O ministério da direção espiritual (Parte III)
2. A aplicação ética no exercício da direção espiritual
Em nossos tempos se fala muito sobre a aplicação dos aspectos éticos e morais nos diversos setores da ação humana. No exercício do ministério da direção espiritual não podemos descartar a importância destes mesmos aspectos. Quem dirige espiritualmente uma pessoa tem sobre si o encargo do respeito ao dirigido e à sua história. A discrição e o sigilo garantem a abertura da pessoa durante a orientação, indispensável para o crescimento. Não se trata do mesmo nível imperativo do sigilo sacramental que resguarda o sacramento da confissão, mas não podemos dispensar menor importância ao sigilo da direção espiritual.
Por ser um momento de partilha, de busca de autoconhecimento para melhor seguir a vida espiritual, a pessoa dirigida precisa encontrar segurança na pessoa que lhe orientará. Quando partilhamos de nós mesmos a uma pessoa lhe outorgamos poder sobre nossa vida, pois a mesma passa a ser detentora de aspectos valiosos de nossa subjetividade; numa linguagem corriqueira dos jovens: “nos tem em suas mãos”.
O ministro da direção espiritual precisa ter clara consciência deste aspecto: a pessoa dirigida precisa ser respeitada em tudo que partilhar. Jamais usar de dados obtidos na direção espiritual para influenciar nos destinos da pessoa, sobretudo nas instituições da vida religiosa ou nos seminários.
Nos escrutinos dos conselhos decisórios e deliberativos sobre ordens ou votos religiosos em jogo, o diretor espiritual, por questão ética e de foro interno, não pode opinar sobre negativas de um dirigido. A jurisprudência canônica da Igreja prevê tal obrigação e, assim, resguarda a dignidade da pessoa e o valor da própria direção espiritual. O diretor pode, sim, agir decisivamente com o dirigido, morigerando-lhe a consciência no caso de opções vocacionais ou de estado de vida que o mesmo deve optar por uma tomada de rumo, mesmo que lhe custe.
Pratico este ministério há 15 anos. Tenho procurado orientar pessoas leigas, seminaristas, padres e religiosas. Posso atestar o quanto é edificante e ao mesmo tempo exigente e sério este ministério. Hoje fico feliz ao ver vários dirigidos que acompanhei na direção espiritual exercendo o sacerdócio com realismo de fé, outros como leigos atuantes em suas opções e religiosas que vivem sua consagração com tanta unção. Na verdade aprendi mais com eles do que propriamente ensinei.
Espero que algumas pessoas que lerão esta coluna possam despertar para este ministério ou mesmo busca-lo como meio de crescimento na fé. Centenas de milhares de pessoas necessitam de direção espiritual em nossas comunidades. O ministério da direção espiritual também é um pastoreio. A direção espiritual é uma espécie de pastoreio, onde o pastor vai, paulatinamente, a exemplo de Jesus, indicando o caminho para o amadurecimento da fé da ovelha. Para o ministério da direção espiritual vale lembrar que o crucial é: existem as ovelhas, mas faltam os pastores.
Nos seminários e casas de formação a direção espiritual é de certa forma obrigatória: os dirigidos têm que aceitar os diretores que lhes são propostos, salvo raras exceções. Eu mesmo vivi esta realidade ao longo dos meus sete anos de seminário. As vezes funciona, mas não poucas vezes a direção e mascarada por falta de empatia do dirigido para com o diretor ou vice-versa. Trata-se de um problema de percurso, pois na maioria das vezes não dispomos de pessoas aptas, disponíveis e qualificadas para o exercício desse ministério. Assim, muitas vezes o que sucede é o improviso ou, na verdade, o quebra-galho: pessoas incertas em lugares incertos.
Santa Tereza D’Avila era contundente em exigir a direção espiritual de suas filhas. Costumava dizer que no diretor espiritual lhe interessava mais a sabedoria do que a própria santidade. A grande reformadora do carmelo entendia que a direção espiritual objetiva só poderia advir de orientadores sábios que não ensinaria à suas filhas caminhos tortuosos ou marcados pela heresia, mesmo que empanados por expressões ou adereços de aparente santidade.
Oportunamente vamos falar do perigo de uma orientação espiritual errônea. Não precisa se assustar, mas existem pseudos orientadores que ao invés de conduzir as ovelhas aos bons prados, terminam por leva-las ao precipício do despenhadeiro.
Há uma enorme carência de pessoa que exerçam esse ministério. Pessoalmente sinto não poder auxiliar a tantos que me procuram por uma direção espiritual metódica e orgânica. As pessoas têm necessidade de serem acompanhadas na direção espiritual. Que tal você orar ao Senhor para lhe conceder esse dom? No próximo texto vamos falar como surge o bom orientador espiritual.
Pe. Adair José Guimarães