O QUE MUDOU?

Francisco de Paula Melo Aguiar

[...]

Quando quer é porque quer, fazendo sua vontade lei, passo para a qual a disposição citada [...].

Gazeta da Parahyba

24/07/1888

O jornal Gazeta da Parahyba¹, folha diária de 24 de julho de 1888, denuncia a morosidade do Poder Judiciário no tempo do fim do Segundo Império na Provincia da Parahyba, envolvendo devedores da Fazenda Pública, tendo como pano de fundo a burocracia e o desrespeito a lei de 1º de dezembro de 1761, então em vigor. Enfatiza que o Dr. Trindade, o juiz daquele feito “quando quer é porque quer, fazendo sua vontade lei, passo para a qual a disposição citada”. E isso é prova de que os processos judiciais iam parar nos órgãos de imprensa da época, embora ainda que o Brasil não fosse república. E as partes envolvidas já vivenciavam momentos difíceis na esfera acanhada da justiça distribuída nos últimos dias da monarquia e da escravidão entre nós. Herança ainda viva nos meios judiciais e processuais republicanos, inclusive com o uso e o abuso do Estado de Direito, onde todos são iguais perante a lei, apenas enquanto literatura magna, tendo em vista que na prática isso não existe. A arrogância e a prepotência faz os serviços públicos judiciais e administrativos nas esferas dos três poderes da república não funcionar, apesar de que todos os cidadãos participam do consórcio diário para pagar impostos diretos e indiretos para manter tais serviços e poderes constitucionais. Assim sendo, a folha diária mencionada publicou em termos de denuncia pública, justamente para que a população tomasse conhecimento do comportamento do magistrado citado. Os envolvidos eram pessoas da alta sociedade da época, caso contrário, iam ter que prestar contas na cadeia e outras punições, embora que ilegais. Naquele tempo a magistratura era nomeada sem concurso público, portanto, devia atenção e favor ao presidente da Província da Parahyba e porque não dizer a classe política dominante. E também não era diferente nas demais províncias do país. E o jornal publica o pedido de intervenção do chefe do Poder Executivo Estadual em um certo processo judicial que o magistrado não queria vê-lo concluído, afirmando: “[...] ora bem vê o Sr. Dr. juiz de direito e bem poderá ver Exc. o Sr. Presidente da província, a quem tem esse juiz suas queixas por officio, que tem perfeito assento na lei a prática de irem os mandados, depois de assignados pelo juiz, à secção do contencioso. E, quando não houvesse essa razão legal, inveria outra razão tirada do bom senso” [...]. Então, o que mudou? O jornal Gazeta da Parahyba - 1888 a 1890 - PR_SOR_02996 (digitalizado) se refere ao senhor Antônio Gomes Cordeiro de Mello, primeiro Presidente do Conselho Municipal de Intendência de Santa Rita, que juntou documento com prova de pagamento de dívida sua junto a Fazenda Pública Estadual, ex-vi parte da referida denuncia formalizada pelo Procurador Fiscal junto ao Presidente da Provincia Estadual da Parahyba, “[...] Qual é portanto a razão por que o Sr. Juiz dos feitos faz escarcéo e representa ao presidente porque o procurador fiscal requereu para juntar-se a uma acção o documento que provava estar paga a divida, que foi a do Sr.Antonio Gomes Cordeiro de Mello? A razão é porque estava a conta em juízo, e somente este podia dar a guia. Quem porém com o devido critério jurídico procurar a razão do que dispõe o art. 32 do supra citado regulamento, chegará a convencer-se que o Dr. Juiz dos feitos desarrôa, quando quer negar ao contencioso o direito de passar guias para recolhimento dos debitos, cujos mandados não foram ainda cumpridos. E que autoridade tem o juiz para assignar, como tem assignado as guias passadas pelo escrivão?² [...]”. E onde fica a cidadania responsável pelo pagamento direto e indireto de impostos para manter a maquina estatal nos três níveis do poder público brasileiro?

Repetimos o que mudou de 1888 para 2015 no ramerame do aparelho julgador nas comarcas das unidades da federação nacional republicana em pleno século XXI?

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¹ Cf.: Gazeta da Parahyba - 1888 a 1890 - PR_SOR_02996 . In.: <http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=808865&PagFis=233&Pesq=ANTONIO%20GOMES%20CORDEIRO%20DE%20MELLO >. Acesso em 03/042015.

² Cf.: Idem. Digitalizado. In.: http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=808865&PagFis=233. Acesso em 03/04/2015.

FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR
Enviado por FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR em 15/12/2015
Reeditado em 26/07/2016
Código do texto: T5481338
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