ÍNDIO GENTIL E NEGRO PAGÃO: UMA MENTALIDADE CONSTRUÍDA NO BRASIL COLÔNIA

Pode-se falar de inferioridade, ou ela é uma ideologia construída pelos colonizadores? Evidentemente, a resposta estará vinculada a algum ponto de vista. No entanto, a certeza pode ser incerta, mas a de se considerar que a relação de poder entre diferentes culturas. A cooptação dos “selvagens” pelos “civilizados”.

Assim, compreendendo a história como um conjunto de fatores representados através das ações e legado dos homens manifesto (presente) na contemporaneidade (atualidade), é imprescindível o olhar dos feitos que remontem a trajetória e a consolidação dos mecanismos empregados no sistema colonizatório.

Para tanto a escolha do tema deste artigo surge da necessidade de apontar, de forma comparativa, a mentalidade que legitimou a espoliação, o aculturamento, a cooptação dos valores/crenças dos indígenas e negros responsáveis pelas “atividades braçais” nestas terras.

A partir da École dos Annales* e da revisão na abordagem no campo historiográfico, tendo abertura para outras análises que não a tradicional (história vista de cima / visão dos conquistadores), evidenciou-se a questão das mentalidades e seu espaço na conjuntura cultural de cada sociedade.

Sendo assim, este artigo converge para o período denominado de Brasil Colônia e a legitimidade de algumas instituições, em especial a Igreja como fundamental na justificação ideológica e na preservação das formas de trabalho compulsório nas colônias.

Antes de pormenorizar estas relações torna-se fundamental especificar o conceito de ideologia, que estará ligado as especificidades do tema. Segundo Chauí (2006, p. 7) “a ideologia é um ideário histórico, social e político que oculta a realidade, e que esse ocultamento é uma forma de assegurar e manter a exploração econômica, a desigualdade social e dominação política.”

Caracterizando o índio como gentil sustentavam a ideia de salvação, o negro por outro lado considerado pagão tinham nesta condicionante o motivo de espólio. Agregado a estes elementos que cristalizaram a espoliação nas colônias, a ação da Igreja através de seus representantes foi fundamental para justificar no campo ideológico esta exploração.

Portanto, como principais intelectuais do mundo colonial ibérico que eram e devido ao prestígio moral de que gozavam, os religiosos tinham também um papel importante na justificação ideológica e na preservação das formas de trabalho vigentes nas colônias. Neste sentido, a cultura do negro e do índio, grosso modo, foi relegada a planos inferiores.

Assim, o legado do índio e do negro foi limitado e além do mais, adulterado pelo fato de ser preciso enquadrá-lo num contexto social em que o branco ditava as normas e impunha os valores. O negro e o índio foram constrangidos a adotar tais normas e valores em face da situação de submissão em que ficaram. Submetidos à violência física e cultural, negros e índios tiveram seus padrões de comportamento e existência humilhados e até destruídos.

Por fim, compreendendo as inúmeras relações que se estabeleceram no decorrer da formação da estrutura escravista no Brasil Colônia, fica evidente a utilização de diversos mecanismos ideológicos, legitimando o europeu como o “branco superior”.

Nos períodos em que se estabeleceram os dominadores e os dominados houve cooptação e espoliação, especialmente no período colonial.

Fatalismos a parte, a sugestão está no estimulo para o olhar atento as mudanças e permanências ao longo da História. Ficando proposto um novo olhar sobre os acontecimentos em sociedade. Existiriam outras formas de aculturamento, espoliação ou cooptação? No demais, este assunto não encerra em si mesmo uma certeza, mas apenas o fomento para outros questionamentos.

* Escola de Análises (movimento da historiografia que incorporou metodologias das Ciências Sociais à História) e das várias abordagens que ali se constituíram depois da tragédia da II Guerra Mundial e da resistência ao fascismo. O historiador relata como se deu um processo de compreensão que se direcionava para a cultura e as mentalidades, sem perder as dimensões políticas e econômicas dos fenômenos sociais.