MINHA MÃE
MINHA MÃE
Maria da Glória Ferraz Luz, nasceu em Cristina, Minas Gerais, no dia 17 de Abril de 1910. Seu pai agricultor no ramo do tabaco, plantava, colhia, curtia e tratava do fumo em corda no porão de sua casa, e o cheiro da nicotina exalava por toda a casa, advindo do porão pelo assoalho. Assim, a pequena Glória teve problema respiratório, causando-lhe estado de moribunda, fazendo seus familiares assistir seus últimos desterros de vida, aos tragos de uma cerveja. Eis que dos familiares teve a ideia de molhar sua boca com cerveja, no que lhe ressuscitou daquela intoxicação, passando a ser quando moça, uma moderada apreciadora da cerveja. Porém conviveu com seu mau respiratório para sempre, e, quando nervosa, a crise agudizava.
Estudou no Colégio Santa Inêz, no Bom Retiro em São Paulo, em regime de internato. Seus banhos no colégio tinha que ser com um camisolão, sendo proibida a nudez durante o banho. Assistia a Santa Missa todas as manhãs antes das aulas. Nas férias retornava a sua cidade.
Mudaram para São Paulo, numa residência provisória sita à Rua Treze de Maio, até que a casa construída na Rua Fausto Ferraz nº 86 ficasse pronta. Nesta rua a cem metros distante morava sua colega Carolina, do Curso Normal da Escola Caetano de Campos. Salta aos nossos olhos, ver seu álbum de formatura, um único colega, que veio a ser conhecido na carreira política, como também, na colônia judaica o então Herbert Levy, combatente na Revolução Constitucionalista MMDC de 1932.
Glória exerceu o magistério no Colégio Imaculada Conceição numa classe de custeio publico lecionando o currículo primário aos mais carentes. Muitos de seus alunos tornaram-se profissionais que vieram a atendê-la depois de casada, entre eles havia um chofer de praça e seu irmão jornaleiro, ambos com ponto comercial na esquina da Av. Paulista com Brigadeiro Luiz Antônio; outro era encanador, e, por diversas vezes, atendeu emergências da sua casa sita à Alameda Santos n.º 810.
Glória e Carolina se tornaram além de colegas amigas e confidentes, vindo a se tornarem cunhadas através de um namoro clandestino com o João, com trocas de recados num mesmo caderno que rendeu três volumes até o casamento em 1938. O casal desde idos tempos de solteiros pertenciam a Ordem Terceira Franciscana, com pseudônimos diferentes dos de civil, e nestas trocas de conversas, se tratavam pelos seus nomes franciscanos. Era um namoro inusitado, a ponto de quando a Glória disse aos seus pais que ficaria noiva, o susto foi geral entre as famílias, pois não se via a menor relação de amores entre eles ou com quem quer que fosse. Mas o selo de fidelidade já havia sido declarado em 1936 e aproveitado como epitáfio os seguintes dizeres: “Confio e espero em Deus que a morte não há de separar nunca. Viveremos juntinhos no Céu amando e gozando por toda eternidade 01/05/1936”.
Carolina era organista na Igreja Imaculada Conceição, e em 1935 optou pela vida monástica, ingressando na Ordem Beneditina na Abadia de Santa Maria no bairro da Bela Vista. Glória se casou em 17/02/1938, abdicando do professorado público, mas lecionando aos quatro primeiros filhos e catequizando-os muito cedo, sob orientação do seu confessor que autorizou a Primeira Comunhão deles antes dos cinco anos de idade. Tiveram nove filhos, todos batizados nas primeiras vinte e quatro horas do parto, com seus primeiro nomes de José para os meninos e de Maria para as filhas. Nunca deixou de frequentar a Missa diária, comungando sob jejum, regra tão difícil para as crianças que tinham de jejuar a partir da meia noite do dia anterior até a hora da mesa da comunhão. Sua ascese percorreu desde a Congregação da Pia União das filhas de Maria, Ordem Terceira Franciscana, Equipe de Casais de Nossa Senhora até admissão como sócia do Opus Dei, onde tem suas únicas duas filhas numerárias da Obra.
Reservava um dia da semana para com as irmãs, primas, sobrinhas e amigas, confeccionarem enxoval para recém-nascidos pelo Amparo Maternal.
Viveu noventa e um anos lucida, porém, de saúde debilitada ao final da vida, com intervenções cirúrgicas, sendo que numa delas teve que ser intubada no que lhe agravou as cordas vocais, precisando de ajuda de fonoaudiologia para sua reabilitação, agravando mais seu estado respiratório desde criança. Faleceu em 18/06/2001, praticando o seu epitáfio, até que seu marido lhe veio ao encontro três meses depois, no dia 22/09/2001, ”vivendo sempre juntinhos no céu amando e gozando por toda eternidade”.
Pra terminar deixo o refrão da musica:
“-No céu, no céu com minha mãe estarei!”
José Francisco Ferraz Luz