A MORTE DO GAROTO NA PRAIA - ATÉ ONDE VAI A NOSSA HIPOCRISIA?

Onde fica o Éden? O livro de Gênesis, capítulo figurativo das culturas cristã e judaica, descreve o Jardim do Éden como sendo um lugar criado por Deus, onde o homem viveria bem, sem problemas e até sem trabalhar. Lá, ele podia comer todos os frutos da terra, exceto o que havia na árvore do conhecimento, pois nessa árvore, havia frutos do bem e do mal; e quando essa exigência foi desobedecida, caiu sobre a Terra uma desgraça que deu início ao inferno terreno; e logo de cara, pela minha interpretação, por ciúmes da mãe ou cobiça material, Caim matou seu irmão; e o que era inferno ficou ainda pior; e foi criado o primeiro cemitério, que eu atribuo o rótulo de Campos Elísios.

Eu acho que no momento em que Caim golpeou seu irmão Abel, tudo de ruim de formou de uma só vez. Foram criadas as nações, os limites territoriais de cada povo, o roubo, a corrupção, a fome, as constituições nacionalistas e dizem que até o PT foi criado por Caim; e desse ponto até hoje, desde a mais antiga escrita já decifrada, o Mundo nunca foi tão avarento, tão somítico e tão desumano...!

Parafraseando Martin Luther King, afirmo que o homem aprendeu tudo. Conseguiu aprender a andar, cozinhar, se virar, voar, enfim; ele aprendeu tudo que podia, exceto enxergar seu semelhante como irmão. E digo mais: se por ventura o homem conseguir enxergar outra pessoa como Irmão, via de regra é uma visão abstrusa, de pura aplicação do emprego da oportunidade; pois quando ele não mais precisar daquele irmão, é fato que ele passe a ignorá-lo!

Ainda lá em Gênesis, o Éden era divido por quatro rios; e se presume que desde que a Terra é Terra por formação divinal, os limites eram naturais e harmônicos; e o homem era livre para visitar qualquer uma das margens dos rios Ghion, Pison, Tigre e o Eufrates; e cada uma dessas margens havia em abundância tudo que todos os homens precisavam; mas com a criação da disgra, todos quiseram habitar as margens do Pison, pois lá havia ouro puro; e em sendo assim, nascia o Poder; quando o mais forte de todos os homens descobriu que podia ter todos os outros aos seus pés; e ainda, confrontar o Poder de Deus!

Quando o homem descobriu que quanto mais Poder ele tivesse, mais escravos teria para fortalece-lo, o pior dos infernos poderia ser considerado melhor do que a Terra. Aqui se mata por nada e se escravizam pessoas por sadismo. Gastamos tempo e fortunas para desenvolvermos armas, mas não damos a mínima para melhorar nossa condição de vida. Gastamos milhões em segurança, mas não aceitamos gastar 1 centavo na preservação da natureza. Ficamos anos e anos para descobrir a cura da Aids e não hesitamos um segundo para transar sem camisinha ou nos drogar com uma agulha de reuso.

Choramos quando assistimos uma imagem no You Tube de um mendigo recebendo comida de um estranho e nos mesmo dia jogamos milhares de toneladas de comida na lata do lixo. Nos emocionamos no Natal após apelo da TV para a consciência de humanidade; e no dia 26 esquecemos tudo que nos emocionou e essa amnésia dura até o dia 23 de dezembro seguinte.

Lembramos de dar o presentinho da mamãe no dia das mães; o mimo do papai no dia dos pais; e o brinquedinho sem serventia no dia das crianças; e tudo isso para mostrarmos que somos generosos e politicamente corretos com o comércio; mas no restante do ano, maltratamos nossos pais e nossos filhos.

Desejamos o tempo inteiro que o Sol brilhe só para nós para que nossas mais diversas lavouras sejam as melhores; e quando eventualmente o calor fica um pouco mais excessivo, pedimos a Deus para o sol se retirar, pouco importa qual lavoura ele irá queimar.

Dançamos para pedir a chuva, o acasalamento, a bonança e o Carnaval, mas jamais nos lembramos de bailar em agradecimento a nada de bom que tenha ocorrido em nossas vidas. Sim, porque somente diante da miséria é que evocamos a Deus; a bonança não é coisa de Deus, mas fruto de nosso esforço...

Agora o mundo chora por Aylan Kurdi, de 3 anos, afogado após naufrágio em praia na Turquia, mas ninguém está chorando pelo garotinho morto na praia; o mundo está chorando pela imagem que a TV veiculou e pelos apelos dos apresentadores midiáticos. Aylan é o símbolo de todo o excedente do Éden. Seu irmão de 5 anos e sua mãe, também morreram na mesma tragédia; e morreram porque pretenderam sair do inferno para tentarem uma vida menos desgraçada no Éden eleito por eles, a Europa, a parte do ouro puro descrita na história do Jardim do Éden; e quem conhece um pouco de mitologia sabe; Europa foi sequestrada por Zeus; e hoje em dia, quem assumiu a forma de Zeus, não quer dividir a Europa com mais ninguém...

Aylan Kurdi morreu de forma trágica como milhares e milhares de crianças que morrem todos os dias mundo a fora, inclusive no Brasil. Todo tipo de gente pobre, onde quer que vivam, morrerá das piores desgraças inventadas pelo homem; os mesmo que desejam ter o Jardim do Éden somente para eles.

Na África negra, em muitas nações, crianças são escravas e servem exatamente como há mil anos atrás, como moeda. Na Ásia, em muitos países, crianças são objetos sexuais dos sádicos; e nas Américas, crianças são violentadas e expostas a pior miséria, inclusive, muitas vezes fazendo o papel que os pais não puderam fazer: botar comida na mesa. Mas essas crianças, por mais que sejam divulgadas, ninguém chora por elas. Você e todos nós sabemos onde elas estão e quem são elas, mas isso não é um problema nosso. Politicamente correto e midiático é chorar por Aylan, porque dá Ibope no Facebook...

Até onde vai a nossa hipocrisia? Até onde vai parar a nossa falsidade de tentar comover o próximo sem que tenhamos um pingo de vergonha pela mentira que contamos?

Não nascemos pérfidos ou enganadores, mas exercemos isso como forma exclusiva de adquirirmos aquilo que todos os influentes têm: PODER! O ato de nos comover em público, sem que nada de concreto façamos para mudar qualquer situação em que se encontre o homem sem sorte, somente serve para tentar mostrarmos uma face de coitadinhos; que temos “coração puro”, mas na verdade, aprendemos a ser políticos, pois só falamos e nunca agimos.

Vi outro dia pela TV a Premier alemã dizer que irá permitir quase 1 milhão de refugiados em seu país e assumir um gasto de milhões de Euros para tal ação, enquanto a Rainha Elizabeth não quer ninguém dessa gente na Inglaterra; e no meu ponto de vista ambas estão equivocadas. Primeiro que permitir 1 milhão de miseráveis na Alemanha não quer dizer nada, pois serão 1 milhão de segregados descriminados pelos filhos de Hitler; e depois, o gesto elizabetiano, muito embora o seja verdadeiro, apenas mostra o que o Mundo rico pensa sobre quem precisa dele.

Lembram da orientação do comandante a quem voa, para quando o avião despressurizar? Primeiro coloque a máscara em você, para depois ajudar quem está com você. Assim o é na Europa abastada, no Japão, Estados Unidos e na América endinheirada, inclusive no Brasil. Estes são os Jardins do Éden; e na iminência de ficar sem oxigênio, primeiro o meu; e tudo que hoje não é Éden, com certeza é pior do que inferno...

O Jardim do Éden deixou há milhares de anos de ser uma localização geográfica, para ser uma situação social; e como sempre o foi, negros, brancos e amarelos que forem indigentes; sobretudo os que estão fora do alcance de nossas vistas, esses serão sempre expelidos de qualquer contato com esse jardim imaginário que todos cultivam pensando ser o Éden moderno.

E não me venha com essa de que está comovido com a morte de Aylan Kurdi, porque é mentira. Se de fato o tivesse qualquer comoção com a morte de uma criança, você brasileiro tiraria seu glúteo sedentário da cadeira e iria imediatamente ajudar o Toinho, Joãozinho, Pedrinho, Aninha, Mariazinha; e tantas milhares de outras crianças que estão pertinho de você carentes de um punhado de farinha ou de algo que só se descobre que há no Natal: CARINHO!

Lembram daquela imagem forte da polícia húngara reprimindo um casal de refugiados nos trilhos do trem, quando mãe e filho recém-nascido foram jogados no chão e o pai foi preso? Não lembram? Ah tá! É que a imagem do Aylan morto ocorreu no dia seguinte e o mundo inteiro já esqueceu das outras imagens que também chocaram o planeta; e amanhã, quando uma nova cena comovente acontecer, será a vez do pobre Aylan ser esquecido por nós...

Que o Grande Arquiteto do Universo me perdoe, se escrevo o que não discirno, mas eu não sei o que seria pior para aquele garoto: morrer ou virar mais um objeto nas mãos dos Senhores do Universo...!

Carlos Henrique Mascarenhas Pires

CHaMP Brasil
Enviado por CHaMP Brasil em 04/09/2015
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