Erro na contagem do tempo

Era um daqueles dias quentes de verão. Para amenizar, estávamos na praia. Depois do salutar mergulho no mar, tomamos uma ducha na pousada, colocamos uma roupa e fomos almoçar em um restaurante. Passava da uma hora da tarde, e o estabelecimento botava gente pelo ladrão. Tivemos que esperar até que vagasse uma mesa, estrategicamente disposta sob um ventilador.

Estávamos nesse enervante processo de espera quando um casal aproximou-se de nós, já deixando a sala de refeições. Ele era um rapaz alto, atlético, tipo surfista, de seus vinte e poucos anos. Ela – imaginei que fosse mãe do jovem – era o que se podia chamar de “coroa esvoaçante”, novo epíteto dado às antigas “peruas”. Vestia a percanta uma saia comprida, uma blusa cheia de brilhos, enormes óculos escuros, muita maquiagem, tudo adornado por um enorme chapéu, ao estilo da vetusta Joan Crawford.

Assim que ela me viu, veio na minha direção, expressando através de um largo sorriso, que me conhecia. Como me chamou pelo nome, e começou a puxar conversa, constatei que ela sabia quem eu era. Comecei a rodar o disco da minha memória, para saber de onde eu conhecia aquela mulher. Confesso que o chapelão, os óculos, a maquiagem e a fantasia de perua tornavam praticamente impossível uma identificação a priori. Nas apresentações é que descobri de quem se tratava. Ao apresentar o jovem (a quem eu julgava fosse filho dela) como “meu namorado” eu quase caí na risada, pois a disparidade de idades era gritante.

É gozado como a modernidade liberou as mulheres para aventuras e parcerias com garotos. O exemplo vem das artistas de cinema, teatro e tevê, onde as mulheres mais velhas não têm o pejo de revelarem que estão de romance com jovens com idade para serem filhos. Isso sem falar nas que se “apaixonam” (sentimentos que duram no máximo seis meses) por “seguranças”, mordomos, motoristas ou coisas do ramo. Na incapacidade de arrumar homens maduros e estáveis, elas preferem garotos, inexperientes, ávidos de bem-estar e aventuras. Isto releva carência e solidão de algumas mulheres, bem como a falta de escrúpulos de alguns jovens, que aceitam tais papéis humilhantes.

Pois no vestíbulo do restaurante, antes que alguém falasse mais alguma coisa, a diva informou que nós, eu e ela havíamos sido colegas na faculdade. Alguns blá-blá-blás mais e ela se despediu, saindo toda rebolativa ao lado do jovem mancebo. Quando sentamos à mesa do restaurante, Carmen me perguntou: “Mas ela não tem muita idade para ter sido tua colega?”.

Rindo, respondi-lhe que a extravagante figura, ao contrário do informado, não tinha sido colega, mas professora. E do Segundo Grau. Um erro na contagem do tempo.

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 24/04/2007
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