NU, COM UMA LANTERNA,VAGANDO DE LIVRO EM LIVRO
Nos sites que escrevo meus leitores tem acesso a meu email além dos locais reservados aos comentários. Não faço mediação e também não respondo o que eles escrevem porque entendo que nesses meus espaços as manifestações de opinião são todas, sem exceção, sejam quais forem, são permitidas. Elogios, discordâncias com ou sem ofensas, são, por mim permitidas. Não sendo assim é censura e sei bem o que isso significa.
Não me cabe decidir o que podem ou não, o que devem ou não dizer a respeito do que escrevo. Cabe ao leitor escolher as palavras e perceber seus limites.
Meus textos às vezes são tão irônicos em algumas crônicas que a primeira leitura parece coisa feita por comediante, eles tão em moda nesses tempos de humor vulgar. E nos textos que são irônicos também há uma forte dose de desprezo tanto quanto de desconsideração.
Portanto, o que parece ser para rir, será sempre tanto quanto puder, para chorar. Depois da publicação da crônica Fala Sério, (recantodasletras.com.br/autores/cesarcabral/T5423127) que para muitos pareceu um descompromissado texto engraçado, para outros, disseram, foi incompreensível. Certamente, já que as falas reproduzidas naquela crônica sobre o que andou dizendo o Zilmão, não fazem mesmo nenhum sentido, pois essa criatura quando fala não considera paralelismo sintático e tão pouco semântico, são oximoros. Se o texto daquela crônica for lido novamente e com atenção, meus leitores perceberão que não é o cronista fazendo graça mais sim reproduzindo a estupidez e a ignorância retórica. Coisa que para alguns pode ser engraçado.
Nem sempre escrevo como fiz na crônica Fala Sério, que trata de política, com a ironia necessária. Porém, confesso que tenho extrema dificuldade em tratar desse assunto nesses últimos anos incomparáveis, sem nenhuma referência, senão aos tempos do fim da república em Roma, ainda que mal comparando. No Brasil desses últimos tempos extrapolou-se tudo do que trata a política, aquela que é a “ciência do governo das nações; a arte de regular as relações de um Estado com outros” para se tornar numa vergonhosa trampolinagem explicita.
Não diria que estamos numa crise política gigantesca, a maior em toda existência da república, nem outros exageros simplórios, discurso de oposição ao Partido dos Trabalhadores, no poder, nem outras tolices de oportunistas e vigaristas intelectuais. Vivemos sob uma grave crise, sim, de governabilidade. De incompetência política e administrativa que é o portal da corrupção. Soma-se isso e o resultado é desgoverno Um salve-se quem puder nos três poderes autônomos e em desarmonia.
Na República de Platão a cidade (o Estado) é perfeita, virtuosa onde a ética prevalece sobre a corrupção. Uma utopia. República, transliterado do grego, Politéia, deu nome a uma das ações da Policia Federal na Operação Lava-Jato a qual, ao que parece, não é nenhuma utopia.
Na República Romana ditador era um alto magistrado nomeado em caso de extremo perigo – ameaças internas ou externas – para assegurar, entre outros deveres, as assembleias e as eleições. Cícero, filósofo e também político romano, estabeleceu as bases da estrutura do estado republicano: o povo, o senado e os magistrados. Os três poderes.
Como se sabe, mesmo assim, a República não se sustentou. Julio Cesar atravessou o Rubicão, tornou-se um ditador absoluto, criou o calendário Juliano na ainda Republica Romana, foi assassinado e o governo constitucional republicano acabou dando lugar ao Império.
Não creio na sinceridade, na honestidade, na ética, que dá fundamento a moral exclusivamente pela razão, dos homens animais políticos de Aristóteles. Nós, os cidadãos, cujo conceito aristotélico varia de acordo com o tipo de governo, não somos aqueles que têm o poder executivo, legislativo e judiciário. Não nesse modelo de democracia participativa, nessa república presidencialista representativa.
O poder jamais em toda a história política da humanidade foi exercido pelo cidadão, pelo povo. Não creio em solução para questões políticas adotadas pela razão pelo simples motivo que isso nunca aconteceu e o fazer política é por interesses pessoais e dos grupos que financiam as disputas dos candidatos. Sempre foi melhor ir à guerra – que Proudhon e Tolstoi acreditavam ter sua origem não nas decisões dos políticos e militares, mas na psique social - do que ceder, concordar em parte, abrir mão do que possui em nome da harmonia e do bem comum.
Nos Estados onde a democracia é representativa o eleitor apenas vota e nas democracias participativas também. Entre as diferentes formas de democracia, nessas duas o que faz uma ser diferente da outra é que numa – representativa – escolhemos, como eleitores, quem vai nos representar decidindo por nós, ao contrário da participativa quando decidimos sobre questões de nosso próprio interesse. Isso foi feito em alguns governos municipais do PT e não funcionou, nem poderia. Não foi vencida a alienação dos eleitores.
As informações que o eleitor tem em nosso sistema eleitoral, pode ajudá-lo a ter opiniões e a mudar de opinião se receber mais informações que de a ele uma base com critérios racionais. Mas decidir exige mais do que ter opinião e informação. Votar requer tomar decisões sobre problemas e questões propostas pelos candidatos; isso exige, além de conhecimento, a capacidade de entender o problema, compreender as soluções possíveis e os riscos contidos nela. Isso exige racionalidade, pois sem ela as decisões não se realizam. Tudo requer exigências.
Portanto participando aprende-se apenas a participar mais nunca a decidir. E decidir pressupõe entender os mecanismos do processo decisório do qual se participa além de se ter a capacidade – falo dos eleitores em geral, sem divisões elitistas, de classes sociais e culturais e econômicas –de compreender para o que serve a política. E, principalmente, assim eu entendo, por que é necessário algum tipo de contribuição para que a política cumpra seus fins, seja mantendo a sociedade que hoje temos ou transformando-a na sociedade que queremos. São vinte e cinco séculos de fórmulas políticas e ainda não encontramos a que melhor nos convém.
Carlos Heitor Cony há muitos anos perguntou a Jean-Paul Sartre; porque você não se suicidou aos 35 anos? A pergunta estava dentro de um contesto que não importa nesse texto. Pois dia desses, aos 89 anos de idade, o mestre respondeu a pergunta de Geneton Morais Neto: “se você fosse criança o que perguntaria para um adulto?”, que seria a mesma que fez a Sartre. “O que é que eu estou fazendo aqui?”
Sem essa tranquila e segura resposta e sem ter a importância dele, pelo que ele com sua obra representam, já me fiz a mesma pergunta várias vezes, sem encontrá-la. Assim, sem resposta, me sinto nu com uma lanterna vagando de livro em livro.