Contrato de seguro: prêmio e indenização
1. Introdução
É perceptível a tendência no homem em agrupar-se com os demais de sua espécie. Unem-se não necessariamente por motivos altruístas e visando o bem comum. Anteriormente a isso, calculam objetivamente quais seriam as vantagens e desvantagens de tal agrupamento e, somente após o resultado final optam pela união ou pela desunião.
Tal concepção encontra respaldo na teoria do grande contratualistas Thomas Hobbes (1588-1679). Segundo o teórico político filosófico, todos os homens inicialmente possuem direitos a todas as coisas, e essa condição de total liberdade conduziria a uma guerra permanente, sendo vital que fosse feito um acordo que estabelecesse a renúncia a seu direito a todas as coisas, vivendo de maneira mais harmônica.
Assim visto, qual seria a semelhança entre a visão hobbesiana e os contratos de seguro? Pode-se, verdadeiramente, falar em semelhanças? A nosso ver, foi pela mesma necessidade de manutenção do bem comum e da preservação de boas condições que se originou esse contrato, de grande uso na idade média e principalmente no tempo atual. Vejamos abaixo mais detalhes sobre seu surgimento.
2. Breve relato histórico
Pablo Stolze [1] assevera que “o seguro, inequivocamente, nasce como consequência do fato associativo, da natural e imanente tendência do homem –ser eminentemente gregário– de se agrupar, de se unir, visando, neste caso, a se prevenir de riscos futuros”.
Lembrando o culto jurista Caio Mário [2], o seguro aparece inicialmente nas relações decorrentes do comércio marítimo, durante o período medieval, cobrindo apenas as cargas que eram transportadas nas arriscadas viagens travadas pelos comerciantes, que devido às intempéries da natureza poderiam perder todas as suas chances de lucro.
Posteriormente, seu uso foi sendo alargado para as relações civis, sendo utilizado no fim do século XVIII com o fim de prevenir os danos causados pelos possíveis incêndios e a partir daí, a vida também é tutelada por essa espécie contratual.
Em 1916, O Código Civil brasileiro tratou de elucidá-lo com clareza, e com o passar dos anos o seu uso tornou-se cada vez mais difundido em uma sociedade que busca a solidarizarão em prol de reduzir os riscos ao qual estamos expostos com tanta frequência. No NCC [3], o contrato de seguro é previsto nos artigos 757 aos 802. Sendo possível encontra-lo ainda nas legislações extravagantes.
3. Características essenciais
Fabio Ulhôa Coelho [4] define o seguro como “contrato em que uma das partes (sociedade seguradora) assume, mediante o recebimento do prêmio, a obrigação de garantir interesse legítimo da outra (contratante do seguro ou segurado) contra riscos predeterminados”.
O contrato de seguro pode ser classificado como: a)oneroso – gera vantagens patrimoniais para ambos contratantes; b)de adesão – tem suas cláusulas preestabelecidas, facilitando a contratação em massa, tão exigida na atualidade; c) típico e nominado – previsto legalmente; d)bilateral – tanto o segurado como o segurador se obrigam nessa relação contratual; e) aleatório – quanto a essa classificação ocorre divergência doutrinária, a parte da doutrina que opta por considera-lo aleatório afirma que o risco poderá ou não se concretizar, ficando subordinado a sorte do segurado, já a outra corrente, acredita que é um contrato comutativo, pois ambas partes sabem desde o início suas respectivas obrigações; f) execução continuada – se prolonga pelo tempo acordado pelas partes; e g)consensual – torna-se perfeito com a manifestação de vontade, não sendo necessário para a sua validade a sua forma pública, mas tão somente para efeito probatório.
4. Elementos do contrato de seguro
O contrato de seguro tem como contratantes o segurado e segurador, e como objeto da relação, qualquer objeto lícito passível de seguro [5]. O risco provocado por um acontecimento futuro e incerto também é figura constante em cada contrato de seguro celebrado. O risco deverá ser previsto contratualmente, tendo seus limites determinados, para que, em caso de sinistro, a parte seguradora não assuma obrigações que ultrapasse o que fora acordado. Com as modernas técnicas de estatística, não é rara a prática de cálculos dos riscos antes do firmamento do contrato, o que contribui diretamente para a segurança jurídica das atividades securitárias.
O segurado e segurador para assumirem as seguintes posições deverão cumprir alguns requisitos. Obrigatoriamente, o segurador deverá ser pessoa jurídica e estar legalmente autorizada, conforme declara o artigo 757 do NCC “Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada”. Já o segurado poderá ser pessoa natural ou jurídica. No próximo tópico detalharemos as obrigações impostas a cada um desses sujeitos.
Além desses sujeitos principais, ainda é possível que o contrato de seguro, (de vida, por exemplo) seja estipulado em favor de terceiro (beneficiário) em caso de morte do segurado.
5. Obrigações dos contraentes
Como já exposto acima no item 3, o contrato de seguro possui como característica a bilateralidade. O que significa dizer que, existe uma relação de causalidade entre as obrigações dos contratantes, o segurado cumpre sua obrigação esperando o recebimento de seu direito por parte do segurador e vice versa. E quais seriam as obrigações de cada um desses sujeitos? É o que veremos a seguir.
5.1 Obrigações do segurado: prêmio
O segurado ao realizar o contrato de seguro com uma seguradora ficará obrigado a efetuar o pagamento de uma determinada e certa quantia denominada prêmio. O prêmio é determinado com base em probabilidades que calculam as chances de ocorrência dos riscos em questão, e é por esse motivo que o segurado tem obrigação de deixar o segurador a par de todas as informações que envolvem o objeto segurado, podendo perder sua garantia se verificada a má fé na omissão de alguma importante informação (art. 765). No caso em que o segurado não omitiu por má fé, poderá o segurador resolver o contrato quando não verificado o sinistro ou simplesmente exigir a paga da diferença do prêmio quando ocorrido o sinistro (art. 766).
Como se sabe, durante a feitura do contrato de seguro, são estabelecidas as formas de pagamento do prêmio e as datas de vencimento, estando o segurado em mora, caberá a ele o pagamento acrescido de juros ou poderá ainda o segurador resolver o contrato. Caso ocorra o sinistro e o segurado ainda esteja em mora, não terá direito ao pagamento da indenização, conforme ilustra o art. 763 ”Não terá direito a indenização o segurado que estiver em mora no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação”. Entretanto, a jurisprudência visando assegurar os direitos do consumidor, tem autorizado o recebimento da indenização mesmo nos casos de mora do segurado.
Ao segurado também é impedido o aumento de riscos propositadamente, agindo com base no dolo e ensejando o enriquecimento ilícito, caso o faça perderá sua garantia de indenização (art. 768).
Independente da verificação do risco, o segurado será obrigado ao pagamento do prêmio à seguradora, existindo raras exceções no caso do perecimento do objeto segurável ou da impossibilidade do mesmo dispor daquele risco.
De acordo com o aumento ou redução desses riscos, o contrato inicialmente acertado poderá sofrer algumas alterações. Quando há, por exemplo, redução dos riscos, o segurado poderá requerer a revisão do prêmio ou até mesmo a resolução do contrato se sentir que não há mais necessidade de tal seguro. Quando há o agravamento dos riscos é dever do segurado informar ao segurador que poderá resolver o contrato no prazo de 15 dias e por ele ainda deverá ser responsável no prazo de trinta dias após a notificação.
Com a ocorrência do sinistro, a seguradora deverá ser imediatamente informada, podendo o segurado perder seu direito à indenização caso se verifique a demora em informar (art. 771).
O pagamento do prêmio poderá ser feito no ato da apólice, ou em prestações no tempo devido; caso o pagamento não seja efetuado é dado o direito ao segurador de rescindir o contrato ou poderá caducar da apólice (art. 763). Pode, ainda, o segurado fazer o uso gratuito do seguro por trinta dias.
5.2 Obrigações do segurador: indenização
É dever da seguradora pagar em dinheiro ao segurado, o valor da indenização ou repor a coisa (atr. 776), caso ocorra o sinistro. Somente não se responsabilizará se o dano foi provocado pela má da outra parte ou se resultou de vício intrínseco da coisa (art. 784) ou se ultrapassou os riscos estipulados no contrato.
Quando ocorre o sinistro, a seguradora deverá gerir da melhor maneira possível os recursos disponibilizados com o pagamento do prêmio, daí a importância da intervenção estatal para fiscalizar se determinada empresa securitária está honrando seus compromissos devidamente.
Ocorrendo a mora do pagamento da indenização, o segurador é obrigado ao pagamento esperado somado às taxas de correção e juros moratórios.
Assim como o segurado, o segurador também é penalizado caso comprovado ter agido de má fé, conforme explicita o seguinte art. 773 “O segurador que, ao tempo do contrato, sabe estar passado o risco de que o segurado se pretende cobrir, e, não obstante, expede a apólice, pagará em dobro o prêmio estipulado”. Com essas sanções, busca-se preservar a boa fé contratual, princípio essencial para a preservação da dignidade humana e da lealdade nessas relações onde a confiança entre os contraentes é elemento primordial.
6. Conclusão
Observando os institutos mais modernos do direito civil e seus princípios norteadores, podemos afirmar que o novo direito civil abandonou seu aspecto concentradamente privatista e adquiriu uma nova conotação constitucional. A disciplina dos contratos, de modo geral e os contratos de seguro, de modo específico, é fortemente influenciada pelos princípios da boa fé, da função social do contrato e englobando todos eles, da dignidade da pessoa humana.
Mais importante que a obediência aos aspectos estritamente formais do código civil, é a manutenção das relações contratuais, buscando o desenvolvimento e a satisfação pessoal e econômica de ambos contratantes.
Assim como nas demais formas de contrato, no contrato de seguro o segurador deverá honrar sua posição de garantidor do objeto tutelado contratualmente e o segurado deverá evitar o inadimplemento, ambos resguardam dessa forma os seus interesses e a harmonia das relações.