AULAS DE CAMPO

Em 2000 pude realizar uma das mais gratificantes atividades pedagógicas como Coordenador do Ensino Fundamental: as aulas de campo.

A sala de aula é o grande momento do estudante, entretanto, existem alguns objetivos pertinentes ao ensino fundamental que estão mais ao alcance se trabalhados fora das quatro paredes.

Melhorar o relacionamento interpessoal é um dos objetivos do ensino fundamental, sobretudo nas primeiras séries. As aulas de campo oportunizam aos educandos um tipo novo de relacionamento. Num misto de lazer e trabalho, em lugar aberto, onde podem se sentir mais a vontade as crianças se soltam e expressam mais verdadeiramente seus sentimentos, o que nem sempre está isento das observações do professor que deve estar atento a todos os tipos de atitudes e comportamentos.

Gostaria de destacar o crescimento no relacionamento de gênero. Meninos e meninas juntos viajando de um local para outro, explorando ou conhecendo um lugar novo, em contato com a natureza, num banho de praia, açude ou cascata, é muito mais enriquecedor, que os nossos discursos em sala de aula.

As aulas de campo são uma grande oportunidade para se viver na prática aquilo que muito tem se falado em classe relativo aos cuidados com o meio ambiente. Cuidados com o lixo resultante daquilo que se consome como restos de comida, sacos plásticos, sacolas de supermercado, garrafas de refrigerantes, etc. tudo é coletado. São também oportunidades para nos depararmos com muitas espécies animais e vegetais. Ver sem matar, nem prender, nem depredar é o desafio que se coloca para a criançada e onde se checa até onde vai o nosso ensino.

É também uma oportunidade para o crescimento do pensamento, pois permite conhecer ambientes novos. Aproveitamos para levar a meninada para conhecer as três zonas geofísicas do município de Itapipoca: praia, serra e sertão.

Outro detalhe é que tomamos as aulas de campo como tema gerador do processo de ensino. Explicando melhor: elaborei um roteiro eclético para poder servir de base para um estudo e aprofundamento das características de cada zona de modo que as atividades sugeridas se adequassem da 1a à 8a série e dentro das várias disciplinas.

Em cada aula de campo cada turma era dividida em equipes conforme as áreas estudadas, da mesma forma em que as atividades eram desenvolvidas:

1. Linguagem e Códigos – produção textual - Relatório da viagem.

2. Ciências Naturais e Matemática – coleta de amostras de plantas da região (folhas, flores, raízes, sementes para posterior estudo classificatório, coleta de amostras de minerais – rochas típicas de cada região, anotação dos nomes de animais visualizados – répteis, pássaros, insetos.

3. Ciências Humanas – pesquisa junto aos moradores sobre a origem do nome do lugar, tempo de habitação, número de habitantes, situação econômica percebida – crianças subnutridas, origem da água de consumo, uso de energia elétrica, existência de fossas, tipos de habitações, formas de imigrações, principais atividades produtivas... A Matemática sempre aparecia como uma ferramenta bastante necessária no cálculo dos dados coletados e nas formas de apresentação.

Na visita a Praia da Baleia e na Serra de Canoa o tema mais suscitado foi o da educação ambiental, da preservação dos recursos naturais, os cuidados com o lixo, bem como a presença do turismo. Na visita ao sertão do Arrodeador o mais marcante foi à discussão a respeito da existência e constatação de muitas casas sem habitantes, já que migraram para as grandes capitais configurando o êxodo rural e o flagrante de dois momentos marcantes: o nascimento de um cordeirinho e o encontro com uma senhora de mais de sessenta anos conduzindo uma cabaça de água na cabeça. Chamou muito a atenção das crianças o fato de haverem achado bastante ossos de animais mortos, vítimas da seca.

A autonomia é um dos objetivos mais relevantes no ensino fundamental: contribuir para que os educandos alcancem autonomia tanto nos estudos quanto para a vida cotidiana no futuro. Na aula de campo o exercício da autonomia é vivido no momento em que cada um é responsabilizado em cuidar da sua bagagem, lanche, roupas e calçados. Diferentemente de casa onde um adulto sempre segue consertando o que a criança passou, desorganizando, na aula de campo cada criança é orientada sobre as responsabilidade e tarefas pessoais num exercício construtor de autonomia.

Existem muitos outros aspectos positivos que esta atividade lúdica proporciona aos educandos e que noutra ocasião poderemos abordar com maior riqueza de análise como a convivência com as diferenças, o desenvolvimento do sentimento de respeito, de orientação espacial, desenvolvimento de atitudes de cooperação, atitude contemplativa, investigativa, crítica, autocrítica, valorativa...

Finalizando gostaria de ressaltar a motivação. Requisito dos mais necessários e almejados pela escola e pelos educadores nos dias atuais. A estruturação que demos à atividade das aulas de campo é antes de tudo um fortíssimo fator de motivação dos alunos para o ensino. Como a proposta é de ter-se a aula de campo como tema gerador. Dentro de uma proposta metodológica interdisciplinar os conteúdos pesquisados, os materiais coletados - rochas, folhas, raízes, frutos - e as entrevistas feitas junto á população local é ajuntado pelos professores e servirão de subsídio didático suficientes para serem trabalhados por semanas a fio e em várias disciplinas. Com uma diferença valiosíssima: com ludicidade e motivação.