G Ê N I O

FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR

O conhecimento torna a alma jovem e diminui a amargura da velhice. Colhe, pois, a sabedoria. Armazena suavidade para o amanhã.

Leonardo da Vinci

Quando falamos de “gênio”, lembramos logo das estórias¹ de trancoso, como por exemplo: a da gata borralheira, de Branca de Neves e os Sete Anões, de Aladim e lâmpada maravilhosa, estórias de Camões, estórias de João Grilo, a mula sem cabeça, etc. No passado não era difícil se encontrar pais, mães e pessoas que trabalhavam nas casas de pessoas relativamente bem de vida, chamadas de ricas e/ou ricaças, tanto na zona urbana, quanto na zona rural, que passavam horas e horas contando suas estórias de trancoso para a meninada ouvir. Aprendíamos muitas coisas através de tais ensinamentos orais, geralmente contadas para fazer as crianças passar tempo e dormir. A televisão e o rádio já existiam, porém, as crianças tinham que dormirem cedo para no outro dia irem para a escola para aprenderem o “bê à bá”, caso contrário iriam perder o horário de irem para a escola. Nesta época, final da década de 50 e inicio da década de 60 do século XX, a escola tinha horário de entrar, horário de recreio e horário de sair, no sentido de terminar as aulas em cada turno. Na escola os alunos entravam primeiro que os professores e os aguardavam de pé e em silêncio. A cátedra era respeitada como se fosse os nossos próprios pais. Os pais davam plena atribuição para lhes representar na disciplina e no ensinamento a sua prole no ambiente escolar. Era assim mesmo, a família tinha respeito pelos professores de seus filhos e assim sendo, os professores não eram chamados de mentirosos e muito menos de pessoas sem compromissos com o futuro de seus filhos, como acontece atualmente, com raras exceções. Assim o professor não era Deus, porém, obrava milagres, porque tinham pais que diziam, se “Fulano” não aprender a lê a escrever com o professor “Beltrano” de tal, não vai mais aprender com ninguém. O que não se deixa parecer com uma estória da carochinha e/ou de trancoso, não é mesmo? Porém, nesse tempo de comprometimento da família com a escola, via seus professores, surgiram com o passar dos tempos, verdadeiros gênios da literatura e de todas as áreas do conhecimento, em termos nacionais e internacionais. Aqui, no caso brasileiro, ainda não existia o Estatuto da Criança e do Adolescente que proíbe que os pais disciplinem moderadamente os seus filhos, bem como proíbe que os filhos ajudem seus pais em pequenos serviços domésticos. Não estamos defendendo que os pais tenham que obrigar forçosamente que seus filhos menores executem trabalhos forçados e destinados a gente adulta, pelo contrário, estamos defendendo que se a família é o primeiro laboratório escolar, porque os filhos não podem aprender a fazer os serviços domésticos e empresariais com suas famílias? Onde está o pecado original da condenação suprema que condenará os pais a não entrarem no paraíso por levar seus filhos para seu ambiente de trabalho para ajudá-los? Achamos que o Poder do Estado, que não educa e nem garante felicidade plena a ninguém, destruiu a autoridade paterna e materna em cada família, ao criar tal legislação desobrigando os pais de encaminharem os filhos para a atividade laboral familiar. Assim sendo, surgiu à geração do boné, das gírias, da ociosidade, que não são meras estórias de trancoso e sim o vestibular do fracasso na vida adulta. E o analfabetismo vem ganhando no seio dessa geração do “boné”, em termos de quantidade e de qualidade educacional, onde o sonho de uma colação de grau é substituído por drogas lícitas e ilícitas, onde o dia da formatura é igualmente substituído pelo dia da apreensão e internação em casas de recuperação para menores em risco social e/ou de velórios intermináveis no campo e na cidade, onde os jovens de ambos os sexos não chegam a completar dezoito anos de idade. Tudo por falta de comprometimento das familiares para com seus filhos dentro e fora de casa, diante da imposição da legislação imposta pelo Estado Brasileiro. A ociosidade não fábrica gênios e sim futuros marginais aos olhos do Estado Soberano.

Em lendo as “Meditações”, publicadas em 1641, de Descartes, temos ciência e conhecimento próprio da ficção por ele criada que chamou de “gênio maligno” e por fim encontramos atrás de um cargo tal pensador, ao citar: "Suporei que...certo gênio maligno de enorme poder e astúcia tenha empregado todas as suas energias para enganar-me. Pensarei que o céu, o ar, a terra, as cores, as figuras, os sons e todas as coisas exteriores são meras ilusões de sonhos por ele concebidos com a finalidade de enlear-me o juízo". E isso é um fato observável, ainda que por analogia nos dias atuais, entre nós, tamanha é a sua genialidade ficcional na criação literária visando o poder do convencimento pela intelectualidade e dualidade, que envolve o ser e o ter, tudo porque no século XVII, época em que esse gênio viveu, os cargos públicos na Europa e de modo específico na Francesa, eram colocados à venda e era vendido ao preço do mercado. Tanto é assim que em 1625, Descartes tentou comprar o cargo de oficial de justiça, na região de Châtelleraut, sua terra natal, tendo desistindo por não sentir-se seguro em seus conhecimentos jurídicos, preferindo a viver dos bens herdados de sua mãe e ao ócio produtivo².

Ante o exposto, o termo gênio, que vem o latim “genius”, que originalmente designava, segundo as estórias de trancoso, que no nosso mundo e/ou ambiente familiar e/ou escolar são representados pelas as Alices de Joventino, as Ritas Vieira, as Zefinhas Boi, as Celestinas de Burinete, as Doras de Muriçocas, as Marias de Anália, as Irenes dos Velho Praia, as Socorro de Fofó, as Biá de Bia Lopes, As Suzana de Santana, as Severina de Holanda Cavalcanti, os Severo Rodrigues, os Francisco Baiá, os Luiz Soares, as Daura do Liceu, etc., nos contavam quando crianças, já não existem mais, inclusive nas escolas se sentem a falta de tais profissionais, desde a educação infantil ao ensino fundamental e médio. Essa gente era formada com o compromisso doméstico e/ou pedagógico de educar para a vida nossas crianças e jovens. As estórias de trancoso, vem assim ao longo dos tempos sendo substituídas por estórias de assassinatos nas grandes e pequenas cidades, que envolvem gente que a criançada e a juventude conhece em sua vizinhança, tanto nos bairros tidos como ricos, ricaços e nas comunidades periféricas pelo Brasil e pelo mundo afora, tendo como palco transmissor das informações diárias, no momento de cada acontecimento macabro: a televisão, o rádio, a internet e seus derivados, aqui compreendidos como meios de forma e desinformar crianças e adolescentes no espetáculo de que tudo é muito fácil de ser conseguido e praticado, tem hora que tais meios de comunicação proíbem indiretamente que crianças e adolescente deixem de sonhar com dias melhores no futuro. O lado negativo é maior do que o lado positivo, tamanho é o despreparo da família e da escola para educar tais crianças e adolescentes no seu dia-a-dia, onde feio é perder e bonito é ganhar tudo, conforme ensina a televisão, o rádio e a internet, em suas mídias massificadoras. Tudo ficou muito fácil, o mundo está nas mãos por um clic de qualquer criança e/ou jovem, através de um aparelho de celular, que em vez de ser usado para melhor aprender os bons costumes, serve para ingressar no mundo das drogas e demais ilicitudes penais. A política de futuro para tais crianças e jovens, segundo tal orientação, parece mais com o que costumamos chamar de terra queimada, arrasada e/ou destruída. Nada tem a haver tais estórias e/ou história da vida real, que não é a estória de trancoso, a ficção criada e contada para crianças, jovens e adultos, usada pelo personagem Camões³, quando cita que “[...] O rei disse para Camões, ouça o que vou lhe dizer, eu tenho 30 perguntas para você responder, se faltar uma das tais sem recurso vai morrer [...]”. E a criançada caia na gargalhada, viajava no tempo e no espaço e até pegava no sono e só acordaria no outro dia perguntando onde mesmo a estória de Camões tinha terminado, aí os pais, as mães, as amas e demais serviçais da casa, diziam que a estória de ontem terminou assim: “[...] Camões respondeu ao rei, seu trabalho é complicado, porém o senhor comigo, vai tomar o bonde errado, faça lá suas perguntas, que estou um pouco vexado”. Outra vez a criançada ia ao delírio na gargalhada. E assim o tempo passava e a criançada crescia, tornava-se adolescente e adulto responsável por seus atos pessoais, familiares e profissionais. É muito diferente da tipologia atual que conhecemos sobre infância e juventude, responsáveis pelo futuro de nossas famílias e de nossa nacionalidade. Sim, com raras exceções, ainda temos famílias e escolas, onde seus compromissos são verdadeiros no tocante ao planejamento, a execução e a avaliação de seus alunos em qualquer nível de ensino. Isso é uma raridade entre nós.

Então podemos sem sombra de dúvidas, afirmar de que o termo “genius”, de origem latina e que designava anteriormente como sendo seres imaginários, espíritos bons que presidiam ao destino de cada homem na face da terra. O que não deixa de ser uma estória de trancoso, uma lenda em qualquer nacionalidade existente em qualquer tempo e lugar, porque é uma ficção, não tem qualquer relação com o fato real de nossa história vital, apesar de muitas vezes o fato histórico é confundido com a ficção, criação do autor e/ou do povo. O certo é que a educação familiar, assim como a educação estatal funcionava com tais fundamentos e/ou pilares e dava certo em certos casos. Temos como exemplo disso, o caso da mitologia romana, onde os gênios eram a representação primitiva do ciclo vital, sem portanto, se confundirem como os próprios deuses, embora fossem objeto de culto, uma espécie de civismo obrigatório, assim como o Brasil presta homenagem a Tiradentes, e a tantos outros vultos nacionais e igualmente importantes para nossa historicidade brasileira. Não por acaso, convidamos o cientista Isaac Newton que nos informa que “deve-se aprender sempre, até mesmo com um inimigo” e continua fazendo sua preleção genial ao citar “eu consigo calcular o movimento dos corpos celestiais, mas não a loucura das pessoas” e nos adverte que “a gravidade explica os movimentos dos planetas, mas não pode explicar quem colocou os planetas em movimento. Deus governa todas as coisas e sabe tudo que é ou que pode ser feito”. É real para nós a presença da teoria criacionista em Deus, tendo em vista a falta de qualquer explicação ao contrário sobre tudo foi criado e continua presente ainda na atualidade mundial.

Com o decorrer dos tempos, o termo “genius”, na Roma antiga, passou a ter duas significações a saber: 1º) o perfil, índole e/ou temperamento, onde leva o individuo a ser considerado como tendo bom e/ou mau gênio, desde que seja cordato, pacífico e/ou irritadiço e/ou agressivo, não necessariamente louco e/ou portador de crise existencial emocional; 2º) o perfil do individuo aqui é o da intelectualidade, grau elevadíssimo de inteligência, tendo como base especifica a sua capacidade criadora, algo diferente dos demais. Assim entendemos de que o indivíduo pode ser considerado um gênio quando renova sempre de forma e/ou de maneira imprevisível a marcha, sabe fazer o tempo em o fato e/ou coisa e/ou caminho, a pesquisa das ciências, das letras, das artes, da própria vida deve mudar, etc. Disso não temos dúvidas de que um indivíduo é considerado “gênio”, por ser e/ou ter dom natural, individual e único, para tanto se exige condições sociais, familiares, estatais, educacionais, políticas públicas em gerais, investimentos, compromissos, planejamentos, execuções e avaliações permanentes para garantir as crianças, jovens e adultos sua plena eclosão em termos de genialidade para motivar e despertar o novo, sem isso nada feito, porque a educação reprodutora dos costumes corruptos de nosso tempo não aceita pensar e fazer diferente nos três níveis de governos: federal, estadual e municipal, vivemos crises existenciais e emocionais em nossa própria brasilidade, tamanha é a nossa fraqueza enquanto país e quiçá, nacionalidade, portanto, isso equivale dizer que a educação crítica e transformadora, é o único caminho capaz de quebrar o paradigma do velho em busca de novos modelos educacionais e de mundo que tanto sonhamos. Pensarmos em educação reprodutora é o mesmo que voltar no tempo e no espaço vivenciado por Camões e o Rei, quando cita: “[...] o rei disse para Camões: tu é um menino novo, vou fazer-te uma pergunta, aqui perante ao povo: qual é o bom da galinha? Camões respondeu o ovo.” E o tempo passou quando “com um ano e quatro meses, num dia de carnaval, o rei encontrou Camões e perguntou afinal Camões me diga com que? Camões respondeu com sal; O rei gritou ora bolas...”. E não é que John Lennon tem razão quando nos diz: “Quando tinha 12 anos, pensava que era um gênio e que ninguém tinha reparado. Se os gênios existirem, eu sou um, e se não existirem, não quero saber”. Jamais haverá educação de qualidade com famílias, escolas e professores descomprometidos com a missão de educar para a vida crianças, adolescentes e adultos.

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¹ Cf.: O significado do termo “estória” de João Ribeiro (Membro da Academia Brasileira de Letras). In.: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Est%C3%B3ria >. Página visitada em, 24/05/2015.

² Cf.: História por Voltaire Schilling. In,: < http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/descartes_genio.htm . Página visita em, 24/05/2015.

3 Cf.: Baseado na literatura de Cordel: As perguntas do Rei e as Respostas de Camões, de Severino G. de Oliveira. In.: < http://estoriasdecamoes.blogspot.com.br/2006/09/primeira-pergunta-do-rei-cames.html > . Página visitada em, 24/05/2015.

FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR
Enviado por FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR em 24/05/2015
Reeditado em 24/05/2015
Código do texto: T5253158
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