fase adulta venha a descobrir quem é o seu verdadeiro pai.

     Eu sou apenas um observador, uma águia a voar e a colher informações do mundo dos humanos. Eu sou essa ave misteriosa que acompanha com grande interesse e curiosidade a respeito dos homens e de seus sentimentos tão confusos e tão complexos. Não estou fadado ao tempo como a jovem criança mencionada, Arthur, criança essa que cresceu forte, embora não parecesse ao nascer, mas a criança cresceu nas ruas de uma cidade qualquer, ajudado por um e por outro, as vezes expulso daqui e dali, sem a oportunidade de poder ter uma vida aos padrões humanos considerada digna, o jovem Arthur aprenderá nas ruas a arte da sobrevivência, com muito sofrimento, com muito esforço, ele tornou-se um adulto com inúmeras habilidades. Morador das matas, sobrevivente do mundo recém destruído, esse jovem que contemplei o nascimento, nunca se importou saber quem era seu verdadeiro pai, nunca se interessou saber se havia familiares vivos, nem na história da sua própria mãe ele se interessou. Aos seus olhos a sua família eram as ruas onde fora criado, mas havia nele algo de diferente, que o destacava dos demais seres humanos. Arthur tinha um cérebro poderoso e uma capacidade de raciocínio espetacular. Ele aprendeu a ler sem a ajuda de ninguém, conhecia sobre os mais diversos assuntos. Matemática, ciências, biologia, astronomia, filosofia, literatura, e tantas outras cousas mais. Tudo graças aos milhares de livros deixados nas latas de lixo.

    Arthur era uma águia terrestre, ele tinha a capacidade de conseguir o que bem intentasse. Mas havia uma pessoa na cidade que observava o desenvolvimento do jovem desde o seu nascimento, que sem deixá-lo perceber, indiretamente contribuiu para o crescimento e desenvolvimento do jovem Arthur. O padre Amaro sempre cuidou indiretamente daquela alma desprovida. Ele sempre providenciou roupas, alimentos, pessoas que levassem as coisas que lhe era necessário, os livros nas latas de lixo. Padre Amaro temia trazer a criança para sua casa e ser acusado pela sua comunidade, mas de uma forma indireta providenciou que o jovem crescesse sob seu olhar. Padre Amaro nunca trocou uma palavra com o rapaz, mas estava sempre presente, sempre por perto. Eu não sei por qual motivo, o jovem também nunca se afastou do padre, parecia haver algo que os ligava. Foram poucas as vezes que Arthur assistiu as missas de domingo do padre Amaro. Ele sentava-se no último banco, não trocava uma palavra com ninguém, seu olhar curioso fitava o olhar atento do padre. Quando a missa terminava ele saia junto das demais pessoas, escondia-se por detrás do muro Catedral, padre Amaro sempre deixava um pouco de comida para ele naquele local.

     Houve um dia que o padre Amaro, tão querido de todos, adoeceu, fiéis da igreja foram designados pelo Bispo para ajudar ao padre enquanto estivesse enfermo e acamado, mas o médico havia dito que era questão de dias para que o padre viesse a falecer, pois o câncer havia tomado todo o seu corpo e não havia mais o que fazer. Quando Arthur soube da doença do padre, algo dentro dele, que ele mesmo não sabia explicar, o incomodava a ir ter com o padre antes que ele falecesse. Arthur tentou resistir, escondeu-se, mas não suportando de angústias foi visitar o seu amigo, que sempre indiretamente cuidou dele. As pessoas que cuidavam do padre avisou-lhe que o jovem de rua queria vê-lo. Padre Amaro abriu um tímido sorriso, pediu para que trouxesse o jovem, pediu também para que os deixassem a sós. O padre ficou cerca de meia hora com o jovem. Com os olhos cheios de lágrimas Arthur deixou o quarto onde o padre estava, ninguém compreendeu nada, também o padre não revelou nada a ninguém. Um dia depois desse episódio o padre veio a falecer, ele foi enterrado no cemitério da cidade, seu cortejo fúnebre foi seguido por uma multidão de pessoas, a cidade parou naquele dia. Arthur estava entre a multidão, olhos molhados pelas lágrimas.

     Tempos depois, ninguém mais viu o jovem Arthur pelas ruas da cidade, o que se dizia era que o jovem Arthur era o filho do padre Amaro com a jovem Ana luci, mas a verdade está enterrada com o padre Amaro, passou-se dez anos desses acontecimentos, dez anos que o jovem havia desaparecido. Certo dia, o bispo havia designado um novo padre para a catedral, avisou que o apresentaria no domingo na missa matutina. A igreja superlotou para conhecer o novo sacerdote. O bispo iniciou a missa, quando ele pediu para que o novo padre adentrasse, qual não foi a grande surpresa de todos, o padre era exatamente o jovem Arthur, que a anos havia desaparecido. Sua verve, seu carisma, tão rapidamente conquistou a todos. Seu semblante tão parecido com o do padre Amaro causava admiração, ninguém ousava falar, mas todos na cidade juravam que ele era o filho do padre Amaro. A verdade ninguém sabe, somente o próprio padre Arthur, talvez essa ave bisbilhoteira saiba a verdade, mas porque revelar tão grande segredo. É preferível deixar tudo como está, o tempo trará as respostas.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 25/05/2017
Código do texto: T6008671
Classificação de conteúdo: seguro