Acidente da TAM
Recolhi o seguinte texto do site oficial do Jean Wyllys:
Tragédias
18 de julho de 2007
A tragédia no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, nos chocou a todos. As tragédias sempre nos chocam, mobilizam-nos e nos levam a um mergulho nas razões de nossa existência e a questionamentos em relação à existência de Deus...
Hoje, pela manhã, quando desci para comprar os jornais, Francisco, dono da banca de revistas que fica em frente à minha casa, no Rio de Janeiro, disse-me, meio constrangido: “Não há mais jornais. Infelizmente, tragédias sempre vendem”.
Sim, Francisco, você está parcialmente certo: há sem dúvida um atrator estranho na tragédia. Em qualquer tragédia. Ela nos coloca entre a atração e a repulsa. Mas, independente desse atrator estranho, a tragédia nos mobiliza pelo que tem de inusitado, inesperado e acidental: a sensação é a de que poderia ser qualquer um de nós no lugar de suas vítimas fatais.
Esta sensação nos torna frágeis porque nos dá a consciência do fim; da morte inesperada; de que tudo agora mesmo pode estar por um segundo... E então nos perguntamos: “Pra que tanta pressa? Por que tanto ódio? Pra que ter tudo que se tem? Por que não dividir? Por que querer sempre mais? Por que querer ser, em tudo, o primeiro? Por que não viver os detalhes pequenos? Por que não amar? Pra que discriminar? Por que esquecer de viver, se a vida é tão curta e tão frágil e se, de um momento para o outro, a gente pode desaparecer?”.
Mais que mergulhar nas razões de nossa existência, perguntamo-nos: “Se há deuses ou se há um Deus, há um propósito naquela tragédia ou em qualquer tragédia?”. Vi, no noticiário, as famílias lamentando quão bons eram seus parentes mortos. “Então, se há deuses ou se há um Deus, por que ceifar a vida de gente boa e decente e deixar criminosos cruéis e gente má no mundo?”: é o que a gente se pergunta na hora do desespero, com a fé abalada.
Mesmo não querendo às vezes, sou um homem de fé. Acredito nos mistérios (da vida e da morte). Acredito num propósito por trás disso tudo, embora não saiba qual. E, com isso, não quero dizer que as tragédias não possam ser evitadas. Temos livre arbítrio para intervir em nossos destinos. Nem quero minimizar a negligência e a irresponsabilidade – se for comprovado que elas existiram - de quem trabalha e recebe para que tudo funcione de verdade. Apenas quero dizer que acredito nos motivos profundos dos fatos da vida.
Lamento pelos que se foram e peço ao universo (aos meus santos, orixás, guias, energias, enfim, a Deus) que dê a eles a luz que não se apaga: o amor dos que ficaram e que os manterão vivos na memória.
Lembrei-me desses versos sobre Deus de Manoel Bandeira, um dos meus poetas preferidos (e os dedico aos que se foram e aos parentes e amigos que ficaram):
Estás em tudo que penso
Estás em quanto imagino:
Estás no horizonte imenso
Estás no grão pequenino.
Estás na ovelha que pasce,
Estás no rio que corre:
Estás em tudo que nasce
Estás em tudo que morre