PONTO DE VISTA
Minha filha está morando em Sidney, na Austrália. Só depois de dois anos morando lá é que as autoridades australianas deixaram que ela começasse o procedimento para tirar carta de motorista. Na época eu pensei que era exagero das autoridades australianas, pois  a menina já dirigia a mais dez anos. Ela morou quatro anos em São Paulo, cidade que tem um dos trânsitos mais malucos do mundo. Quem dirige em São Paulo, pensava eu, tem condição para dirigir em qualquer lugar do mundo. É como a canção do Frank Sinatra que fala de New York. Quem faz em New York, faz em qualquer parte.
Eu pensava assim até que fui visitá-la na Austrália e ver que os carros lá têm a direção do lado direito. E que lá se anda pelo lado esquerdo da rua. É igual na Inglaterra e  outros países de tradição inglesa. Quer dizer: o lado certo da rua para eles é o lado errado para nós. Para dirigir um carro na Austrália ou na Inglaterra é preciso mudar a orientação geográfica do nosso cérebro e aprender a enxergar a direita na esquerda e a esquerda na direita. Cara, é um baita exercício! Isso me deu o que pensar. Será que não é por isso que temos tanta dificuldade para entendermos uns aos outros?  
1188157.jpgExplico: veja a figura ao lado:  Imagine-se entrando nessa imagem. Coloque-se nessa figura. O que aconteceu? Seu olho direito não se tornou o esquerdo, e o esquerdo o direito?
Quando falamos diretamente com uma pessoa, frente a frente, o lado direito dela é o nosso esquerdo e vice-versa. Dai a nossa percepção fica prejudicada porque há um desajuste de posição nesse sentido. O que ela está vendo em você está do lado contrário do que você vê nela. Teste essa proposição um dia. Verifique se você consegue entender melhor uma pessoa quando conversa com ela de lado, ou de frente para ela. Você vai ter uma surpresa.
Essa é apenas uma curiosidade neurolinguística. O importante disso tudo é o questionamento que pode ser deduzido dela. Se, no processo de comunicação, o lado esquerdo das pessoas é o lado direito para nós e vice versa, é lícito pensar que o nosso cérebro, antes de decodificar a mensagem que vem do nosso interlocutor, precisa fazer um ajuste geográfico na fonte dessa mensagem. E ele faz isso sempre, senão a nossa comunicação seria um verdadeiro caos. Seria como chegar hoje na Inglaterra ou na Austrália, pegar um carro e sair dirigindo. Você pode imaginar o que aconteceria. ]
Há outra questão importante aí. Se o lado certo dos ingleses e australianos é o errado para nós, e vice-versa, o que acontece com os conceitos de certo e errado? Não serão também questões de ponto de vista? E quantas coisas mais, pelas quais matamos e morremos, não seriam igualmente apenas pontos de vista? Einstein disse que era. A teoria da relatividade trabalha com essa perspectiva. Fisicamente nós sabemos que a cada vez que mudamos o nosso ângulo de observação, um mundo diferente aparece aos nossos olhos. Mas na prática temos muita dificuldade para entender e aceitar isso. Por isso é tão difícil calçar o sapato alheio. Principalmente quando ele não nos serve. E assim vamos continuar eternamente brigando por causa dos nossos pontos de vista.