Os efeitos perniciosos da pós-modernidade no cotidiano
Foi o tempo que o conhecimento era totalizante, holístico e bastante definido. Na política, as linhas ideológicas eram bem definidas, entre os partidos com seu forte conteúdo doutrinário. A defesa pelo bem-comum, seja pela justiça e bem-estar social ou pelos direitos individuais, mas a bem da sociedade - tanto à direita quanto pela esquerda -, eram pontos pacíficos. A moral tinha seus valores estabelecidos e eram absolutos os conceitos de "certo" e "errado". Pensava-se na construção de um mundo mais justo, na resolução do problema da humanidade para, depois, se partirem aos direitos mais subsidiários, referentes às minorias.
Após a crise de 1968 na França e os movimentos de ruptura com o idealismo de fundo marxista - ou similar a ele, em um programa de bem-estar social ou nacional-desenvolvimentista -, várias ações simultâneas ocorrem naquele momento. Com o advento do feminismo, da liberdade sexual, do uso desenfreado de drogas, do Movimento Hippie e de Woodstock - com a idéia ascética e isolacionista, no uso do dilema "paz e amor" e a utilização do protesto pacífico -, as concepções sobre o mundo, no campo científico, econômico, teológico e, inclusive, comportamental, passaram a mudar o seu perfil e tomarem um novo rumo.
Acresce a esse dado a queda do arremedo de tentativa do socialismo soviético, nos fins da década de 1989, com a Perestróika, e a vitória do projeto capitalista e globalizante encampado pelos EUA e seus países satélites. Toma-se, até por meio da frase de Fukuyama, a expressão fatídica de que já existia "o fim da História".
O conhecimento totalizante e a proliferação das grandes teorias sociológicas, psicológicas, filosóficas e físico-matemáticas se estagnam, diante de um momento em que constitui-se na maior crise do pensamento filosófico mundial, se comparado ao início do século XX, em meio a momentos de incertezas e receios, face a uma grande guerra imperialista que poderia eclodir - e ocorreu, de fato, com a grande guerra mundial, em 1914.
Logo, entre relativismos e defesas em torno da valorização do ser "diferente" e a aceitação passiva dos eventos presentes - no caso a idéia de que "a globalização é natural e é inerente ao mundo." -, vivemos em uma ditadura velada das idéias, em uma esquizofrênia tão grande que, se, por um lado, é algo democrático ser diferente e relativizar os valores ético-morais e científicos, por outro, ser oposição a eles - ainda que em uma democracia, com a existência da sociedade civil, com seus canais de diálogo - é algo anátema para os grupos. Setores estes que, cada vez mais majoritários na opinião pública, rechaçam, de forma inclusive antidemocrática. Ridicularizam e promovem, sobretudo, campanhas oficiais midiáticas contra seus opositores no campo das idéias; aos que se posicionam contra.
É tão confusa a pós-modernidade neste sentido que, particularmente, não consigo conceber a idéia de valorizar as diferenças para a busca da igualdade. Isto é algo tão anacrônico, que nem os liberais do século XVIII e XIX, como Adam Smith, Toqueville e John Stuart Mill, ousaram se atrever a isso.
Particularmente, creio que a luta pela igualdade, contra as injustiças sociais, é o primeiro e grande passo para a busca da igualdade. Junto com o amor ao próximo, a luta pela justiça social se torna mais efetiva, contemplando, inclusive, os segmentos minoritários.
Os tempos como os idos de 1940 até 1960 foram bons, com uma ampla discussão científica e totalizante; com o uso de argumentos e lógicas racionais, na defesa do coletivo, lutando pela igualdade, contra qualquer tipo de diferença. Hoje, a irracionalidade, o imediatismo, o relativismo, o individualismo - travestido em movimentos minoritários, sem expressividade númerica e significativa -, o hedonismo exacerbado e a descrença no utopismo marcam a dita democracia pós-moderna sem paradigmas, sem valores ético-morais e/ou ideológicos.
Todos os valores pós-modernos são refletidos em crises ininterruptas que alcançam o bem-estar da sociedade. A violência, a intolerância - disfarçada na defesa "democratizante" e institucionalizada nas minorias, sem qualquer debate franco e honesto -, o preconceito oficializado ("o que não comunga comigo, é contra mim!"), a crise nas famílias, a ampliação avassaladora da criminalidade e da exploração infantil (nos trabalhos ou mesmo na prostituição). Igualmente, a redução dos direitos sociais e individuais - omitem-se os discursos em defesa do coletivo e ampliam-se os discursos segmentados e/ou sectarizados, como cortina de fumaça para esconder o fosso da desigualdade social - e a crise, inclusive, das instituições democráticas e políticas, onde inclui-se, nesse ínterim, os partidos políticos - muitos partidos de esquerda e, até de direita, sem qualquer identidade ideológica mínima que os definam como tal, inclusive em suas práticas políticas. Sintetizando, todos estes itens são fatores frutos do pensamento pós-moderno, que nada mais é do que a NEGAÇÃO a qualquer conceito de modernidade, em sua acepção mais ampla.
Este é um debate muito intenso, que deveria ser refletido, encarado e dialogado de forma honesta. Boa parte da intelectualidade, surda ou mesma cega propositalmente em seus fins corporativistas, não querem travar este tema, fugindo do seu papel principal que é assumir a posição em defesa da igualdade e do bem-comum. Cabe a nós começarmos a gerar um debate justo, se ainda, de fato, ansiamos por um mundo mais democrático, fraterno e solidário.
Ainda, se quisermos, de fato, pensar!