O REVISOR DE TEXTO: OSSOS DO OFÍCIO

A vida do revisor de texto não é nada fácil, principalmente se esse revisor é perfeccionista. Sofre além da conta! Digo isso por experiência própria, costumo me ater aos mínimos detalhes, a pontos e acentos, sempre exigente comigo e com o uso da língua.

Uma parte dolorosa do nosso trabalho de revisor é a ideia que as pessoas têm de que sabemos tudo de português. Fazem perguntas, sem qualquer contexto, e esperam que tenhamos a resposta na ponta da língua. Já vi muita cara de decepção frente a dúvidas que também eram minhas e nada pude fazer, a não ser lamentar pela ignorância.

Obviamente que algumas coisas, de uso frequente, em qualquer profissão, se têm com mais facilidade. Mas fazemos, sim, as nossas consultas, claro, e estudamos diariamente. E quanto mais aprendemos, mais necessidade temos de aprender.

Um drama que tenho enfrentado mais recente, que considero quase um bullying, é quando a pessoa afirma “escrevo morrendo de medo da Celça”, ou coisa do tipo, referindo-se a postagens em redes sociais. “Tu leu, Celça, viu se tinha algum erro?” é muito pior. Já pensou, ler mensagens no Facebook fazendo correções? Se tivesse recompensa financeira por isso, eu estava feita na vida! As agressões à Língua Portuguesa naquela rede, meu Deus!

Falando nisso, outro problema do revisor é cobrar pelos seus serviços. Equivocadamente as pessoas pensam que é simples corrigir um texto porque “você tem facilidade”. Não é facilidade, é estudo e dedicação para não cair nas armadilhas da nossa língua, que muitas vezes desqualificam um texto; Não é facilidade, é investimento de tempo e dinheiro em capacitação! Também um equívoco comum, é dizer que determinado texto é fácil de corrigir, porque “tem bem pouquinho erro”. É preciso entender que se um trabalho de 100 páginas, por exemplo, tiver um baixo número de erros, estes só serão encontrados após a leitura do documento. Sem a revisão, como saber onde estão esses erros?

E o revisor tem um caráter paranoico. Pelo menos eu tenho. É quase uma enfermidade (risos), não se consegue ler nada sem o olhinho procurando um erro. (Lembrando que nosso trabalho vai além da identificação do erro, ele consiste na apresentação de soluções). Faço isso com jornais impressos e online (que têm muitos erros), com legendas na TV, com livros de autores renomados, etc. Outro dia comprei um livro do Cortella e fiquei impressionada com a quantidade de problemas que o material apresenta. (Ressalto que o problema não é do autor, não diretamente, mas da equipe de revisores a quem ele confiou sua produção). Minha proposta quando comprei o livro, era ler sobre educação, mas quando vi estava fazendo marcações nas páginas, como se estivesse trabalhando. É ou não é uma obsessão?

Mas, voltando ao drama de ser revisor, sabe o leitor por que sofro? Porque as pessoas, muitas, não estão preocupadas como escrevem, o que é lamentável! Algumas pensam que “o importante é comunicar”. Pois bem, mal sabem elas que o que escrevem, e como escrevem, revela muito sobre o que são.

A academia até me deixou mais tolerante. É claro que aceitar erros de português não é a coisa mais fácil do mundo, mas eu consigo deixar passar algumas coisas, principalmente quando conheço o grau de estudo da criatura, dando a ela um desconto. Agora, se é um colega de curso, um profissional, ou um professor, aí fica difícil! É mais forte do que eu. Mesmo assim, faço um esforço e observo a pessoa em outros momentos, no caso da fala, ou em outros textos, no caso da escrita e, se há recorrência de equívocos, sinto muito, não tem perdão!

É difícil, é dramático, é puxado, mas é tão interessante! O trabalho de revisora de textos me oportuniza experiências ricas de aprendizado. Já vi colegas dizendo “peguei o teu mal” felizes porque conseguiram identificar problemas em registros escritos. Mais feliz fico eu, quando tenho por perto pessoas preocupadas com o uso correto da língua, é quando eu realmente me encontro.

Maria Celça
Enviado por Maria Celça em 28/03/2017
Código do texto: T5954573
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