Os Mouros na Península Ibérica
INTRODUÇÃO
Comentamos no primeiro artigo dessa série que, no ano de 2013, nosso trabalho, “Matriz Brasil” se voltou para as influências de nossa matriz indígena na cultura do povo brasileiro, ainda em formação.
Acrescentamos que se pretendermos entender nossa etnia, temos que buscar compreensão sobre nossa matriz indígena, o colonizador português, e o escravo africano, as três etnias básicas componentes de nossa formação primeira.
Assim, nosso trabalho que estamos iniciando em 2014 e que pretende entender as duas outras contribuições para nossa etnia em formação, iniciaria pelas influencias do colonizador português e, que para tal era importante entender quem era o colonizador português.
Como o artigo ficaria muito extenso dividimos essa primeira parte de nosso trabalho em: Nativos da Península Ibérica; já realizado;
Os Celtas na Península Ibérica; já realizado;
Os Romanos na Península Ibérica; já realizado;
Os Germanos na Península Ibérica; já realizado;
Os Mouros na Península Ibérica; objeto deste artigo; e
Colonizadores Portugueses.
A INVASÃO MOURA
Em 711, Tarik comandando poderoso exército invadiu, pelo Estreito de Gibraltar, a Península Ibérica e, facilmente, venceu a resistência dos cristãos visigodos, na batalha de Guadalete. Assim terminava o breve reinado de Roderico (709-711) o último rei visigodo da Península.
Tratava-se de exército norte africano, composto por elementos genericamente designado de mouros - tratava-se essencialmente de berberes com elementos árabes.
Os berberes referem-se ao conjunto de povos do Norte de África que falam línguas berberes, da família de línguas afro-asiáticos.
O termo mouro deriva do latim “maures”, que significa “negro”, em referência à pele escura da população. No início do século VIII, os mouros se converteram ao islamismo após o contato com árabes vindos do Oriente Médio, para espalhar os mandamentos do profeta Maomé.
Esses “Mouros”, que vieram da África, da Mauritânia, do Marrocos e parte ocidental da Argélia, esse exercito invasor “berbere” atravessou o “Estreito de Gibraltar”, que separa a Europa da África, e rapidamente conquistou a Península Ibérica.
A conquista foi rápida, mas de longa duração e com importantes influências à formação do nosso colonizador. Os mouros precisaram de menos de uma década para dominar a região. Três anos após o início da invasão, a maior parte do território da península Ibérica já estava dominada.
O curioso é que essa ocupação foi incentivada pelos dominadores anteriores, os visigodos, que disputavam internamente o trono visigótico. Nessa ocasião, um grupo de descontentes com a sucessão do reino pediu ajuda militar a uma das lideranças muçulmana.
Os muçulmanos atenderam ao pedido, aproveitaram a oportunidade e se estabeleceram então na península e, progressivamente, foram ampliando seu domínio territorial.
RESISTÊNCIA CRISTÃ
Os cristãos visigodos que resistiram refugiaram-se nas Astúrias, hoje comunidade autônoma espanhola, capital Oviedo. Reunindo a sua volta as populações descontentes iniciaram um movimento de Reconquista marcado pela vitória de Pelágio, na batalha de Covadonga, nas Astúrias em 722.
Protegidos por uma imponente cadeia montanhosa, os cristãos refugiaram-se naquele pequeno território do norte da península, a partir do qual dariam início ao processo de Reconquista Cristã. Inicialmente mediante pequenas escaramuças, até aos confrontos diretos com os estandartes dos vários reinos cristãos que se foram formando.
O Reino das Astúrias foi, portanto, a primeira entidade política cristã estabelecida na Península Ibérica, depois da capitulação do Reino Visigótico.
Com o tempo, depois de muitos combates recuperaram vários territórios e formaram novos reinos cristãos. Com avanço e recuos os mouros foram gradativamente empurrados para o sul.
Mas, não se pode pensar esse processo de mais de cinco séculos, com a presença árabe na Península e o movimento de Reconquista Cristã, como um tempo de conflitos permanentes entre os dois povos.
Para além de satisfazer a honra e linhagem dos nobres visigodos, bem como os dogmas da Igreja Cristã, que motivavam as lutas de reconquista, existia um relacionamento pacífico entre os dois povos.
Ocorreram fortes processos de aculturação e entrecruzamento entre as populações autóctones da Península e as populações ditas mouras. Os processos culturais foram de extrema importância devido à complexidade, sofisticação e envergadura civilizacional dos mouros na época.
Os “Moçárabes”, descendentes dos cristãos atestam bem esse convívio pacífico. Portadores de cultura hibrida, apesar de não terem se convertido ao islamismo, os Moçárabes adotaram elementos da língua e cultura árabe. Misturavam na sua arte e costumes elementos de ambas as civilizações. Além disso, as populações peninsulares não guardavam boas memórias do feudalismo dos tempos visigóticos.
Passados os primeiros tempos, a aceitação da nova realidade não foi tão dolorosa. Às invasões árabes, o reconhecimento de arrancarem do isolamento e das trevas o mundo feudal peninsular.
CONTRIBUIÇÃO MOURA AOS IBEROS
Cabe aqui a observação de que a contribuição moura ocorreu tanto durante o domínio mouro, quanto depois da reconquista cristã, como escravos.
A dualidade na cultura e no caráter dos portugueses acentuara-se sob o domínio mouro. Mas, a escravidão a que foram submetidos os mouros e até moçárabes, após a vitória cristã, foi o meio pelo qual se exerceu decisiva influência sobre o português.
Na ciência e na Tecnologia
No seu percurso expansionista, os árabes assimilaram, sintetizaram e aperfeiçoaram as técnicas e os conhecimentos mais avançados do seu tempo. A cultura árabe espelhava o refinamento e a especialização, que a ciência da época atingira.
Da Índia trouxeram e disseminaram por todo o Islão a noção do nada, do zero. Dos Persas o conhecimento dos céus e dos astros. Em contato com chineses e japoneses novas medicinas, a pólvora e o papel.
A ciência náutica, arquitetura e a engenharia naval são exemplos da fértil contribuição dos invasores aos futuros impérios mundiais estabelecidos pelos navegadores espanhóis e portugueses. Foi grande a influência sobre a Escola de Sagres, em Portugal, de onde saíram os oficiais e marinheiros das navegações da Era dos Descobrimentos.
Desenvolveram da cartografia à navegação: mapas e roteiros que mais tarde os portugueses e espanhóis utilizariam. O conhecimento dos mares, dos astros e muito mais...
Aperfeiçoaram o astrolábio, instrumento de origem grega, que permite a orientação em alto-mar pela observação de estrelas.
Com a tradução de inúmeras obras científicas, desenvolveram-se a química, a medicina e a matemática, sendo de origem árabe o sistema de numeração ocidental.
Na Agricultura
A influência árabe foi particularmente importante na vida rural. Valorizou a terra e a salvou das secas por meio de desenvolvimento de técnicas de irrigação. Não só a oliveira foi aumentada de valor e utilidade pela ciência dos mouros, também as vinhas. Além disso, desenvolveram a cultura da cana de açúcar.
Foram eles que trouxeram à Península o limoeiro, a laranjeira azeda, a amendoeira, a figueira do Egito, o algodão, o bicho-da-seda e, provavelmente, o arroz.
Na Cultura
Com exceção daquele pequeno número de intransigentes que se concentrou em Astúrias, centro da independência cristã, grande parte das populações cristãs submeteu-se ao domínio político dos mouros.
Apesar de conservar a religião e o direito civil, nas demais esferas da vida econômica e social, a maioria dos vencidos sofreu a influência intensa dos invasores e desenvolveu intimas relações.
Foi essas populações, os moçárabes, gente impregnada da cultura e mesclada do sangue do invasor, que se constituíram no fundo e no nervo da nacionalidade portuguesa.
A ocupação islâmica não provocou alterações na estrutura linguística, que se manteve latina, mas contribuiu com mais de 600 vocábulos, sobretudo substantivos referentes a vestuário, mobiliário, agricultura, instrumentos científicos e utensílios diversos.
São exemplos de vocábulos de origem moura na língua portuguesa: - vegetais – açafrão; acelga; alface; alfazema; alcachofra; azeitona; cenoura; lima; limão; e laranja; - sobrenomes próprios: Almeida; Albuquerque; e Alcântara; - outros verbetes – alcool; chafariz; elixir; xarope; zero; e zênite.
Estilos musicais como o flamenco e o fado nasceram influenciados por ritmos e instrumentos mouros. O próprio folclore tem presença moura em muitas de suas músicas. Em particular, o fado é um lamento mouro temperado pelos lusitanos.
O violão, por exemplo, deriva de antigos instrumentos árabes.
Na Genética
A invasão moura e berbere, povos do norte da África, não foi a primeira a alagar de pardo ou de preto os extremos meridionais da Europa, particularmente Portugal.
Até que ponto o sangue português, já muito semita, por infiltrações remotas de fenícios e judeus, infiltrou-se também no mouro, durante os fluxos e refluxos da invasão maometana, é quase impossível determinar.
No primeiro contato dos invasores maometanos houve penetração do elemento vitorioso com as populações cristãs. Penetração facilitada não só pela situação de domínio do povo africano, como pela sua tendência para a poligamia.
Inúmeras as famílias nobres que, em Portugal como na Espanha, absorveram sangue de árabe ou mouro.
Nenhum elemento de identificação mais inseguro de hispanos e de mouros, de cristãos e infiéis, de vencidos e vencedores, de nobres e plebeus na sociedade portuguesa, que os nomes de pessoas e de família.
Após a invasão acompanhada de intensa miscibilidade, tornaram-se comuns os nomes mistos: Pelágio Iban Alafe, Egas Abdallah Argeriquiz etc. O que dá bem a ideia de contemporização social entre vencidos e vencedores. Ideia exata de quanto foi plástica, flexível e permeável a sociedade moçárabe em Portugal.
A RECONQUISTA CRISTÃ
A religião que os mouros praticavam ao invadir a península Ibérica contribuiria, porém, para sua expulsão da Europa. Foi o sentimento antimuçulmano que fez crescer, nos territórios cristãos ocupados, a resistência aos invasores.
As constantes lutas internas e as cíclicas tentativas de fragmentação do estado islâmico peninsulares contribuíram para o avanço cristão que, lentamente, foi empurrando os muçulmanos para o sul.
A luta entre cristãos e muçulmanos arrastou-se, com avanços e recuos, ao longo de seis séculos, sendo o Algarves acrescentado ao território português em 1249, no reinado de Afonso III. Considera-se 1249, com a conquista definitiva do Reino do Algarve pelos portugueses, o fim do domínio mouro em território português.
VESTÍGIOS DA PRESENÇA MOURA
A política cristã nas lutas de reconquista, ou de libertação do domínio mouro era de “terra arrasada”. Cada localidade retomada era destruída e queimada. Fogueiras ardiam durante dias.
Assim, vestígios materiais da longa permanência muçulmana na Península não correspondem ao longo período da poresença,moura. Mas, restaram alguns elementos que atestam este período da vida portuguesa, principalmente nas muralhas e castelos, bem como no traçado de ruelas e becos de algumas cidades do sul do país.
A igreja matriz de Mértola é a única estrutura em que se reconhecem os traços de uma mesquita.
São testemunhos da influência árabe os terraços das casas da região de Algarve, as artes decorativas, os azulejos, os ferros forjados e os objetos de luxo: tapetes, trabalhos de couro e em metal.
Os numerosos descendentes dos árabes que, após a Reconquista, permaneceram em Portugal, viviam nas “mourarias”, arrabaldes semi rurais junto dos muros das cidades e vilas, das quais se conserva a memória, nos nomes e no desenho, ou arquitetura de mais de vinte localidades, como Lisboa e muitas outras ao sul do Tejo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse grande intervalo de tempo, o que a cultura peninsular assimilou da cultura dos invasores, depois subjugados pela reconquista cristã, é o que hoje mais diferencia e individualiza essa parte da Europa.
Ao se incorporarem a sociedade cristã reconquistada o número bem representativo de moçarabes traziam consigo a influência cultural e o sangue mouro e negro, que foram definitivos para a colonização no Brasil.
Grande como foi a influência do mouro dominador, não foi menor a do mouro cativo de guerra. Foi o vigor de seu braço que tornou possível em Portugal o regime de autocolonização agrária pela grande propriedade e pelo trabalho escravo. Depois foi essa experiência, esse regime empregado no Brasil.
Certamente, os defensores do pensar de que “nada acontece por acaso”, ou de que “Deus escreve certo por linhas tortas” ou, ainda, de doutrinas espiritualistas que afirmam a existência de conjunto de Leis Maiores, que empurram a humanidade à evolução poderiam justificar, que esse conjunto de eventos à formação daquele povo português, ocorrera como preparação, para a matriz europeia do povo brasileiro.
FONTES:
historiadomundo.com.br
infoescola.com
lusitania88.blogs.sapo.pt
mundoestranho.abril.com.br
mundolusiada.com.br
pt.slideshare.net
wikipédia.org