A EDUCAÇÃO E A HUMANIZAÇÃO NA ATUALIDADE

Educar para Humanizar? Humanizar para Educar?

COSTA, Irene Cristina dos Santos

RESUMO:

Este artigo refere-se ao processo de humanização da educação ou educação para a humanização refletindo, à luz das teorias afins, sobre alguns conceitos e aspectos dos processos educativos necessários para a aprendizagem no que tange à busca de melhorias na qualidade do ensino. O que, de certa forma, enseja em um olhar diferenciado para uma educação, de modo a torná-la uma ação prazerosa e qualificada, voltada para a humanização, uma vez que, segundo Paulo Freire e Rubem Alves, esta faz-se necessária na sala de aula e no dia a dia do relacionamento aluno/professor, de tal modo que desperte em ambos o desejo de aprender, de investigar as curiosidades do saber, visto que as respostas prontas já se encontram nos livros. Além disso, mediante os grandes avanços no que tange à evolução na Educação e seus processos de aprendizagem, destacando temas diversos como a importância da pedagogia, da filosofia e da psicanálise no processo de ensino/aprendizagem para a expressão da valorização do educando enquanto ser, e importante e interessante discutir as possibilidades de interfaces entre as áreas da Educação, da Filosofia e da Psicanálise no processo de educação/humanização do indivíduo, como um todo. Nesse propósito que se pretende desenvolver este artigo.

Palavras chave: Educação, Humanização, Educando, Interação, Cidadania,

INTRODUÇÃO:

Quando se fala em Educação, relacionando com Humanização, é importante lembrar, em linhas gerais que, nesse contexto tem-se a educação como processo de humanização em busca de transformar o homem a partir da apropriação de conhecimentos científicos e que foram produzidos intencionalmente pelo conjunto dos homens com uma finalidade específica de perpetuar tais conhecimentos às gerações mais novas, conhecer a técnica e dela se apropriar para produzir cultura e fazer história, no espaço e tempo em que se vive, dentro da comunidade.

Partindo desse pressuposto, a ideia é descortinar ao meandros da humanização na atualidade e, para tanto, pretende-se elencar e discutir as seguintes questões referentes ao tema: O que é Educar?, O que é Humanizar?, Educar para Humanizar ou Humanizar para Educar?, Qual a importância da humanização na educação para a vida em sociedade?. Para isso, far-se-á um passeio superficial sobre a teoria de Heidegger e Simondon, o pensamento de Paulo Freire e Rubem Alves, salientando o que for cabível ao contexto desse trabalho, partindo das contribuições teóricas de Freud e Lacan, articulando-as ao que tem sido produzido atualmente no campo educativo, ensejando na articulação sobre a teoria Friedrich Nietzsche e sua teoria da metamorfose.

DESENVOLVIMENTO:

Tomando como ponto inicial deste artigo a necessidade de entender o que é educação e humanização, para, consequentemente depois, relacionar ao contexto teórico estudado, será feita uma ligeira, mas não simplista, definição de o que é Educação e o que é Humanização:

Educação (do latim educations) - No sentido mais generalizado, é o meio em que os hábitos, costumes e valores de uma comunidade são transferidos de uma geração para a geração seguinte. Ela vai se formando através de situações presenciadas e experiências vividas por cada indivíduo ao longo da sua vida. Seu conceito engloba o nível de cortesia, delicadeza e civilidade demonstrada por um indivíduo e a sua capacidade de socialização.

No sentido técnico, a educação é o processo contínuo de desenvolvimento das faculdades físicas, intelectuais e morais do ser humano, a fim de melhor se integrar na sociedade ou no seu próprio grupo. No sentido formal é todo o processo contínuo de formação e ensino aprendizagem que faz parte do currículo dos estabelecimentos oficializados de ensino, sejam eles públicos ou privados.

Humanização - É um processo que pode ocorrer em várias áreas, como Ciências da Saúde, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Exatas, etc. Sempre que ocorre, a humanização cria condições melhores e mais humanas e implica a evolução do Homem, pois ele tenta aperfeiçoar as suas aptidões através da interação com o seu meio envolvente. Para cumprir essa tarefa, os indivíduos utilizam recursos e instrumentos como forma de auxílio. A comunicação é uma das ferramentas de grande importância na humanização, uma vez que (deduz-se), ela permite, a todos, acesso igual e irrestrito às informações .

Baseado nessas definições e, conforme se pode observar nos estudos realizados, se para o filósofo Martin Heidegger, a técnica não é a mesma coisa que a essência da técnica, mas diferem-se entre si, logo a técnica não pode ser considerada um ‘meio’, pode-se entrar no âmbito da essência da técnica e a alçar a ideia de que a técnica se fundamenta em uma instrumentalização do ser humano para a utilização dos objetos e apropriação dos saberes relacionados a eles.

Por outro lado, segundo o filósofo Gilbet Simondon, é possível estabelecer distinções entre esses campos e criar estudos que focalizam a gênese e a genealogia dos objetos técnicos e naturais, considerando ‘campo científico como o conjunto de leis criado para categorizar e sistematizar a natureza das coisas, a partir dele construir a leitura do mundo e também planificar a tecnicidade e tecnologia’.

Ele atribui a existência do homem pela técnica e a cultura onde ambas se completam, formando saberes e conhecimentos que devem se apreendidos pelos indivíduos, uma vez que ele enfatiza a importância que os objetos técnicos possuem para o homem, mas que em maioria das vezes o homem não compreende este objeto e o manipula para atender suas necessidades no mundo, isto gera um desrespeito humano com os objetos.

Portanto, contextualizando à realidade atual, estabelecida à partir do século XX, é possível afirmar que as tecnologias, as ciências e avançaram de tal forma que a vida do ser humano tornou-se e permanece intimamente ligada às tecnologias e aos objetos tecnológicos, com o surgimento de ‘ecossistemas tecnológicos’, logo, é terminantemente difícil imaginar a vida do ser humano sem as tecnologias. Mas ,ao mesmo tempo, é importante pensar esta relação que se estabelece buscando uma redefinição de finalidades e objetivos, numa utilização das tecnologias sem (contudo) tornar-se um ‘escravo’ delas, antes, que se possa usufruir delas de forma profícua e inteligente e, ainda mais, estabelecendo nesse processo, os fatores da humanização, da valorização da pessoa, do sujeito para além do objeto.

Nesse contexto, educar é, praticamente, possibilitar que o indivíduo passe de um estado de inércia, para um estado de evolução consciente, capaz de transformar uma prática alienante de enxergar as diversas situações sociais, para uma prática revolucionária de mudanças por meio de conhecimentos adquiridos, principalmente na contemporaneidade, isto é, em uma época marcada fortemente pelo progresso e velocidade em que o resultado da técnica se apresenta. Tem-se uma gama de transformações, sociais, políticas, econômicas acontece e se sucede rapidamente onde suas aplicações aparecem arraigadas no âmbito ético e moral. Sendo assim, a técnica pode tanto desumanizar o homem como auxiliá-lo em sua humanização.

Partindo desse pressuposto, há a importância de conhecer a essência da técnica a fim de gerar questionamentos a respeito da mesma, isto é, pensar a essência da técnica e chegar uma verdade que nos aparece, pode provocar uma mudança e com ela, humanizar.

Em outras palavras, cabe aqui refletir que se o homem pensasse só no homem não resolveria o problema da desumanização que a técnica trouxe como bagagem, mas o pensar de uma forma global, relacionando-se com os objetos técnicos e tudo o que há ao seu redor, poderia, supostamente provocar transformações bastantes importantes e expressivas que resultariam em novos saberes e conhecimentos.

Esses conhecimentos não seriam espontâneos, mas sim organizados sistematicamente por meio de processos que, reunidos, definiriam o que ensinar; como e quando ensinar; a quem ensinar, estabelecendo, dessa forma um currículo é reproduzido pela escola a partir das práticas docentes. Essas práticas devem ser revestidas de uma intencionalidade, organizadas por planejamentos e propostas de ação, com a finalidade de proporcionar ao educando uma educação integral que lhe deem acesso a apropriar-se de sua autonomia e exercer sua cidadania junto à sociedade.

Para a Psicanálise, aqui representada por Lacan e Freud. Em Lacan a humanização aponta o “campo da linguagem”, uma vez que é a linguagem que difere o ser humano do animal, uma vez que verbalizando, podemos expressar nossos interesses, conhecimentos ou desejos em relação a eles.

Lacan pontua que a palavra tende na direção de um outro ser e, ratificando a palavra, acolhendo-a é possível se subjetivar. Entenda-se aqui o ensino como mediado por um outro que pode ser representado pelo professor, que deveria fazer do objeto de conhecimento um mistério a ser desvendado. Nessa tentativa de esclarecer o mistério, o sujeito pode constituir seu conhecimento. Assim, o professor exercerá essa função para o aluno, de maneira que ele possa aprender ou não.

Freud, por sua vez, percebe que a Educação não pode ser concebida apenas pelo seu aspecto preventivo das neuroses e afirma que se deve evitar confundir o trabalho pedagógico ou mesmo substituí-lo por uma intervenção psicanalítica. Ele introduz a noção do educador analisado ou com informação psicanalítica que conduziria o processo educativo no caminho da realidade.

Reflete sobre o surgimento das preocupações que a criança possui; e para ele as primeiras investigações são sexuais (libidinais) e servem como meio de situar a criança no mundo, vivenciando suas incursões no saber através a observação de um elemento próximo modelar, trazendo a concepção de um trabalho educativo psicanaliticamente esclarecido, constatando na transferência como reedições de vivências psíquicas que são atualizadas em relação à figura do professor, que se expressa na identificação do educando com ele. Nisso destaca-se a importância de o professor desenvolver um bom relacionamento com o educando.

Nesse âmbito, através dessa identificação, as ações humanas podem englobar muitas e diversificadas práticas pedagógicas, que vêm sendo introduzidas e sistematizadas no processo ensino aprendizagem de muitas disciplinas, entre elas destacam-se a psicopedagogia, a filosofia, a psicanálise, sob a intenção de decifrar os meandros do saber, nos vãos e desvãos existentes entre o educando e o conhecimento e o saber, dentro de todo o processo de aquisição do mesmo, todavia, não de uma forma compartimentada, estandardizada, como na educação antiga, mas sob uma visão mais humanizada, global, holística pois, segundo Freire:

"ninguém educa ninguém, (ninguém educa sozinho; todos educamos no relacionamento)". (FREIRE apud GANDIN: 1997, p.94).

Para Freire, não se pode enfocar a educação sem focalizar o humano e/ou o que ocorre no tempo e no espaço, entre os homens uns com os outros. Portanto, deve considerar a educação como um fenômeno humano que nos envia a uma análise sobre: o que é o homem?, qual a sua posição no mundo? Qual sua importância para a comunidade como parte integrante (uma e indivisível) dela?.

Partindo desse pressuposto de Freire, se, para alguns, o homem é um ser da adaptação ao mundo (tomando-se o mundo não apenas em sentido natural, mas estrutural, histórico-cultural), sua ação educativa, seus métodos, seus objetivos, adequar-se-ão a essa concepção.

Se, para outros porém, o homem é um ser em transformação e construção no mundo, com o mundo e para o mundo, seu fazer educativo segue uma nova abordagem, a de um caminho a ser construído paulatinamente, no desenrolar de suas vivências, urgências, emergências e interesses. O que pressupõe a necessidade de se ter o despertar da consciência, ou seja, segundo Freud, ter o que corresponde ‘à noção que cada um tem seu ‘eu’, carregado de intenções, desejos e punções e, de certa forma, aquilo que pensamos é o que somos, (“penso, logo existo”, logo sou. – Sócrates).

Assim, cabe ao ensino formal, necessariamente ao professor no que se refere ao aspecto técnico-científico, a responsabilidade de ensinar ao aluno de forma competente, aplicar o que aprendeu e trazer para a sala de aula um currículo adaptado às necessidades desse alunado utilizando-se da ética, respeito e dignidade pra si e para ele.

Logo, à partir desse entendimento, pensa-se o fazer pedagógico como um instrumento para a emancipação do educando, com base nos objetivos de ensino propostos e que o conduzirá a humanização por meio do trabalho. É por isso que ao se definir a intencionalidade da escola, há que se definir também sua prática, ou seja, definir o que ensinar? Como ensinar?, para que ensinar?, pensando no educando, que é o alvo principal da educação e em que essa educação ira influir e inferir na construção de um mundo melhor.

A internacionalidade e a transcendentalidade, nesse contexto, são uma necessidade urgente e uma exigência para a prática humanizadora da educação na contemporaneidade, visando o cidadão integral, no exercício pleno de sua cidadania. O saber é formado pelas relações interligadas dos diversos conhecimentos que estão postos nas disciplinas e que foram construídos pelo conjunto dos homens e das interações entre os sujeitos do processo ensino/aprendizagem, a saber, professor e alunos.

Pressupõe-se aqui que, necessariamente, deve-se recorrer à pesquisa para a construção e organização desses conhecimentos, desenvolver no educando uma educação de qualidade, pois, é a partir da aquisição desses saberes, adquirido na escola de forma organizada e planejada, que o indivíduo se humaniza e torna-se cidadão consciente de seus direitos.

Não há, portanto, outro caminho para a humanização do ser humano que não seja pela educação em seu sentido pleno, isso significa entender que é a partir da apropriação da cultura e do conhecimento por meio da educação que o homem se humaniza, ao utilizar esses conhecimentos e essa cultura em prol do bem comum, de sua relação consigo mesmo e com o mundo;

Nesse sentido, a escola é colocada, na atualidade, como promotora dessa conquista da emancipação humana, tentando realizar com qualidade, o processo de ensino para a apropriação dos conhecimentos científicos e filosóficos que sejam capazes de educar integralmente o ser humano, ou seja, educar para a cidadania a partir da “assimilação ativa dos conteúdos”. A partir desse entendimento da escola como um todo estará cumprindo o seu papel social na construção e transmissão da cultura produzida pelo conjunto dos homens, formando e humanizando aqueles que buscam uma educação de qualidade.

Assim, o objetivo da educação não é ensinar coisas porque as coisas já estão na internet, estão por todos os lugares, estão nos livros.” (Rubem Alves). Ele acredita que o papel do professor, frente essa escola que prepara o educando para pensar, provocar no aluno essa curiosidade natural da criança (ou adolescente). Nesse sentido, a escola deve ser um ambiente de troca de conhecimento mútua entre professores e alunos e o processo de aprendizagem é um ato dialogal.

CONCLUSÃO

Assim, pode-se chegar a algumas conclusões. Por exemplo a de que o ato educativo não é (ou não deve ser) uma reprodução de conteúdos compartimentados, professores frequentemente reproduzem o conteúdo das apostilas, antes, deve ser algo dinâmico que se processa mediante as sutilezas da curiosidade e aproveitamento das oportunidades que esta traz ao momento de aprender e na relevância de o que ensinar. Rubem Alves afirma:

“É preciso que os professores parem e digam: Não vamos seguir o programa, vamos fazer as coisas que são essenciais no ambiente em que a criança vive”. (Rubem Alves)

Nesse sentido, lembrando que o homem é um ser cultural, que reflete a cultura de seu tempo e espaço e que, já ao nascer encontra-se envolto por valores herdados. A educação segundo a teoria metamorfose de Nietzsche, tendo suporte na filosofia, vai estabelecer os meios de como efetuar um processo ensino/aprendizagem o fato de existirem receitas antigas que respondiam empiricamente às necessidades e interesses do aprendiz e este ia, no passado, na escola tradicional, absorvendo esses saberes inculcando-os sobre si, como o camelo do texto da metamorfose de Zaratustra.

No entanto, essas verdades, esses conhecimentos, saberes compartimentados, enfiados no educando goela abaixo, já não cabem à realidade atual Daí a necessidade de se assumir a fúria do leão, rebelando-se contra as receitas antigas, assumindo novas receitas, buscando novos caminhos, quebrando velhos paradigmas e assumindo em função da realidade e do momento atual.

Mas o leão não sabe criar, é preciso metamorfosear para a criança assumir a novidade e manuseá-la, experimentá-la com sua curiosidade e espanto, nisso vivenciar o verdadeiro ‘sabor do saber’ que Rubem Alves sugere.

Nesse processo todo de metamorfose, o professor não é mais um mero repassador de informações como no passado, na Educação tradicional, nem o aluno é uma tábua rasa a ser escrita. Na contemporaneidade, ele é o intermediador que auxilia o educando na descoberta do conhecimento e do saber, que estimula a curiosidade e o desejo.

Isso reafirma o que Paulo Freire disse acerca da educação autêntica, ou seja, que a educação só pode ser a educação se for realizada para a liberdade e a autonomia, e quando esta trouxer, como reflexos, a consolidação da tão enfatizada humanização, estreitando a relação simbiótica entre os atos de educar e humanizar.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

FREIRE, P.- vários textos de sua obra, a partir de pedagogia do oprimido. [ Links ]

GUTMANN, A - «A desarmonia da democracia», Lua Nova, Nº 3

NUNES, A. V. O saber filosófico: os caminhos da razão suficiente. In: ______. Fundamentos filosóficos da educação. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, Núcleo de Educação Aberta e à Distância, 2010. cap. 2, p. 27-44.

OLIVEIRA, Betty. Paradigmas e alienação na pesquisa em educação: a problemática da cotidianidade. Caxarnbu, ANPED, 1993. REZENDE, Antônio M. (org.) Iniciação teórica e prática às ciências da educação. Petrópolis: Vozes, 1979.

SAVIANI, Dermeval. Contribuições da filosofia para a educação. Em Aberto, Brasília, v.9, nA5, p.3-9, jan.lmar. 1990.

SEVERINO, Antônio J. A contribuição da filosofia para a educação. Em Aberto, Brasília, v.9, nA5, p.19-26, jan.lmar. 1990.

Nina Costa
Enviado por Nina Costa em 21/12/2014
Reeditado em 21/12/2014
Código do texto: T5076960
Classificação de conteúdo: seguro