O ministério da direção espiritual (VI Parte)
A relação do dirigido com o diretor espiritual
Qual deve ser a relação a ser estabelecida entre o dirigido e o diretor espiritual? De antemão vale lembrar que a direção espiritual não é apenas um desabafo ou uma conversa informal. Mas trata-se de um diálogo franco, aberto e com um claro objetivo: o crescimento espiritual do dirigido. Na direção espiritual não podemos considerar apenas a dimensão sobrenatural que envolve este ministério; é, também, um desabrochar de um relacionamento entre duas pessoas humanas e situadas dentro de um contexto também humano, movidos pela fé e desejosas de alcançar a plenitude da vivência cristã.
Deus sempre fala à pessoa humana utilizando sempre uma mediação também humana. O diretor espiritual, antes de tudo, deve ser uma pessoa aberta ao relacionamento humano e com Deus. Sua fé e sua experiência de Deus lhe outorgará o caminho do bom entendimento na ajuda humana e sobrenatural aos que lhe procurarem para a direção espiritual. Ele, por graça de Deus, realiza essa maravilhosa mediação.
Igualmente, o dirigido deve possuir largueza de alma e um profundo desejo de se relacionar e se abrir cada vez mais aos caminhos de Deus. A escuta e a capacidade de ruminar as admoestações em vista do pleno amadurecimento. Como já aludimos em artigos anteriores, além da Palavra de Deus e da Oração, não se descarta neste processo interativo entre dirigido e diretor espiritual a iluminação do instrumental de análise e de interpretação fornecidos pelas ciências do comportamento.
Considero importante que o dirigido possua simpatia pelo diretor espiritual e, sobretudo, muita confiança. Deve considerar a direção espiritual um espaço de muita liberdade onde tudo possa ser partilhado, sem receios e sem arrodeios.
O dirigido deve rezar pelo seu diretor espiritual, comungar na intenção dele. Por ser uma pessoa humana, necessita da graça divina para instruir adequadamente o dirigido. Creio que esta solidariedade na oração ajuda muito o processo de amadurecimento na direção.
A direção deve obedecer ao movimento cadencial do crescimento constante. Não pode ser um processo fechado ou repetitivo; a cada etapa elementos novos devem ser visualizados de tal modo que favoreça o amadurecimento do dirigido e a elaboração de seu itinerário de fé e vivência humana.
Quando o dirigido perceber que a direção não está rendendo e o esforço está sendo em vão, deve fazer uma avaliação com o diretor espiritual. Em certos casos, aconselha-se mudar de diretor. Se não houver sintonia e a abertura se tornar impossível, a mudança pode ser de todo benéfica. Lembro que a mudança de diretor espiritual deve ser discutida com o próprio diretor. Uma mudança que não obedeça o caminho da caridade, fere o bom senso moral e ético, alem de depor contra o próprio dirigido, principalmente se este faz parte de um seminário, instituto ou congregação religiosa.
Não é de se estranhar que o dirigido tenha que, em certos casos, questionar o seu diretor. Acontece que o acúmulo de trabalho ou o exagerado número de dirigidos, poderá impedir o diretor de estabelecer uma meta para o seu dirigido. Nesse caso, é lógico que a direção se torne efandonha e o resultado será o esfriamento do caminho de crescimento do dirigido. Contudo, deve-se levar em conta as condições humanas do diretor, sobretudo se tratar de um padre cansado e sobressaltado pelo acúmulo de serviços pastorais, o que não é novidade por esse imenso Brasil, onde os presbíteros ainda são uma espécie rara.
Mesmo que a direção espiritual possa ser uma exigência formal de uma casa de formação, seminário ou congregação religiosa, o que se requer do dirigido é a abertura total de sua alma. Todos sabemos da nocividade da mentira em todos os processos humanos; também na direção espiritual não poderia ser diferente. Quando o dirigido mente tudo cai por terra e a direção espiritual torna-se uma perda de tempo e um pecado.
A enganação na direção espiritual acarretará uma perca de tempo do diretor espiritual e a conseqüente derrocada espiritual do dirigido. Quando vejo na mídia ou através de outros meios as histórias desastradas de lideranças leigas, padres e religiosas, a primeira coisa que me vem à mente é que não foram verdadeiros na direção espiritual. Mentiram e falsearam uma vivência de aparências. Quem tem problemas ou é problemático, carregá-lo-ás por onde quer que vá.
O problema que se esconde na direção espiritual vai, mais cedo ou mais tarde, vir a tona e o descalabro é certeiro. O segredo está, repito, na abertura plena que brota da confiança que se estabelece, uma verdadeira resposta à ação do Espírito Santo. Vale ressaltar que o Espírito Santo é o nosso diretor espiritual interior. Ao ministro humano da direção espiritual cabe a perspicácia de auxiliar o dirigido à obediência ao ditames interior do Divino Consolador e Santificador.
No relacionamento dirigido/diretor, o dirigido não deve copiar o seu diretor. Há sempre o perigo de tornar-se uma fotocópia do diretor. O diretor mesmo deve ter o cuidado de não deixar que isso venha a ocorrer. O modelo será sempre Jesus Cristo. É para ele e, conseqüentemente, para suas virtudes, que o diretor deverá encaminhar o seu dirigido. Uma boa direção deve ser, antes de tudo, cristocêntrica. Aí está o grande sucesso da direção espiritual e a pujança de sua beleza.
Para o afeiçoamento a Cristo, o dirigido deverá cultivar em si o espírito de ovelha. A ovelha, ao contrário do bode, deixa-se pastorear e conduzir às boas pastagens. O bode, ao inverso, não aceita ser conduzido, pois traz em si a auto-suficiência e um espírito inquebrantável.
O dirigido deve se sentir como um bloco de mármore a ser trabalhado pelo cinzel do diretor espiritual que, paulatinamente, com o auxílio da Graça Divina, o ajudará a dilapidar as realidades pontiagudas que a vida velha lhe plasmou. A obediência é um grande dom, o próprio Cristo a testemunhou se fazendo obediente e dócil até a morte e morte de cruz (Fil. 2, 8). Na próxima reflexão vamos meditar sobre os caminhos práticos para uma direção espiritual fecunda e feliz.
Que Senhor faça próspero o caminho dos que trabalham na orientação espiritual, sendo verdadeiros pastores e intercessores. Igualmente, faça que cada dirigido possa, exemplo de Moisés, olhar para além do deserto, do deserto da própria vida e suas contradições e mergulhar nas águas profundas do amor do Coração de Jesus.
Pe. Adair José Guimarães