Filósofos originais
O brasileiro é o povo mais filósofo do mundo. É sério mesmo! Ele é um filósofo autêntico, que ri dele próprio e faz piada com sua desgraça. Na verdade, é preciso enxergar, como cabe a um filósofo, a profundidade de uma questão, desde as primeiras causas, até o corolário. Piada, historieta jocosa ou picante, é filosofia pura. Assim Sócrates fez rir o povo, subjugado pelos tiranos.
Aliás, na extirpação das disciplinas humanistas (filosofia, sociologia, antropologia, psicologia) do Segundo Grau, reside um dos tantos crimes da ditadura que devastou o país, desde 1o. de abril de 1964. Filosofia fazia pensar, e tudo o que o ditador não quer é que o povo pense.
Agora tentam parcimoniosamente, resgatar essas perdas. A verve do brasileiro, do homem de rua, do engraxate, do operário, é recheada de uma filosofia que faria a alegria dos peripatéticos, componentes da academia. Nada mais socrático que o deboche irreverente sobre as crises nacionais. Nada mais aristotélico que a lógica: Eu trabalho pro patrão enricar; ora, enricando ele não vai mais percisar de mim; logo, eu devo trabalhar menos prele não enricar”.
Na grandeza de quem sofre e acha graça dos seus males, vê-se o estoicismo heraclitiano. No drama diário o brasileiro vive as “leis do eterno retorno”, provando que as situações, embora cruéis, nunca são as mesmas, afinal, “não nos banhamos duas vezes no mesmo rio”. Ah essa filosofia tão esquecida, como aliás anda esquecido o mais elementar humanismo! A filosofia natural, não essa metodologizada pelos “intelectuais” e editores de livros “técnicos”, longe do que se imagina, não nasce nas universidades, onde pedantes, de óculos na ponta do nariz, mal-arrumados, descabelados (para serem reconhecidos como “filósofos”), cabeças cheias de estereótipos. Nas “academias” ela é apenas aprisionada. A verdadeira filosofia, mais como “arte de pensar” do que “amor ao estudo”, nasce do povo.
Filosofia nasce do povo que vive, que pensa, que quer mudar. Nesse contexto, filosofia, longe de infletir na busca dos “primeiros princípios”, é um método que pensa, ensina, deduz e faz pensar. Hoje as pessoas não sabem mais pensar, resolvem os problemas técnicos com calculadora e computador, mas os existenciais vão para o analista. O que falta é a lógica (aristotélica, cartesiana, sei lá) para organizar suas vidas. Aliás, “organizar idéias” é a proposta da filosofia moderna.
Já desponta hoje, em países de Primeiro Mundo, a “filosofia clínica”, onde o indivíduo vai ao consultório do filósofo, não para desnudar seu inconsciente, na busca de solução para problemas de comportamento, traumas de infância, complexos de culpa, mas para que o especialista o ajude a colocar as idéias em ordem, a definir alternativas e a escolher caminhos. Enfim, alguém que o ajude a pensar. Pensar por sua própria cabeça. Luxo que a vida moderna nem sempre nos permite.