POÉTICA IRONIA

A maioria das mulheres acha que a Poesia é mulher imbatível e, no seu mais possessivo intimismo, sob este foco a odeiam. Chegam ao cúmulo de competir com o Poético, ironicamente num universo que não é o seu: o mundo da realidade fática. Têm um ciúme doido de seus meneios, graça e perene encantamento, porque menina/mulher permanente: aquela que pouco sofre a ação do tempo, não engorda nem emagrece, e não se criam as rugas com tanta rapidez. Esta é mais pura verdade! Tão falsa quanto a musa que a Poesia endeusa em versos pejados de sonhos, farsas e fantasias. Que as mulheres não te ouçam falar muito alto, ao fazeres coro ao meu pensamento favorável e amoroso em relação à Poesia. Porque também não é menos factual que o poeta dificilmente dedica o seu poema à fêmea que ele tem, e sim àquela que ele não tem, mas imagina que a possui, através dos anseios do apossamento. No seu íntimo sazonado de tatos corporais, num dia desses tê-la-á na horizontal, desejoso de mitos e palavras plenas de doçura. Se isto tudo não se tornar verdade factual firmada, restará somente a Poesia entranhada no tímido poema circunstancial. A deusa dos versos personificada não em corpo, somente silhueta e imagética, porém viva de palavra e circunstância. Resta, somente, livrá-la do cativeiro anônimo em que ela se encontra, trazendo-a ao patamar público identicamente desejoso de beleza e vida...

– Do livro O PAVIO DA PALAVRA, 2015/17.

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