Até no sofrimento somos egoistas
Numa tediosa manhã de inverno, estava na fila de um grande hospital, e o que todos tinham em comum era dor, logo percebi que todos são parecidos quando sentem dor, e o ambiente era deprimente. Onde os funcionários mal pagos, nos tratavam com um certo ar de desprezo.
Como o tempo de espera era longo, comecei a observar os rostos, fisionomias e falas. Toda conversa girava em torno de alguma tragédia, afinal a boca fala o que está cheio o coração. E num banco bem próximo havia três velhotas, filosofando sobre os sofrimentos da vida.
A primeira velhota, dizia que sua vida foi somente tragédia, perdeu um filho assassinado, e que já tinha feito duas cirurgias, tinha diabete, pressão alta e forte dor de cabeça.
A segunda velhota, levantou o tom de voz e disse sua vida sempre foi um verdadeiro inferno, perdi dois maridos, fiz uma cirurgia no coração, tive câncer nas mamas e o médico me disse que tenho mais de 10 doenças, até Chagas eu tenho, estou viva por um milagre.
A terceira velhota, levantou-se rapidamente, e engrossou o tom de voz para falar do seu sofrimento, ela começou dizendo que tinha feito uma cirurgia que abriu toda sua barriga como de um porco no matadouro de cima em baixo e tinha grande cicatriz , e também tinha várias doenças terminadas em ites e outras com nomes difíceis de se pronunciar, geralmente aquelas que levam o nome do seu descobridor.
E a conversa continuava amigavelmente explorando as tragédias da vida, e ali percebi claramente que o ser humano é muito egoísta e até no sofrimento quer que sua dor seja maior.
E a cada instante chegava um novo paciente, naquela Santa Casa de Misericórdia, onde a misericórdia já foi esquecida a muito tempo.