GUARDANDO AS MÁSCARAS
O carnaval passou...
“Eu sou aquele pierrô que te abraçou e
te beijou meu amor...”
Certo dia, naquelas barracas que vendem artigos para o carnaval, estava para comprar uma fantasia para meu neto Lucas, quando chegou um menino acompanhado por sua mãe, a procura de uma máscara. Passei a observá-lo, até como curiosidade sobre a escolha.
Depois de muitas mudanças, essa ou aquela ou aquela outra, o menino olhando para mim, apontou em minha direção e foi decisivo: “quero igual aquela”.
Aquela qual?
Ao meu lado ou atrás de mim não tinha nenhuma. Quando me dei conta, pressenti que o danadinho do menino, tava me achando muito feio, ao ponto de confundir minha fisionomia com as máscaras.
Sei que só existem duas pessoas que me chamam de bonito: minha mãe e minha sogra. A primeira diz: “bonito da mamãe!” enquanto que a segunda, “bonito, hem!”.
Para refletir sobre as máscaras, é preciso uma pergunta: Pra que serve uma máscara?
A máscara utilizada para cobrir o rosto, nos diversos momentos, tais como nos eventos do carnaval, religiosos, artísticos ou de proteção. A palavra tem origem no árabe maskharah = "palhaço", "homem disfarçado". As tribos africanas usam máscaras em cerimônias de passagem entre a vida e a morte.
A máscara é um dos mais simbólicos elementos de linguagem teatral, remontando à representação de cabeça de animais em rituais primitivos, ressaltando misterioso poder.
Às vezes a máscara passa a se tornar um símbolo de caráter enganoso. Ela não esconde somente a identidade, mas transforma a vida de quem a utiliza.
Nas festas de Dionísio, todos bebiam, cantavam, dançavam e usavam máscaras, por acreditar que Dionísio estaria ali presente. A máscara tanto esconde como libera o caráter de quem a utiliza.
Quando tiramos a máscara, parece que ela fica impregnada de “comportamentos” que em nenhuma hipótese seriam praticados sem elas.
Pitty, em sua música ‘Máscara’, canta: “Tira, a máscara que cobre o seu rosto/ Se mostre e eu descubro se eu gosto / Do seu verdadeiro jeito de ser”.
Consciente ou não, já ao amanhecer, ainda na cama, a “gaveta” é vasculhada em busca da ‘máscara’ a usar nesse dia. Mas, ela pode não ser suficiente para o dia todo, e então, algumas, são colocadas numa ‘maleta’ e conforme a conveniência vai se revezando.
É preciso ter muito cuidado no uso da máscara, porque de tanto usar, acaba esquecendo quem você é.
Esse fingimento, que parece tão informal, ao usar uma das máscaras, esconde a realidade de não ser o que se é. E isso atrai outro mascarado, que também fora do seu ‘eu’ verdadeiro, se aproxima pelas mesmas debilidades.
Ao não enxergarem a sua humanidade, os outros não podem aceitar você como tal. Isso afasta aquele que realmente não era seu amigo, e sim, da máscara.
As máscaras nem sempre estão apenas na face oculta da “personalidade”. Elas se adaptam muito bem nas roupas, nos falares, nos sapatos, nas maquiagens, nos adornos, enfim em tudo que possa modificar, pouco ou muito, aquela “fotografia” do momento.
Quem está do outro lado pode não enxergar exatamente a que você se propõe.
A máscara da ‘retidão’ pode transparecer a do ‘desespero’. A da tristeza pode refletir a da ‘ansiedade’. A do ‘prazer’ pode fazer parceria com a do ‘fingimento’. A da ‘aceitação’ pode estar de mão dada com a da ‘submissão’. A da ‘alegria’ pode estar reluzindo a da ‘euforia’. A do ‘ócio’ pode se confundir com a da ‘preguiça’.
Seja como se apresentem, as máscaras não refletem o lado verdadeiro e desconhecido da própria personalidade.
As máscaras podem nos fazer entender parte da natureza humana, através das facetas:
O aparente do aparente, diz respeito ao óbvio e do concreto. “Sou
assim mesmo”.
O oculto do aparente, diz respeito à própria
consciência. O aparente encontra-se encoberto não
sendo percebido de imediato. “Como é que não
percebemos antes?”
O aparente do oculto, diz respeito ao mundo menos diferenciado.
Inconsciente. Esquecimento e lembrança parece ser uma única
experiência. “Não sou como você pensa!”
O oculto do oculto, diz respeito à falta de espaço para
a razão. Mesmo assim é acessível ao ser humano,
através da ação. “O que mais você lembra que possa
ajudar a você se descobrir?”. “Estou percebendo e
aprendendo a mudar meu comportamento”.
Experimentemos sermos nós mesmos. Acredito que iremos gostar.
Tá bom. São 12:30 horas. Vou guardar a máscara de pretenso “escritor” e buscar na gaveta, a de “faminto”.
O carnaval da vida continua... Apenas com um pouco mais de seriedade.
“A mesma máscara negra /que esconde o teu rosto /Eu quero matar a saudade... “