O SER HUMANO ACIMA DE TUDO INSENSÍVEL E HIPÓCRITA

O SER HUMANO ACIMA DE TUDO UM INSENSÍVEL E UM HIPÓCRITA

A Terra é um planeta violento sob todas as formas. Ela em si mesma já é violenta, com suas catástrofes naturais: furações, terremotos, erupções vulcânicas, tempestades... No reino dos animais ditos irracionais a violência impera, geralmente, na busca por alimento e pelo acasalamento. No humano a violência é gratuita.

Temos violência por fanatismo religioso, por irracionalidade de torcidas de times; tráfico de drogas; roubos; assassinatos por discussões banais e muitos e muitos outros casos, como guerras pelo poder, quando milhares e milhares de pessoas são sacrificadas somente para satisfação de uns poucos.

Porém o que chama mais atenção é banalização da violência e a insensibilidade das pessoas. No feriado de fim de ano foi triste ver na televisão, pessoas serem arrastadas de dentro de seus veículos por marginais, e os motoristas que passavam ao largo desviarem o caminho sem prestar auxilio aos assaltados.

Numa das filmagens, vemos um sujeito puxando uma pessoa de dentro do veículo, com o corpo dentro do carro e as pernas fora. Um motorista tenta sair detrás do veículo assaltado, e neste ato poderia ter passado por cima das pernas do assaltante para ajudar a vítima. Para não correr riscos, se omitiu. Com medo dos assaltantes e da “justiça”. Tal atitude é inaceitável. A pessoa que agiu desta forma não pensa nem nela. Se pensasse, teria ajudado a vítima atropelando o assaltante, pois a amanhã ela poderia estar naquela mesma situação e alguém poderia socorrê-lo também.

Mas solidariedade não é matéria-prima brasileira. O brasileiro, hipocritamente, vive nas igrejas, rezando e pregando o bem, assim como faz nas redes sociais, mas na realidade não tem qualquer resquício de solidariedade ou de amor ao próximo.

Digo isso, para narrar um fato que presencie há poucos dias, para mostrar todo nosso desprezo pela vida humana.

Aqui em Fortaleza, na rua 28 de Setembro, no bairro da Varjota, tem uma birosca que vende excelente espetinho de carne de boi, de frango e de porco. A frequência é grande e muito boa, embora o espetinho seja relativamente caro R$10,00, o de picanha. A cerveja é geladíssima. Os alunos da Faculdade Farias Brito, da Dom Luís, sempre estão por lá. O cantor Bartô Galeno é freguês assíduo. E o ambiente é relativamente tranquilo.

Terça-feira, 6 de janeiro de 2015, fui até lá para tomar uma cerveja e comer um churrasquinho. Quando cheguei vi uma viatura da Polícia estacionada na contramão e achei estranho. Mesmo assim desci do carro e quando me aproximei notei que do lado que entrei, as mesas estavam todas arrumadas.

O garçom, do outro lado, me viu e veio falar comigo.

Perguntei-lhe o quê estava ocorrendo, pensando em assalto. Ele explicou que um cidadão estava comendo espetinho; e assim que acabou de comer caiu por cima da mesa. Tentaram levantá-lo, como não conseguiram e ele não tornou, chamaram o SAMU, que ao chegar encontrou o cidadão morto. Em princípio, ataque cardíaco fulminante. Mas como a morte ocorrera em via pública, era necessária a presença do pessoal do Instituto Médico Legal para analisar a causa da morte.

A família do morto já estava no local e o cadáver jazia no chão da calçada, ao lado da churrasqueira e perto da entrada de birosca, coberto com um lençol branco.

O garçom perguntou se eu queria uma mesa do outro lado. Respondi que não; ia embora para outro local.

Ao lado do cadáver, na rua lateral, já que o espetinho fica na esquina, as pessoas continuavam comendo e bebendo tranquilamente, como se nada tivesse acontecido.

Os donos da birosca, mais insensíveis ainda, atendiam sem o menor constrangimento os pedidos dos fregueses, como se ali no chão estivesse somente o lençol e não um ser humano que morrera justamente naquele local.

Quem permaneceu ali, amanhã ou depois estará nas igrejas rezando fervorosamente, mostrando toda sua hipocrisia para os amigos, dizendo para a sociedade que é um cristão preocupado com o mundo e com a paz e postando nas redes sociais mensagens de amor, carinho, fé e fraternidade.

HENRIQUE CÉSAR PINHEIRO

FORTALEZA, JANEIRO DE 2015.