Precisamos falar melhor

O brasileiro, em geral, fala muito mal. Dentre esses, destaca-se o gaúcho, grande atropelador do vernáculo. À vista de tantos desvios, conheci um pedante que recomendava: “Vamos tirar Camões do ostracismo! Não maculemos o vernáculo com conspurcações solertes e deletérias!”.

O mineiro emprega choveno (por chovendo), jogano (jogando), percurano (procurando). Os comunicadores erram tanto, que muita gente já não se sabe se é cidadãos ou cidadões, anciãos ou anciões, pãos ou pães, tamanha a gama de intelectuais que resvala por aí. A grande maioria usa “ir de encontro...” Ora, quem vai de encontro é trem. Assim também estada e estadia. Enquando uma é ato de estar, a outra se refere às despesas de estada.

Outra palavrinha prostituída é subsídio. No latim é “sub sidium”; pronuncia-se com o “s” sibilado, jamais para o “z”. O verbo vir, às vezes é maltratado: “Pode vim!”.

Também a flexão de palavras invariáveis: “O pobrema é que existe mais homens e menas mulher...”. O Galvão Bueno, da Globo, diz que o jogo está nos quarentedois minutos, ao invés de quarenta-e-dois. E o que falar dos que usam “a nivel de...”? Terrível também é o emprego de “visse?”, ou “fosse lá?”.

Os jovens usam muito, mas os anúncios de rádio pegaram: compre o “seu óculos”. O certo é, se forem duas lentes é “seus óculos”, ou “um par de óculos”. Só quem poderia dizer “o meu óculo” é Camões, que tinha um olho só.

Os professores se batem muito pela correção no emprego do vernáculo; e têm razão. No entanto, dispensa-se alguns exageros, uma vez que quem escreve (livros ou artigos) até que não precisa ser tão cuidadoso, pois tem atrás de si, o “revisor ortográfico” do computador, e um setor de revisão do órgão (jornal, revista ou editora). Assim mesmo, às vezes dá zebra. Há dias titulei uma crônica como Ressuscitou e publicaram Ressussitou.

Quem fala tem que se cuidar muito. A palavra depois que sai da boca não pode voltar mais. O comunicador que fala não pode errar. Quando aparece um escrito errado, a culpa é da digitação ou da revisão. Mas quando você fala errado, a culpa é sua, mesmo.

Os gregos diziam que “a língua não tem ossos, mas quebra ossos”. Em muitos casos quebra os ossos de quem se aventura a falar sem o mínimo preparo. Num encontro que fui, o palestrante se exaltou, e querendo criticar o luxo que viu no guarda-roupa de alguns, usou a expressão “luxúria”. Ora, todos sabemos que luxúria refere-se aos pecados da sexualidade. Não sei se ele quis dizer algo no sentido de “luxo” ou se quis narrar uma transa dentro do armário. Isso tudo é para mostrar como existem desvios da língua, e como ela se converte em armadilha para quem não tomou, em criança, “sopa de letrinhas”.

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 12/04/2007
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