COMUNIDADE DO CONTO - EXPERIÊNCIA LÚDICA, ÚNICA, MÚLTIPLA

Ainda não tinha falado disso mas é preciso por os pontos no is, para fazer justiça ao que é justo. Recentemente, a convite do escritor e articulador sócio-cultural Sacolinha, tive a oportunidade de participar de uma das etapas do projeto Comunidade do Conto, que rola organiza em Suzano, SP.

Pelo que sei, o CC existe/resiste desde 2010, criado pela Associação Cultural Literatura no Brasil, da qual Sacolinha é um dos mentores. Trata-se de dois encontros com um público previamente selecionado para a sacralização do conto, contando com a mediação luxuosa de algum convidado especial. A condição básica é que este (ou esta) convidado (a) tenha notoriedade, expressão e argumento sobre o tema proposto.

Dessa vez, o profº e escritor Sérsi Bardari, que tem uma ficha corrida enorme com a literatura (e educação), ligado umbilicalmente ao universo jovem. A proposta era debater álcool e juventude e a seguir produzir um texto em prosa relacionado ao assunto. Após o primeiro encontro, voltamos para casa e tivemos então trinta dias para fazer um (ou vários) conto (s) abordando o tema.

O CC traz uma diversidade de interesses àqueles que desejam adentrar/discutir o gênero conto. Uma delas é o “olho-no-olho” da conversa, que permite o aprofundamento das questões, o sanar dúvidas e a troca de saberes/idéias/influências de uma maneira muito espirituosa, pois tudo é concertado pelo viés da compreensão, respeito e afabilidade. O encontro, cujo prazer é literário mas também humanamente humano, propicia o enriquecimento lícito, a apropriação cultural, a prática da escutatória e o fomento das digressões críticas. Isso incorre diretamente em outra questão, a meu ver tão importante quanto: a recuperação da prática da oralidade, uma das mais belas formas de comunicação entre seres. Terceiro, o desinchaço do ego, através da leitura compartilhada, da atenção ao pormenor, da crítica direta e educada.

Convenhamos: hoje, exarcebados pela cultura do selfie, do “faça você mesmo” (do it yourself), estamos todos propensos a um protagonismo intermitente, sem pausa para a autocrítica e a ponderação. Fugir disso é o primeiro passo para a construção de um trabalho sólido que possa superar a temporalidade da maioria das obras que estão sendo produzidas nesse exato momento.

Outro aspecto relevante a ser relatado é o gozo de estar entre pares, gente duplamente bela, cujos sorrisos e palavras tive a fortuna de degustar. Povo que está produzindo com afinco trabalhos inspirados, transpirados e renovados. Inspiradores, transpiradores e renovadores. Para nós, para as letras brasileiras.

Cito as três novas parceiras/amigas Lídia Irecson, Adriana Calabró e Patrícia Cardoso – todas elas da confraria Beco dos Escritores – entidade literária da zona oeste, que cruzaram a cidade de São Paulo, sentido Alto Tietê, e das quais obtivemos três textos suntuosos e equilibrados, somados a gostosas conversas e fecundos apontamentos. Puro deleite a vivência com elas. Também tive o prazer de conhecer a simpaticíssima contista Mônica Franco e o cordelista Francis Gomes, de quem já conhecia o tesouro poético mas não sabia que confessava outros gêneros literários. Além, claro!, do texto urdido com ferro e fogo do sempre surpreendente Sidney Leal (de quem, aliás, já tive o prazer de prefaciar um livro de contos) e o deliciante João Tereza, conto do Sacolinha, que a cada dia reafirma sua condição de protagonista na literatura brasileira renovada neste princípio de século.