Asas e raízes
Universalmente, as asas, por serem ornato dos pássaros, simbolizam a liberdade, ao passo que as raízes, por formarem juízo junto com as árvores frondosas, dão uma idéia de segurança. Enquanto a asa nos traz à mente a figura do leve pássaro que ascende às alturas, a raiz, de imediato nos recorda a árvore, imponente e segura. Enquanto o primeiro, apesar de livre, é frágil, a raiz, se de um lado passa uma idéia de estática, de outro nos remete a juízos de estabilidade. Ambos têm inimigos naturais.
O pássaro, na ilusão de voar, é presa fácil do predador e, muitas vezes, na esperança de um céu azul, esborracha-se contra uma parede pintada dessa cor. Os inimigos da árvore são o lenhador, o fogo, os fungos, a ventania. Há quem, em sua busca de liberdade, queira se comparar ao pássaro, vendo no imobilismo da árvore, uma prisão, algo sufocante. Há pássaros que voam livres, mas perdem seus ninhos nas árvores, e quando se dão conta, não têm para onde voltar.
A asa tem o sentido da liberdade, da rapidez e do inconformismo com os lugares comuns. De outro lado, deitar raízes é pensar no futuro, é lembrar-se do tempo dos ventos e das chuvas, onde até o pássaro mais temerário busca um abrigo, um lugar seguro. Assim como existem árvores que se mantêm presas ao solo e não podem acompanhar os pássaros, há pássaros que, ignorando sua fragilidade se aventuram em empreitadas, muitas vezes desastrosas.
O pássaro, de certa forma usa a árvore, para projetar-se, para um descanso, para usufruir de uma sombra... A árvore também se vale do pássaro, para desfrutar de sua beleza, escutar seu canto e rejuvenescer-se com sua mobilidade... Todos trazemos dentro de nós, um pouco de pássaro e alguma coisa da árvore. A pessoa humana, insegura e carente, tem desejos de fixar-se, enquanto sua porção aventureira almeja alçar vôos a novos céus. Temos desejos de voar, mas temos medo, ficamos presos ao que chamamos de segurança. Ou, ao contrário, queremos voar, mas, sonhando demais, esquecemos de construir ninhos.
A árvore peca por não ousar; o pássaro por exagerar sua busca de liberdade. Toda a pessoa, de uma forma ou de outra, tem em si o pássaro e a árvore; desejos de fixar-se e sonhos de voar. O inimigo natural do ser humano é a busca irrefletida da liberdade, como também a acomodação do imobilismo.
Em alguns casos, faz mal ser só árvore, bem como é pernicioso querer assumir só a porção pássaro. O perigo de quem voa é perder raízes. O adversário de quem se apega à terra é jamais ver a beleza do céu... Essas figuras da natureza, a árvore e o pássaro, a metáfora das raízes e das asas, têm sua pedagogia, que pode apontar para um equilíbrio, de fixar-nos como se nunca mais fôssemos sair do lugar, e voar, como se o mundo fosse um eterno e aberto céu azul.