O Brasil sobre rodas
A cena se repete a cada safra e mostra a verdadeira face de um problema ainda sem solução. As filas de caminhões aguardando desembarque nos portos do país aumentam proporcionalmente aos números recordes de produção de grãos. O inevitável congestionamento de veículos de carga nas proximidades dos locais de embarque acontece há muito tempo, sem que os órgãos responsáveis tomem qualquer medida para (pelo menos) minimizar os efeitos danosos dessa concentração dispendiosa. Alguns portos adotam determinados procedimentos que antecedem o deslocamento dos caminhões, com o intuito de agilizar o escoamento da safra. No chamado sistema de carga on-line, o gerenciamento do fluxo de veículos estabelece quotas diárias de recebimento de caminhões e vagões para cada terminal de operação. A carga é cadastrada ainda na origem e o caminhão só é liberado para seguir viagem quando há espaço nos armazéns dos portos. Esse procedimento não é regra geral, obrigando muitos motoristas a permanecerem às margens das rodovias por tempo indeterminado e em condições precárias, sem alimentação nem higiene adequadas. Enquanto isso, dezenas de navios aguardam para atracar, fazendo das tarifas portuárias brasileiras as mais caras do mundo.
O gargalo da logística no país tem causa conhecida. Privilegiou-se o transporte rodoviário em detrimento de meios mais seguros e baratos, como ferrovias e hidrovias. O Brasil caminha na contramão da tendência mundial, ao estimular o transporte por via terrestre. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais, 55% da soja produzida no Brasil é movimentada em caminhões; 35% por ferrovias e apenas 10% por hidrovias. Alguns fatores contribuíram para o agravamento da situação atual. As montadoras de caminhões passaram a produzir veículos mais modernos, econômicos e potentes, com maior capacidade de carga. Em sintonia com a demanda por crédito os agentes financeiros destinaram vultosos recursos direcionados ao segmento dos transportes. Apesar dos resultados expressivos na comercialização de veículos de carga, a frota brasileira que ultrapassa 1,43 milhões de caminhões é antiga e obsoleta (com uma média de nove anos), enquanto que as rodovias não oferecem condições ideais para a circulação segura de veículos, mesmo em trechos pedagiados (e suas tarifas extorsivas). O resultado não poderia ser outro: o excesso de caminhões causa transtornos imensos, congestionando vias, provocando acidentes e diminuindo consideravelmente a vida útil da malha viária.
A situação das principais rodovias brasileiras é um capítulo à parte. Em todos os estados existem problemas graves e praticamente insolúveis, diante da inércia administrativa atual. Algumas rodovias federais e estaduais estão em péssimo estado de conservação. Em sua grande maioria carecem de acostamentos, terceiras faixas, sinalização adequada e apresentam uma série de outras irregularidades que colocam em risco a segurança dos usuários. As causas da deterioração das rodovias têm motivos diferentes e conhecidos, mas de difícil solução: a base do pavimento mal elaborada, a baixa qualidade do material empregado, o excesso de peso dos veículos e principalmente a falta de manutenção. Pelo mundo afora as rodovias têm uma durabilidade mínima de 20 anos ou mais. Enquanto nossos governantes persistirem na construção de rodovias do tipo “casca de ovo”, a situação dificilmente se reverterá.
Paralelamente aos investimentos na malha viária, o setor portuário brasileiro espera por aportes consistentes e duradouros. Os equipamentos de carregamento dos portos são antigos e ultrapassados, com suas atividades interrompidas em épocas chuvosas. As autoridades da área de infraestrutura têm a responsabilidade em mudar a situação atual, sob o risco de o Brasil manter-se à margem dos países emergentes. Somente com um trabalho sério em prol da modernidade e do desenvolvimento poder-se-á um dia, mudar para melhor as perspectivas do futuro. Que definitivamente, não viajam sobre rodas.