VIDA CÁUSTICA

A notícia de que conhecida apresentadora de televisão a cabo, da região serrana fluminense, deu cabo de sua vida (todos os indícios levam a crer em tal fato, como divulgou a imprensa) me pegou de surpresa. O que levaria uma pessoa a desistir da vida? Esta é uma primeira pergunta que se impõe num momento como este. E, segunda: por que ela mesma decide por fim a vida?

Que há muitas pessoas que já desistiram da vida não resta dúvida. Infelizmente o modus vivendi moderno com alto índice de competição, azáfama, acúmulo de estresse e outras variáveis tem levado muitos indivíduos a se desgostarem de tal forma da vida que prefeririam partir deste mundo a ter que continuar a viver sob tais condições. Some-se a isto a desigualdade social, as faltas de oportunidades de trabalho, a sub-condição de moradia e higiene, os atropelos na área da saúde e encontraremos uma população desgastada com a falta de qualidade de vida.

A questão é que muitos que já não têm uma vida prazerosa desistem simbolicamente de viver ao perderem a garra no que fazem; sentirem-se desmotivados; ou, simplesmente estarem levando a vida do jeito que dá, “aos trancos e barrancos até o dia do adeus”. É comum até, entre os cristãos, certo tipo de prece em que se pede a Deus (para si mesmo ou para algum familiar) que o conduza logo para o céu a fim de que seus tormentos da Terra tenham um fim. É claro que tal oração é fruto da ignorância de muitos quanto ao que seja verdadeiramente uma vida com Deus e total desconhecimento das verdades do Evangelho.

Mas, há aqueles, como esta senhora, Maria Lúcia Reis Azeredo, 56 anos, advogada, apresentadora do programa Aquecendo Corações na Tevê Focus, que simplesmente tiveram coragem e assumiram o fato de que a vida não valia mais a pena, desistindo dela (Nova Friburgo: A Voz da Serra, 28 a 30 de abril de 2007, p. 10). Quantos até gostariam de fazer o mesmo, mas não têm a coragem que ela teve?

Aqui cabe uma outra reflexão, pois, quando o suicida não deixa uma carta ou faz algum tipo de pronunciamento prévio que possa servir de base para a elucidação do caso, fica difícil desvendar os reais motivos que geraram a desdita. Até porque a morte por suicídio pode ser pensada, como, também, fruto de um ato impensado; uma agonia; um desvario momentâneo que, se a pessoa estivesse no uso pleno de suas faculdades mentais, possivelmente não o faria. No caso dessa apresentadora, o marido atesta o fato de que ela tinha ficado depressiva depois que registraram queixa contra ela na 151ª DP.

Interessante anotar que o episódio se deu quase que paralelamente a uma outra suposta tentativa de suicídio de apresentadora de televisão: Doris Giesse. A conhecida Doris, famosa pela beleza e por ter sido apresentadora em canais abertos da televisão brasileira, despencou do oitavo andar do prédio onde morava quando tentava resgatar o seu gatinho (estamos falando de um felino mesmo!). Alguns analistas vêem no episódio uma tentativa de suicídio por conta do histórico de Doris, que já tinha sido atropelada por caminhão, por ônibus, dentre outras peripécias, que indicam certa freqüência em se viver perigosamente...

Pode ser que a apresentadora friburguense, em meio às suas angústias pessoais tenha, inconsciente ou conscientemente, se inspirado no episódio da Doris para tomar a decisão de ingerir soda cáustica e por um fim à sua existência. Foi isso que a necropsia constatou e o caso está registrado na delegacia como suicídio.

Outra questão que salta-nos aos olhos é a condição de religiosa, e, evangélica, da apresentadora, e o tipo de programa que ela fazia: um programa de variedades com mensagens e interpretação de textos bíblicos para levar paz aos corações aflitos. Para os estudiosos da alma humana, existe total incongruência entres os dados apresentados: suicídio não combina com cristianismo. Ou, a questão posta de uma outra forma, aquela que apaziguava corações alheios vivia um inferno pessoal e ninguém, nem ela mesma, cuidava dela!

Esta é uma questão de difícil análise. Até bem pouco tempo era mais recorrente entre os teólogos a interpretação de que o suicida não herdaria o Reino dos Céus. Afinal de contas, no contundente mandamento bíblico “não matarás” (Ex 20.13), o não matar aplica-se tanto ao próximo como também a si mesmo. Deus é o doador da vida. Só ele pode dá-la; só ele pode tirá-la. Com o uso de outras ferramentas de estudo e análise fornecidas pela Psicologia, Psicanálise, Sociologia, Antropologia dentre outras ciências incluindo aí a Filosofia e a própria Teologia, vão entrar em especulação a questão dos antecedentes psicológicos do indivíduo; as condições de pressão em que se encontrava; as alterações de comportamento; a influência externa; os sinais indicadores de distúrbios mentais; dentre outras questões pertinentes.

Só podem dar elementos mais substanciais sobre as razões que levam um indivíduo ao suicídio, aqueles que fizeram uma tentativa frustrada e permaneceram na vida para poder contar o que os motivou. Mas, como dizem que o cúmulo do azar é tentar se matar e continuar vivo; e que, quem quer morrer mesmo, toma providências cabíveis para que de fato o seu desejo seja alcançado, pode ser que uma suposta “tentativa de suicídio” seja apenas um instrumento de chantagem para alguém, a família, ou qual outra motivação esteja no coração do pseudo-suicida.

Voltando a discussão anterior, não há condição alguma de entrarmos na mente e no coração de quem quer que seja para desvendar os segredos que uma pessoa guarda dentro de si. Alguém disse: “Somos incoerentes, e daí?” É própria do ser humano, certa discrepância de comportamento. Só uma mente obtusa cobra coerência total: sempre dos outros, nunca de si mesmo! Dessa forma, mesmo com a ajuda das ciências que tratam da psique, fica difícil conhecer realmente quem é o indivíduo, se ele mesmo não ajudar nesta descoberta. Mas, Deus nos conhece por inteiro. Em João 2.24,25 vemos Jesus dando uma demonstração de que sabe o que se passa em nosso íntimo, no interior de nosso coração, e que, por conta da atuação do pecado em nossas vidas, quase sempre não somos honestos e bons. A solução para este problema está no binômio: arrependimento e fé.

Como cristão, continuo acreditando nos mandamentos bíblicos que foram transmitidos exatamente para ajudar a humanidade a encontrar sentido e razão para a vida. Todo aquele que vive debaixo dos princípios divinos encontra motivações suficientes para viver uma vida com qualidade. Afinal de contas foi isso que Jesus Cristo veio nos trazer: “Eu vim para que tenham vida e a tenham com abundância” (Jo 10.10). As questões do coração do homem são muito mais objetos da Teologia do que da Psicologia propriamente dita. Creio que a solução espiritual é suficientemente capaz de colocar a vida humana nos trilhos, embora, em alguns casos particulares, dos quais elencamos alguns como: vítimas de traumas, complexos, abusos na infância e outros se faça necessário o concurso de outras ferramentas para o reequilíbrio do ser.

O suicida consciente, aquele que escolheu se matar, abdicando do direito de continuar a viver e a reconstruir sua vida, mesmo que em meio a muitas lutas e dissabores, não pode ser considerado inocente em seu ato, de acordo com as assertivas bíblicas. Se enquadrarmos o suicida na conta dos covardes e assassinos (de si mesmos) listados no Apocalipse, os mesmos não entrarão nos céus (Ap 21.8; 22.15). Entretanto, existe aquele que comete um desatino por conta da perda da memória, alteração do estado emocional e que comete algum ato delituoso fora do exercício de suas faculdades mentais. Este não pode ser responsabilizado por seus atos. As leis humanas reconhecem esta possibilidade e o que não fará Deus, sendo ele o Pai das Misericórdias?

Questões pertinentes à vida eterna e que não estão devidamente esclarecidas pelas Escrituras delas saberemos quando estivermos juntos de Deus e o conhecermos plenamente como somos por ele conhecidos (1Co 13.12). Levantar a questão se o suicida vai para o céu pode ser muito interessante para a especulação filosófica, mas não resolve o problema de milhares e milhões de corações aflitos que ainda estão entre nós e que não podem nem devem ter o suicídio como parâmetro de segurança para alívio imediato das dores terrenas e posse das desconhecidas regalias celestes. Aos corações atribulados, resta ainda o consolo de estarem vivos e a chance que isto representa de superar os males que os afligem. Não é isto o que diz o provérbio? “Ora, para aquele que está na companhia dos vivos há esperança” (Ec 9.4a).

Lembrando de tantos líderes religiosos que vivem a cuidar de outros, é preciso destacar que nem sempre tais líderes cuidam de si mesmos ou têm quem possa cuidar deles. Nas religiões cuja hierarquia é mais desenvolvida, haverá sempre um superior a observar comportamento, desempenho e relacionamentos interpessoais daqueles que estão sob sua jurisdição. Para aquelas denominações religiosas que seguem o modelo bíblico de soberania eclesiástica e autonomia de autoridade pastoral (o que não significa laissez faire, pois todo cristão está debaixo da autoridade Suprema de Deus) fica mais difícil avaliar as quantas anda a saúde mental, física, emocional e espiritual de tantos que falam em nome de Deus.

Neste caso, vale o provérbio dos tempos bíblicos citado por Jesus: “Médico, cura-te a ti mesmo!” (Lc 4.23). Quando vemos médicos fazendo uso do cigarro ou da bebida alcoólica, e até mesmo de drogas proibidas por lei como cocaína e maconha, situamos o quadro da problemática humana no âmbito das questões morais e espirituais. Estes são, basicamente, os problemas da humanidade: se o indivíduo se resolver com Deus, estará a um passo de resolver-se com a sociedade e consigo mesmo, pois, como disse Agostinho, “viemos de Deus e para Deus retornaremos; e nossos corações só repousam tranqüilos quando descansam em Deus!” O mesmo se aplica aos líderes religiosos que são mais profissionais da fé do que usuários das receitas que pregam.

Quando a vida se nos parecer difícil, e quase impossível de suportar, lembremos das sábias palavras das Escrituras: “Socorre, Senhor, Deus meu! Salva-me segundo a tua misericórdia” (Sl 109.26), conscientes de que nós criamos os problemas e Deus é sempre quem resolve: “A tua ruína, ó Israel, vem de ti, e só de mim, o teu socorro” (Os 13.9); “Pois o Senhor, por causa do seu grande nome, não desamparará o seu povo” (1Sm 12.22). Por isso, façamos como o salmista que declarava: “Elevo os meus olhos para os montes; de onde me vem o socorro? O meu socorro vem do Senhor, que fez os céus e a terra. O Senhor te guardará de todo o mal; ele guardará a tua vida” (Sl 121.1,2,7).

A vida não nos pertence! Se a vida está cáustica, a solução não pode ser a soda cáustica. A causticidade da vida no que ela tem de irônica, mordaz, malévola; ou o caráter maledicente, queimante, destruidor do viço, da alegria e do prazer de viver que muitas vezes se encontra em determinados indivíduos, devem ser vencidos ou superados pela renovação que o Espírito Santo de Deus faz naqueles que se submetem ao tratamento restaurador proposto em Cristo Jesus. Podemos não entender todas as razões que levam alguém a abrir mão da vida e, por vezes, somos surpreendidos por alguns cuja existência sendo tão dura e cruel os fazem perder a razão e cometer um atentado contra si mesmos. Jesus, porém, e seu Evangelho são sinônimos de vida: aqui e agora; no porvir e sempre. A solução para todos os males do coração humano é o perdão e a paz de Deus. Não há outro remédio. Troque a vida cáustica pela vida abundante de Jesus!

Jess
Enviado por Jess em 08/05/2007
Código do texto: T479010